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Miguel Frasquilho: “O que se passa no Conselho de Administração da TAP fica lá dentro”

O chairman da TAP não quis esclarecer se houve uma declaração de voto na aprovação das contas de 2018. A administradora Esmeralda Dourado contrapõe: “o que interessa é que as contas foram aprovadas por unanimidade”.
  • Cristina Bernardo
25 Março 2019, 07h49

As contas da TAP de 2018, com prejuízos de 118 milhões de euros, encerram um episódio que o chairman da companhia não quis esclarecer na sexta-feira passada. Seja o que for que tenha ocorrido na reunião do Conselho de Administração da TAP em que as contas foram apreciadas, o seu presidente, Miguel Frasquilho, escusou-se a prestar esclarecimentos ao Jornal Económico, afirmando que “o que se passa na reunião do Conselho de Administração não é do domínio público, por isso o que se debate nesta reunião fica lá dentro do Conselho de Administração e não vem a público”. Esmeralda Dourado, ao lado do chairman, rematou: “o que interessa é que as contas foram aprovadas por unanimidade”. Fica a dúvida de saber se houve ou não houve uma declaração de voto nesta reunião da administração. Agora, as contas de 2018 seguem para a Assembleia Geral onde os acionistas da TAP dirão de sua justiça o que pensam deste prejuízo.

Mas há mais dúvidas para além deste episódio não esclarecido por Miguel Frasquilho. A olhar já para 2020, o executivo da TAP prepara a colocação no mercado de 15% a 30% dos interesses económicos da transportadora aérea – a concretizar em data ainda não fixada – deixando em aberto a posterior reconfiguração dos atuais interesses que controlam a transportadora aérea nacional. Ou seja: ainda é imprevisível qual será a percentagem de interesses económicos que os atuais acionistas da TAP vão ficar a controlar depois de concretizarem esta operação no mercado.

Fonte oficial da TAP explicou ao Jornal Económico que ainda é impossível fazer esclarecimentos adicionais sobre este tema para além da informação divulgada na apresentação dos resultados de 2018. Mesmo assim, recordou que os direitos económicos dos acionistas foram alterados quando foi feita a reversão do capital detido pelos privados. E ainda explicou que, “em 2020, o que será alienado são direitos económicos e não as acções do capital votante”.

Em junho de 2017, quando foi aumentada a participação do Estado no capital da TAP – em que passou de 34% para 50% do capital social, recuperando o controlo estratégico da empresa -, foi feita igualmente a diminuição dos correspondentes direitos económicos do Estado, que baixaram de 34% para 5%. Em sentido contrário, quando a participação da holding privada Atlantic Gateway baixou de 61% para 45% do capital da TAP, foram acrescidos os correspondentes direitos económicos, aumentando de 61% para 90%, refere o relatório de auditoria do Tribunal de Contas sobre esta operação.

Este relatório de auditoria – divulgado em junho de 2018 – refere igualmente que “subsistem os riscos inerentes às obrigações assumidas pelo Estado e as projeções, até 2022, são insuficientes para aferir da sustentabilidade deste negócio”, referindo-se à forma como foi recomposto o capital entre o Estado e os acionistas privados e como foi repartido o respetivo risco.

Prossegue o Tribunal de Contas, adiantando que este “processo de recomposição do capital social da TAP SGPS não conduziu ao resultado mais eficiente”, porque – diz – “não foi obtido o consenso necessário dos decisores públicos, tendo as sucessivas alterações contratuais agravado as responsabilidades do Estado e aumentado a sua exposição às contingências adversas da empresa”.

Com a recompra, diz o Tribunal de Contas, “o Estado recuperou controlo estratégico, mas perdeu direitos económicos, além de assumir maiores responsabilidades na capitalização e no financiamento da empresa”.

Agora, a intenção de colocar no mercado 15% a 30% dos direitos económicos da TAP, remete esta operação para o foro da participação dos acionistas privados, porque a participação do Estado apenas detém 5% dos direitos económicos, o que não permitiria realizar esta futura venda. Assim, é a Atlantic Gateway que poderá vender uma parte do seu “quinhão” de 90% dos direitos económicos controlados pela participação acionista de 45% do capital.

Miguel Frasquilho, chairman da TAP, considera que esta questão deve ser remetida igualmente à Parpública, mas dificilmente poderá existir um entendimento diferente sobre os acionistas capazes de alienar interesses económicos porque são os acionistas privados que detêm os interesses económicos suficientes para concretizar esta operação.

