O acordo que põe termo ao Acordo de Capitalização Contingente (CCA), celebrado em 2017, no âmbito da operação de venda do Novobanco partiu “de condições muito difíceis”, reconhece ao Jornal Económico o Presidente do Fundo de Resolução (FdR), Luís Máximo dos Santos.
Mas “foi possível construir um acordo que é, de facto, bastante positivo para o FdR, o Estado e o Novobanco. Também por isso demorou algum tempo a alcançar”, revela o Presidente do Fundo de Resolução.
O Presidente do Fundo, que é também vice-Governador do Banco de Portugal, diz ainda que “a principal vantagem consiste nas poupanças que o acordo materializa para o FdR e nas contingências que foram eliminadas, e também na eliminação do dever de pronúncia sobre operações relativas aos ativos que integravam o CCA e que constituía um fardo pesado em termos operacionais e de risco reputacional”.
Quando questionado sobre se o Fundo de Resolução está livre para vender ações do Novobanco no IPO (Oferta Pública Inicial) em conjunto com a Lone Star ou se a participação do FdR está acoplada à da Direção Geral do Tesouro e Finanças para efeitos da venda em bolsa? Luís Máximo dos Santos disse que “as decisões do FdR e do Estado são autónomas”.
Os acionistas do Novobanco são a Lone Star (com 75%), o Fundo de Resolução (13,54%) e a Direção-Geral do Tesouro (11,46%).
O acordo que põe termo ao Acordo de Capitalização Contingente (CCA), celebrado em 2017, no âmbito da operação de venda do Novobanco, nas condições formalizadas esta segunda-feira, “permite reduzir ainda mais a responsabilidade do Fundo de Resolução”, revelou a instituição liderada por Luís Máximo dos Santos em comunicado esta segunda-feira.
“O interesse público foi, assim, plenamente salvaguardado tanto na celebração como na execução e na conclusão do Acordo de Capitalização Contingente”, sublinha o fundo.
No comunicado divulgado esta segunda-feira, o Fundo de Resolução diz que “ficam encerradas, definitivamente, todas as obrigações do Fundo de Resolução relativas ao CCA”.
“É este, por isso, o momento para se apurar o saldo final da execução do Acordo de Capitalização Contingente”.
Encontro de contas e fluxos zero (sem qualquer transferência de verbas)
O Fundo de Resolução diz que “o acordo permite uma redução significativa das responsabilidades do Fundo de Resolução (superior a 73 milhões de euros, em termos líquidos, com base nos valores reclamados pelo Novobanco), além de permitir a extinção de contingências potencialmente significativas”.
Este número de 73 milhões é o saldo entre o valor a pagar pelo FdR e o valor a receber do Novobanco, tendo em conta o upside de recuperação obtido junto do Banco Económico.
A recuperação obtida junto do Banco Económico permitiu um upside que o Fundo de Resolução estimava que fosse de 128 milhões de euros. Este é o valor que o FdR teria direito a receber do banco ou, por contrapartida, é o valor que o FdR tinha o direito de abater a qualquer montante que fosse devido por si ao Novobanco.
Mas as partes divergiam quanto a esse valor, pois o FdR entendia que eram 128 milhões e o Novobanco considerava que eram 117 milhões de euros.
Assim, nos termos da decisão arbitral na segunda arbitragem (sobre a IFRS9) o Fundo de Resolução teria de pagar ao Novobanco um montante que a instituição financeira reclamava ser de 190 milhões (180 milhões de capital e 10 milhões de juros). Foi feita a compensação com o valor a receber pelo FdR do Novobanco relativo à libertação de imparidades do Banco Económico.
Assim, se considerarmos os 128 milhões que o FdR considerava ter a receber, a diferença (saldo entre o valor a pagar pelo FdR e o valor a receber pelo NB) são 62 milhões de euros, mas se considerarmos os 117 milhões que o Novobanco considerava ter a pagar e tinha nas suas contas, esse saldo são 73 milhões de euros.
No âmbito deste acordo agora assinado o Novobanco prescindiu da diferença entre um valor e outro.
O fim do CCA deverá ter impacto nas demonstrações financeiras do Novobanco, revela por seu turno o banco. Na demonstração de resultado terá um custo de 62,7 milhões de euros. Isto significa que o banco vai ter menos lucros e por via disso pagará menos impostos.
Nos rácios de capital este acordo provocará um aumento de aproximadamente 47 pontos base (pro-forma das contas de setembro de 2024).
Durante todo o período de execução do CCA (outubro 2017 a dezembro 2024), o valor líquido dos pagamentos realizados pelo Fundo de Resolução totalizou 3.405 milhões de euros, ficando portanto 485 milhões de euros abaixo do valor máximo previsto no contrato (3.890 milhões de euros) e 936 milhões de euros abaixo do valor agregado das perdas “cobertas” pelo mecanismo de capitalização contingente (4.341 milhões de euros, a 30 de junho de 2024), segundo divulga o Fundo de Resolução no seu comunicado.
“É, pois, inequívoco que o mecanismo de capitalização contingente, pela sua própria conceção, se mostrou apto a reduzir significativamente a responsabilidade do Fundo de Resolução”, defende a instituição que é financiada pelos bancos do sistema.
“Para esse resultado contribui também o esforço desenvolvido, em 2021, pelo Fundo de Resolução e pelo Banco de Portugal, em articulação com o Ministério das Finanças, com vista a que ficasse atribuído ao Fundo de Resolução o valor que viesse a ser recuperado pelo Novobanco num ativo abrangido pelo âmbito do acordo”, referindo-se, sem mencionar, ao Banco Económico (ex-BESA).
As perdas com exposição ao antigo BESA do Novobanco, que incluíam um empréstimo de 425 milhões de dólares, estavam cobertas pelo mecanismo de capital contingente, e existiam “diferentes perspetivas” sobre o grau de recuperação dessas perdas, com o Fundo de Resolução a defender que as hipóteses eram mais positivas do que as registadas pelo Novobanco.
Essas diferenças foram objeto de um acordo em maio de 2021 entre a gestão do banco então liderada por António Ramalho e o Fundo de Resolução.
Na sequência de uma reestruturação realizada em 2020 (e na qual o Novobanco deixou de ser acionista do banco angolano), o banco “obteve uma recuperação superior ao valor pela qual aquela exposição se encontrava registada no balanço do Novobanco” e tal como acordado essa recuperação acima do previsto revertia para o FdR.
Em comunicado o Fundo diz que “quanto à segunda arbitragem iniciada pelo Novobanco, fica cumprida a obrigação de pagamento pelo Fundo de Resolução, que o banco reclama ser de 190 milhões de euros (180 milhões, mais 10 milhões de euros de juros de mora), mediante a compensação com o valor a receber pelo Fundo de Resolução relativo a uma alteração contratual promovida pelo Banco de Portugal e pelo Fundo de Resolução, em 2021, relacionada com a recuperação de um ativo abrangido pelo CCA (no valor de 128 milhões de euros, de acordo com o apuramento realizado pelo Fundo de Resolução, ou de 117 milhões de euros, segundo o Novobanco)”.
Na mesma nota a instituição liderada por Luís Máximo dos Santos escreve que “ficam saldadas – sem qualquer transferência de verbas – as obrigações de pagamento existentes entre as partes em resultado do CCA, bem como todos os litígios e diferendos relacionados com a execução do acordo”.
O FdR refere “a aceitação, da parte do Novobanco, de não receber o saldo remanescente, que o banco reclama ser de 73 milhões de euros (62 milhões de euros, caso se considere o cálculo do Fundo de Resolução quanto ao valor a receber pelo Fundo)”.
“Quanto à terceira arbitragem (na qual, o valor do pedido do Novobanco é ainda de 198 milhões de euros, mas que se admite que seria reduzido para 124 milhões de euros considerando a decisão proferida na segunda arbitragem, mais juros de mora que ultrapassam os 47 milhões de euros), ocorre a desistência por parte do Novobanco”, acrescenta o FdR.
Em setembro de 2024, o Novobanco tinha registado valores a receber, no âmbito do CCA, de 161,6 milhões de euros, e uma responsabilidade perante o Fundo de Resolução no valor de 98,9 milhões. No entanto, os termos do acordo alcançado esta semana pelo Novobanco e o Fundo de Resolução extinguem-se todas as disputas pendentes relacionadas com montantes não pagos ao abrigo do CCA.
O Fundo destaca que se extinguem “as obrigações de pagamento existentes entre as partes, não resultando do acordo qualquer fluxo financeiro”.
O FdR detalha também que se extinguem as responsabilidades contingentes do Fundo de Resolução associadas à alegada violação de “Business Warranties” assumidas no acordo de venda do Novobanco, nomeadamente com a desistência de pedidos indemnizatórios apresentados preliminarmente pela Nani Holdings, que ascendiam a cerca de 60 milhões de euros.
“Extingue-se o mecanismo que prevê que a participação no Novohanco detida pela Nani Holdings não é diluída caso ocorram aumentos de capital por efeito da aplicação e nos termos do Regime Especial Aplicável aos Ativos por Impostos Diferidos”, acrescenta o Fundo.
Fundo de Resolução realça as suas ações que travaram o recurso ao CCA
Com o termo do Acordo de Capitalização Contingente fica definitivamente confirmado que os pagamentos realizados pelo Fundo de Resolução ficam limitados aos 3.405 milhões que o Fundo de Resolução considerou que foram devidos, entre 2018 e 2021, sublinha o FdR.
A ação do Fundo de Resolução “na análise dos pedidos de pagamento, na defesa – em três arbitragens – das suas decisões de recusa ao pagamento de certos montantes, na promoção de uma alteração contratual, em 2021, e, a final, na negociação do termo antecipado do CCA, permitiram que o valor efetivamente pago ao Novobanco tivesse sido inferior ao limite contratual em 485 milhões de euros, aspeto que constitui um dos resultados mais relevantes da eficácia da permanente atuação do Fundo de Resolução em defesa do interesse público”.
“Ao longo do período de execução do CCA o Fundo de Resolução cumpriu também com rigor o dever de análise e pronúncia sobre as operações que lhe foram submetidas pelo Novobanco para apreciação”, realça o FdR.
No total, o Fundo de Resolução pronunciou-se sobre 405 operações, das quais 13% justificaram a sua oposição, 42% levaram o Fundo de Resolução a fixar condições para que a operação pudesse ser implementada, 16% foram objeto de recomendações da parte do Fundo de Resolução e 28% mereceram a não oposição nos termos propostos, relata o Fundo.
“Sem o CCA, não teria sido possível a venda do Novobanco, que, nesse cenário, não teria sobrevivido”
No dia em que se extingue o Acordo de Capitalização Contingente, o Fundo de Resolução lembra também que o Acordo foi imprescindível para ser dado cumprimento, em 2017, à obrigação de venda do Novobanco, na altura ainda um banco de transição criado no quadro da resolução do Banco Espírito Santo. “Sem o CCA, não teria sido possível a venda do Novobanco, que, nesse cenário, não teria sobrevivido”.
“A celebração do CCA, em 2017, foi, por isso, indispensável para preservar o importante papel do Novobanco no financiamento da economia portuguesa, para a proteção das poupanças confiadas ao banco e para a salvaguarda da estabilidade financeira em Portugal”, sublinha a instituição que está no perímetro contabilístico da Administração Pública.
“A execução do Acordo, entre 2017 e 2024, foi, por sua vez, essencial para a restruturação do Novobanco, para restabelecer a sua viabilidade e para ultrapassar, em definitivo, o pesado legado herdado do Banco Espírito Santo, em termos que permitiram minimizar a utilização do Fundo de Resolução”, defende ainda o Fundo.
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