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Mercadona procura quota de vendas superior a 10% em Portugal

Se replicar o êxito de Espanha, onde garante 25% das receitas com 17% da área comercial, grupo de Juan Roig vai chegar ao topo do mercado interno.
21 Julho 2019, 11h00

A Mercadona, que, na passada terça-feira, dia 2 de julho, fez a primeira abertura ao público de uma loja em Portugal, em Canidelo, Gaia, pretende, em função dos últimos objetivos anunciados pelo presidente da empresa, Juan Roig, deter 10% da área comercial global existente no setor da distribuição em Portugal e uma quota ainda superior em termos de vendas, a exemplo do que é a sua prática em Espanha. Esta é uma das principais conclusões de Juan Carlos Matarrubia, sócio diretor da Retail Data, empresa de estudos especializados na distribuição ibérica.

“O presidente da Mercadona já confirmou que, pelo menos, irão abrir 150 lojas que terão uma média de 1.600 a 1.800 metros quadrados. Isto significará que, a médio e longo prazo a superfície comercial da Mercadona em Portugal se situará em torno dos 250 mil metros quadrados, o que equivalerá a cerca de 10% da área de vendas. E, sem dúvida, que a uma quota superior em valor, se observarmos o exemplo de Espanha, onde [o grupo] não chega a 17% da superfície e a sua participação em valor ronda os 25%”, defende Juan Carlos Matarrubia, em declarações exclusivas ao Jornal Económico. “Tudo “dependerá, claro, do êxito da fórmula da Mercadona entre o público português”, ressalva Juan Carlos Matarrubia.

Vantagens e desvantagens
Questionado sobre as vantagens e desvantagens, desafios e oportunidades que se colocam à Mercadona neste seu primeiro processo de internacionalização em Portugal, o diretor da Retail Data explica que “a grande vantagem é que a Mercadona ‘aterra’ em Portugal com o melhor do seu modelo espanhol, que tem tido tanto êxito”.

“Todas as lojas são novas e incorporarão todas as inovações e melhorias da última geração (grande dimensão, universos, comida preparada, ecoeficiência, sushi e produtos de corte no local). Além disso, existe uma grande expetativa entre o consumidor português, que se sente distinguido por ter sido eleito para a primeira experiência de uma grande empresa fora do seu país. A oportunidade é muito grande, porque, além disso, existem muitas sinergias logísticas, de abastecimento, de fornecedores. Tudo parece indicar que a Irmadona [a empresa portuguesa criada pela Mercadona para gerir a operação no nosso país] vai ser um caso de êxito”, acredita Juan Carlos Matarrubia.

No entanto, nem tudo são rosas. A Mercadona vai entrar num mercado, o nacional, que está completamente ‘viciado’ em promoções, algo que o grupo se rejeita a fazer, optando pela política SPB, ou seja, “sempre preços baixos”. “Essa é a maior dificuldade para a Mercadona”, admite o diretor da Retail Data. “Nunca faz promoções e a capacidade de eleição entre marcas em muitas das categorias [de produtos] não existe. A favor, tem um sortido muito variado em tipologia de produtos e uma relação muito boa qualidade-preço, conseguida em todos estes anos com o seu modelo de interfornecedores (agora, ‘totalers’)”, avalia Juan Carlos Matarrubia.

Também o facto de o mercado de distribuição nacional ser significativamente mais concentrado do que o similar espanhol pode não jogar a favor do grupo com sede em Valência. O diretor da Retail Data diz que “não é fácil responder” se este é um indicador que beneficia ou prejudica a Mercadona. “Por um lado, teria benefícios por serem menos os focos de atenção que tem de cobrir, uma vez que em Espanha há muitas empresas regionais de supermercados que fazem muito bem as coisas e tornam tudo mais difícil. Por outro lado, os principais competidores (e agora líderes destacados) [Grupos Sonae e Jerónimo Martins] são empresas muito potentes, que poderão explorar o argumento de ser portugueses frente à ‘ameaça’ externa, além de que conhecem perfeitamente o consumidor. Isto não beneficia a Mercadona”, alerta este responsável.

A abertura da primeira loja no Canidelo foi alvo de uma ‘romaria’ e os primeiros indícios apontam para uma boa recetividade dos consumidores portugueses aos conceitos e modelo da Mercadona. Mas, tudo se poderá esbater quando terminar o efeito ‘novidade’. O grupo espanhol tem mais nove aberturas de lojas previstas até ao final deste ano, todas na região norte, nos distritos do Porto, Aveiro e Braga. Mais dez deverão ser inauguradas em 2020, em localidades ainda não divulgadas. Na passada segunda-feira , Juan Roig, levantou um pouco mais a ponta do véu e disse que o grupo estava a preparar o investimento num novo bloco logístico na área metropolitana de Lisboa, o primeiro sinal de que a Mercadona está já a direcionar-se para conquistar os consumidores da capital. Na terça-feira passada, o presidente do grupo confirmou que Mercadona deverá chegar a Lisboa “dentro de dois ou três anos”, ou seja, entre 2021 e 2022. Tudo isto, inserido no projeto de chegar, para já, às referidas 150 lojas em Portugal.

Mercadona ‘ataca’ distritos povoados com baixa densidade comercial
De acordo com um estudo da Retail Data, a que o Jornal Económico teve acesso, o distrito do Porto foi o primeiro destino da entrada em Portugal da Mercadona porque se trata do “segundo distrito mais povoado do país, mas com uma densidade comercial em 10% inferior à média [nacional]”.

“Com 1,77 milhões de habitantes, o Porto é o segundo distrito mais povoado de Portugal e albergava a 31 de maio de 2019 (segundo dados da Base de Dados Retail Data Portugal) um total de 436 estabelecimentos na área de retalho de grande consumo organizado com cerca de 390 mil metros quadrados de superfície comercial”, esclarece o referido estudo, acrescentando que “esta rede pressupõe que a densidade comercial se situa em 219,4 m2/1.000 habitantes, quase 10% abaixo dos 240,7 m2 registados a nível nacional”.

“Evidentemente, a irrupção da Mercadona implicará um ‘empurrão’ desta densidade para cerca de 225 m2/1.000 habitantes, mesmo assim a uma certa distância da média do país luso”, conclui a Retail Data.

Análise concorrencial das próximas aberturas
Com a ajuda da Retail Data, O Jornal Económico analisa as aberturas de lojas já calendarizadas pela Mercadona para Portugal. A loja aberta esta semana, no Canidelo, será já uma prova de fogo para a Mercadona. Nas imediações da nova loja encontra-se um hiper Pão de Açúcar com 2.500 metros quadrados, do Grupo Auchan, e no perímetro mais próximo encontram-se lojas do Lidl, Pingo Doce (Jerónimo Martins) e Minipreço Family (Dia). A Sonae também está presente nesta freguesia do Canidelo com um hipermercado Continente e um supermercado de proximidade Bom Dia (também Continente) . A freguesia apresenta um total de cerca de 30 mil habitantes, mais ou menos 10% dos 300 mil habitantes do concelho de Gaia.

Para a próxima segunda-feira, dia 9 de julho, está prevista a abertura da segunda loja, no distrito do Porto, mas no concelho e freguesia de Matosinhos, esta última com cerca de 175 mil habitantes. Aqui, a concorrência mais direta à Mercadona é protagonizada por um trio de supermercados de tamanho médio: Continente Bom Dia, Pingo Doce e Minipreço Family. Nos limites da freguesia, há mais concorrência, cerca de uma dezena de lojas de retalho organizado, a metade delas em regime de franchises ou detidas por terceiros que beneficiam do uso das respetivas insígnias.

Uma semana depois, a 16 de julho, abrirá a terceira loja da Mercadona, em Vermoim, concelho da Maia, que, no seu conjunto, é habitado por cerca de 136 mil pessoas. Aqui, a norte do Porto, mesmo em Vermoim, encontra-se apenas uma loja da Aldi, se bem que a nova loja da Mercadona irá competir de forma direta com a maioria dos estabelecimentos que se localizam na freguesia central da Maia, destacando-se os supermercados do Lidl, Continente Bom Dia e Pingo Doce, além de um supermercado de menores dimensões com a insígnia Minipreço Market.

Por fim, a quarta abertura já agendada de uma loja Mercadona, a quarta, será a 23 de julho, em Fânzeres, no concelho de Gondomar, que regista 165 mil habitantes. Nesta freguesia, funcionam uma superfície comercial de médias dimensões da Continente Modelo, um Minipreço Family e um estabelecimento da rede local Santa Justa. À margem das lojas da freguesia de Fânzeres, são vários os espaços de distribuição existentes na freguesia vizinha de Rio Tinto, que se encontram na mesma zona de influência. Estamos a falar, por exemplo dos hipermercados Jumbo e Pingo Doce, além de um segundo Modelo Continente.
A Retail Data adianta ainda que já está decidida a abertura de uma outra loja até ao final do ano no concelho de Gaia, em Mafamude, onde a Mercadona irá encontrar grandes competidores como o Lidl, Intermarché, Sonae ou o também espanhol El Corte Inglés. De acordo com este estudo, “numa visão mais global, a Sonae é a companhia líder no distrito do Porto em termos de implantação comercial, com 80 estabelecimentos que lhe proporcionam quase 28% da área de venda”.

“No município do Porto (215 mil habitantes), o operador que conta com uma maior presença é a Jerónimo Martins, cuja rede lhe faculta 33% da superfície”, adianta a Retail Data, que elaborou este primeiro estudo sobre o mercado português da distribuição, reunindo mais de 3.500 registos geolocalizados e classificados por operadores, insígnias, categorias, fórmulas comerciais e outras categorias.

 

Artigo publicado na edição nº 1996, de 5 de julho, do Jornal Económico

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