O Jornal Económico (JE) soube que no escrutínio que o Conselho de Administração fez às contas da TAP de 2018 foram debatidas questões durante a respetiva aprovação. Controntado pelo JE com esta informação, Miguel Frasquilho limitou-se a referir que “a reunião do Conselho de Administração não é pública e que o que se debate nesta reunião fica dentro do Conselho de Administração e não vem a público”. Sobre esta questão, a administradora Esmeralda Dourado comentou que “o que importa neste tema é que as contas de 2018 foram aprovadas por unanimidade dos administradores”.

Por seu turno, o acionista David Neeleman também referiu ao JE que “a TAP tem um grande potencial, e tem vindo a ser valorizada com a nova frota de aviões Airbus da família NEO, que são mais modernos e consomem menos que os anteriores, pelo que a eficiência da operação da TAP aumentou e o seu desempenho será maior, o que terá reflexos na altura em que forem colocados no mercado os direitos económicos que pretendem ser alienados”. “O encaixe desta venda poderá ser utilizado para eliminar parte da dívida bancária que a TAP herdou – cerca de 60 milhões de euros – e que implica um encargo de que a companhia se pretende libertar para poder investir no seu crescimento”, comentou David Neeleman.

Na apresentação de resultados de 2018 destaca-se a assimetria entre o primeiro e o segundo semestre do exercício. No primeiro semestre o prejuízo foi de 90 milhões de euros. E no total do ano ascenderam a 118 milhões de euros (ou 3,6% das receitas totais). Destes 118 milhões de euros de prejuízo, 95 milhões são custos não recorrentes e extraordinários, explicou o administrador executivo Antonoaldo Neves.

Este resultado de 2018 (e percentagem das receitas) compara com um lucro de 21 milhões de euros (0,7% da receitas) obtido em 2017 e prejuízos de 28 milhões de euros (1,2% das receitas) registados em 2016.

As receitas da TAP apresentaram um crescimento de 9,1%, mais do dobro dos seus principais concorrentes europeus (que cresceram em média 4%), sobretudo devido ao aumento do número de passageiros transportados (mais 8,2%) e ao aumento das receitas da TAP Manutenção e Engenharia (mais 26,1%).

Este crescimento incorpora a expansão no mercado dos EUA (mais 10%). Pela negativa, traduz o efeito da desvalorização cambial no Brasil (menos 16%) que causou a diminuição das receitas no principal mercado externo da TAP.

No segmento da TAP Manutenção e Engenharia em Portugal (que apresentou um crescimento de 55%) destaca-se a venda de serviços de manutenção de motores para terceiros, que cresceu de forma notável (mais 70,1%), passando de 108,8 milhões de euros, em 2017, para 185,1 milhões de euros em 2018.

Os custos operacionais totais tiveram um crescimento de 14,7% em 2018, decorrente essencialmente da existência de custos de natureza extraordinária e não recorrente. Os custos extraordinários com irregularidades são consequência do cancelamento de 2490 voos que obrigaram ao aluguer de aviões de substituição com tripulações e ao pagamento de indemnizações a passageiros, no total de cerca de 41 milhões de euros. Depois deste período, foram alcançados acordos sindicais que asseguram a paz social na empresa nos próximos cinco anos.

Em 2018 também foi implementado um programa de pré-reformas e de saídas voluntárias em Portugal. Os custos associados a estas saídas (refletidos na totalidade nas contas de 2018) foram de 26,9 milhões de euros, apesar de boa parte desse montante ser pago ao longo dos próximos 10 anos. A administração da companhia aérea admite que este programa de pré-reformas permitirá à TAP nos próximos anos reduzir custos de mais de 20 milhões de euros.

A TAP ME Brasil (que representou transferências avultadas de fundos ao longo dos últimos anos) “foi finalmente reestruturada” – diz a TAP -, com um custo de 27,6 milhões de euros (despedimentos de mais de mil colaboradores e fecho da operação de Porto Alegre). Para 2019, a companhia espera que a TAP ME Brasil apresente já resultado positivo e não requeira qualquer transferência de fundos.

O gasto com combustível aumentou de 580 milhões de euros, em 2017, para 799 milhões de euros em 2018. Apenas cerca de 50 milhões de euros desse aumento foi devido ao incremento de volume, sendo os restantes cerca de 169 milhões de euros resultantes do efeito de aumento de preço do combustível, para o qual a empresa não estava protegida por falta de limites de crédito e de uma política robusta de hedging.

A média do preço do petróleo subiu 32% entre 2017 e 2018, o que não acontecia desde 2011. Para 2019, “com a nova política de hedging e com melhores ratings de crédito, a empresa tem cerca de 50% do seu consumo protegido a um preço competitivo, quando comparado com o das suas principais concorrentes europeias”, referiu o responsável executivo da TAP, