[weglot_switcher]

Marcelo rejeita “pressão” de Berardo para afastar Marques Mendes

Berardo acusa advogado de comentar em causa própria na SIC e pede saída do Conselho de Estado, sabe o JE. Belém reage: Marcelo “não é pressionável”.
20 Dezembro 2019, 08h18

Joe Berardo escreveu a Marcelo Rebelo de Sousa a pedir que repreenda Marques Mendes e repondere a sua presença no Conselho de Estado, o que o JornalEconómico apurou que não irá acontecer. O empresário condena os comentários que Mendes tem feito acerca das suas comendas por este ser membro do órgão consultivo da Presidência da República e por fazer parte da sociedade Abreu Advogados, que representa a Caixa Geral de Depósitos (CGD) em processos de arresto contra si.

O pedido ao Chefe do Estado surge depois Marques Mendes ter defendido que é uma “frouxidão” uma eventual decisão do Conselho das Ordens Honoríficas (COH) que passe pela repreensão a José Berardo, mantendo as condecorações no âmbito do processo disciplinar, cujo desfecho deverá ser conhecido hoje (ver pág. 36).

O JE sabe que a missiva dirigida ao Presidente da República foi enviada na semana passada, e Berardo solicita a Marcelo que admoeste Marques Mendes por comentários relativos à decisão do COH que poderá passar por uma sanção menos grave, como a repreensão. Na carta, justifica o pedido com o facto de o comentador ser membro do Conselho de Estado e integrar uma sociedade de advogados que representa a CGD contra o empresário madeirense em processos de arresto, nomeadamente de uma quinta no Funchal e de dois apartamentos de luxo em Lisboa.

Fonte oficial da Presidência da República confirmou ao JE que “é verdade que o Presidente da República recebeu uma carta do Senhor José Berardo”. Ainda que saliente que “não compete” ao Chefe do Estado divulgar o teor da correspondência, dá conta de que “nada no estatuto dos Conselheiros de Estado autoriza o Presidente da República a apreciar a liberdade de expressão dos Senhores Conselheiros dentro ou fora daquele órgão” . E conclui: “O Presidente da República, Grão Mestre das Ordens Honoríficas, atende a toda a informação relevante no desempenho das suas funções, mas não é pressionável em qualquer sentido no exercício destas”.

Confrontado com a existência desta carta, o advogado de Berardo, Paulo Saragoça da Matta afirma: “Sobre esse assunto não tomo qualquer posição”. O JE sabe, porém, que na missiva o empresário repudia os comentários de Luís Marques Mendes, considerando mesmo que a presença do advogado no Conselho de Estado deveria ser reponderada, dado que o seu prestígio resulta de ser membro deste órgão e a sua opinião poderá confundir-se com a do próprio Presidente da República. Na carta, o empresário madeirense refere ainda que os membros daquele órgão devem ser isentos e independentes.

Em causa está um comentário de Marques Mendes à notícia avançada pelo JE, a 29 de novembro, que deu conta de que a repreensão, pessoalmente ou por escrito, é o cenário proposto no relatório final de Mota Amaral, escolhido para instrutor do processo disciplinar instaurado ao empresário. Uma semana depois, a 8 de dezembro, no seu comentário na SIC, Luís Marques Mendes reagiu a este cenário, dizendo que “não se consegue perceber esta frouxidão”, recordando que na audição no Parlamento Berardo “gozou com o pagode, dizendo que nada deve”. Marques Mendes afirmou ainda que o empresário “tem um comportamento ético absolutamente censurável” e que “mesmo assim, leva apenas uma repreensão, mantém a condecoração e fica tudo na mesma”.

Confrontado com a carta enviada a Belém, Marques Mendes afirma desconhecê-la, e sobre o seu teor dispara: ”Se existir carta, é apenas uma tentativa de condicionar os meus comentários. Mas desenganem-se. Voltarei ao tema Berardo se e quando entender”.

A polémica audição do empresário no Parlamento foi também alvo de comentários de José Miguel Júdice quando o antigo bastonário da Ordem dos Advogados ameaçou devolver a sua condecoração de Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique caso o Presidente da República não retire a Berardo a Grã-Cruz da mesma Ordem.

Pedido de desculpas público pesará na decisão
Fonte próxima ao processo assegurou ao Jornal Económico que Berardo vai manter as comendas dado que a irradiação dos quadros da Ordem, que implica a privação do uso dos títulos, tem-se aplicado a personalidades com penas de prisão superior a três anos, com condenações transitadas em julgado, (casos de Armando Vara e de Carlos Cruz).

Segundo a mesma fonte, para a decisão do COH também contribuiu o facto de, a 23 de maio, o empresário se ter retratado publicamente ao admitiu ter-se excedido durante a sua audição no Parlamento sobre a gestão da CGD, ressalvando que não tinha a intenção de “ofender”. Em comunicado, Berardo pediu desculpa pela sua atuação “impulsiva” e “não devidamente ponderada” durante a audição a 10 de maio, na qual declarou ser “claro” que não tem dívidas. Desde a audição, Berardo diz ter “servido de bode expiatório de todos os males do sistema financeiro português desde 2007”.

O processo disciplinar a Berardo foi iniciado após o empresário ter feito declarações no Parlamento que foram consideradas desrespeitosas por vários grupos parlamentares.

Aguarda-se pela decisão final que, caso conclua pela violação dos deveres dos titulares das ordens, poderá ter a forma de uma admoestação ou irradiação dos quadros da Ordem, o que implica a privação do uso dos títulos de comendador e grã-cruz da Ordem do Infante D. Henrique – um cenário que terá sido afastado.

A defesa do arguido invocou outros casos de personalidades que tiveram problemas com a Justiça para que o empresário não perca as condecorações, nomeadamente Cristiano Ronaldo e José Mourinho.

Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.