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Maria Luís Albuquerque diz que UE quer relançar Produto Individual de Reforma Pan-Europeu (PEPP)

A comissária europeia garante que “vamos rever a legislação para possibilitar mais investimento em classes alternativas de ativos por parte de investidores institucionais, como fundos de pensões e seguradoras, e trabalhar para facilitar o acesso de investidores de retalho a instrumentos emitidos por organismos quase-soberanos”.
A comissária Europeia para os Serviços Financeiros e União da Poupança e dos Investimentos, Maria Luís Albuquerque, usa da palavra no início dos trabalhos da conferência anual da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), sob o tema “Uma Nova Ambição para os Mercados de Capitais”, na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, 30 de maio de 2025. TIAGO PETINGA/LUSA
30 Maio 2025, 10h41

Maria Luís Albuquerque, Comissária Europeia dos Serviços Financeiros e União da Poupança e dos Investimentos, foi a keynote speaker da Conferência Anual da CMVM, e revelou que “ao longo dos próximos meses iremos apresentar um conjunto de propostas muito abrangentes e ambiciosas em áreas como a titularização; instrumentos de retalho e poupança como a ‘conta de poupança e investimentos’; e iniciativas de relançamento do PEPP (produto de pensão individual pan-europeu – Pan-European Personal Pension Product)”.

O PEPP é um mecanismo de proteção para a reforma para aumentar o seu rendimento quando parar de trabalhar.

Recorde-se que o PEPP arrancou em 2022 revelou-se até agora não ser uma grande solução para as pensões na Europa, desde logo por continuar a enfrentar obstáculos como limites de custos muito baixos, questões fiscais e requisitos de proteção contra a inflação. Ainda nenhum país da União Europeia está a comercializar o Produto Individual de Reforma Pan-Europeu.

A comissária europeia garante que “vamos rever a legislação para possibilitar mais investimento em classes alternativas de ativos por parte de investidores institucionais, como fundos de pensões e seguradoras, e trabalhar para facilitar o acesso de investidores de retalho a instrumentos emitidos por organismos quase-soberanos”.

“Apresentaremos propostas ambiciosas de remoção de barreiras ao funcionamento eficiente de infraestruturas de mercado”, promete Maria Luís que acrescenta que “estamos a olhar, também, para a forma como funciona a supervisão dos mercados financeiros, tentando perceber se os instrumentos de supervisão coordenada e harmonizada que introduzimos nos últimos anos são utilizados plenamente e se são eficazes e se se justifica, e em que áreas, centralizar a supervisão”.

Maria Luís Albuquerque fez a pergunta que está na cabeça de toda a gente. “Porque é que desta vez é diferente?”

A resposta é: política. “Depois de vários relatórios de diagnóstico, é clara e (espero) firme, a determinação política de avançar na construção desta União da Poupança e dos Investimentos. Conclusões do Conselho Europeu, do Eurogrupo, de Ministros em diversas formações, e da indústria, todos apontam nessa direção”.

“É especialmente clara a constatação de que o financiamento das nossas prioridades não pode depender exclusivamente dos orçamentos públicos. É indispensável a participação privada”, defendeu.

Por outro lado, disse a comissária, “a crescente tensão geoestratégica – com impactos visíveis no comportamento dos mercados – acentuou a urgência em encontrar alternativas, no mercado interno europeu, a parceiros comerciais que se tornaram menos confiáveis. E, nessa medida, também a urgência de reforçar a segurança e soberania da Europa”.

A União da Poupança e dos Investimentos é, ainda, diferente de iniciativas anteriores “porque assenta numa associação virtuosa entre a União do Mercado de Capitais e a União Bancária, assentando na ligação intrínseca entre mercados de capitais e sistema bancário e reforçando-se mutuamente”, garante a comissária europeia.

Por outro lado “é também diferente de projetos anteriores por se assumir centrada nos investidores e nos interesses dos investidores”, disse.

Maria Luís Albuquerque defendeu que a competitividade, crescimento, inovação, segurança, “não são fins em si mesmos. São os instrumentos que nos permitem garantir o bem estar atual e futuro dos nossos cidadãos. São instrumentos que nos permitem cumprir as promessas que a União Europeia representa de estabilidade, prosperidade, democracia, inclusão e segurança”.

“Assim, ao contrário de outros planos de ação, estamos determinados em garantir que todas as medidas e propostas sejam vistas e desenhadas na perspetiva do investidor (em particular o de retalho), para o dotar dos instrumentos, dos meios e do enquadramento adequado para que se sinta confiante a investir nos mercados de capitais”, referiu.

Um primeiro exemplo “será a estratégia de literacia financeira que iremos apresentar já no próximo trimestre”, disse num fórum onde começou por contestar que os depósitos a prazo sejam menos arriscados, já que a perda é garantida. Habituámo-nos  “a pensar que os depósitos bancários são seguros e não têm risco. Mas o que é seguro é que se perde dinheiro”.

Maria Luís falou ainda da “chamada Estratégia de Investimento de Retalho (Retail Investment Strategy, ou RIS), atualmente em discussão com o Conselho e o Parlamento Europeu”. Esta estratégia “está claramente alinhada com as prioridades da União da Poupança e dos Investimentos, mas tem enfrentado inúmeras críticas dos incumbentes, por desafiar modelos estabelecidos na tentativa de facilitar o investimento de retalho”.

“Falhando a atual negociação na Retail Investment Strategy, que representa já um relevante esforço de aproximação face as preocupações da indústria, teremos de repensar a estratégia e eventualmente voltar a colocar sobre a mesa propostas mais ambiciosas – para assegurar que alcançamos os objetivos inicialmente definidos”, disse.

Incentivos fiscais ao investimento de retalho ou na área das pensões

Voltando ao que faz desta União da Poupança e dos Investimentos uma iniciativa diferente das anteriores, Maria Luís destacou que “esta iniciativa reconhece e dá espaço ao desenvolvimento de iniciativas nacionais, reconhece parcerias, reconhece que a Comissão, ou a União Europeia, sozinhas, não conseguirão implementar a União da Poupança e dos Investimentos”.

“Muitas das iniciativas que estamos a preparar apenas podem ser implementadas a nível nacional, pelos Estados-Membros”, disse mencionando “os incentivos fiscais ao investimento de retalho, ou na área das pensões, ou mesmo na introdução da literacia financeira nos currículos escolares”.

“Todos estes elementos são competência estritamente nacional. O papel da Comissão – e vamos fazê-lo continuamente e sem descanso – é incentivar, apoiar, guiar, na implementação de melhores práticas que consigamos identificar. A implementação tem de ser articulada, mas tem de ser feita pelos Estados Membros”.

Num longo discurso, a comissária realçou ainda que “particularmente relevante é o facto de sermos agnósticos quanto aos instrumentos a utilizar. Legislação, recomendações, reforço na implementação e enforcement, usaremos os instrumentos mais eficazes para cada objetivo, tentando, na medida do possível, evitar legislar quando outras opções estejam disponíveis”.

“Temos vindo a apoiar iniciativas de grupos de Estados Membros que permitam avançar em áreas específicas por acordo mútuo, sem fragmentar o mercado interno. Procuramos com isso soluções alinhadas com o quadro regulatório europeu que possam ser replicadas, permitindo um aprofundamento – ainda que parcelar – do nosso mercado interno”, referiu a comissária.

“Do que se trata é de completar o mercado único nos serviços financeiros. Construir a União da Poupança e dos Investimentos depende da remoção de barreiras alheias à regulação dos mercados de capitais, por exemplo, barreiras que resultam de legislação fiscal ou societária. Construir um mercado eficiente depende da remoção dessas barreiras”, acrescentou.

Por isso “lançámos já um questionário – aberto até ao próximo dia 10 de junho – para recolher informação sobre as barreiras legais, operacionais, ou outras, que tornam os nossos mercados ineficientes e pouco competitivos. Lançámos também um canal permanente para que qualquer cidadão, empresa ou entidade possa denunciar barreiras ao mercado único financeiro com que se tenham confrontado, identificando-se ou de forma anónima”.

“Identificados os elementos centrais da União da Poupança e dos Investimentos, é mais fácil perceber quais são os fatores críticos para o seu sucesso”, disse ainda acrescentando que “em primeiro lugar, manter o forte compromisso e empenho político na necessidade e urgência de aprofundar o mercado interno também na
área dos serviços financeiros”.

“A que acresce, obviamente, encontrar o equilíbrio no projeto que permita a cada um dos participantes vê-lo como um fator de competitividade e crescimento e passar da palavra à ação. Nessa ótica, deixem-me salientar que o mercado interno dos serviços financeiros não significa um único mercado, uma única bolsa, uma única contraparte central ou um único supervisor”, afirmou.

Maria Luís admite que nalguns casos “implicará ou tenderá a implicar a natural concentração nalguns operadores – necessária para atingir a dimensão que precisamos para competir externamente”.  Mas, na maior parte das vezes, “resultará tão só numa maior coordenação, cooperação ou na instituição de mecanismos de interoperabilidade. O objetivo é dar a investidores e empresas acesso a espaços de negociação líquidos e dinâmicos, respeitando especificidades locais”.

O sucesso da União da Poupança e dos Investimentos “depende,  ainda, da consciencialização de que não competimos uns com os outros na Europa. Competimos, sim, com outras regiões face às quais temos de ganhar competitividade e recuperar a necessária autonomia estratégica”, disse numa clara alusão ao “juntos somos mais fortes”.

“A nossa ambição não deve ser copiar o modelo norte-americano, ou o inglês, ou outro qualquer. A Europa e cada um dos seus Estados Membros têm especificidades que são vantagens, se formos capazes de agregar o que temos em comum. Temos por isso de criar o nosso próprio modelo e ser capazes de ultrapassar diferenças que são mero protecionismo e receio de mudar. Temos de pensar no nosso futuro comum que, num mundo cada vez mais incerto, é a única fonte de prosperidade coletiva e individual”, concluiu Maria Luís Albuquerque.

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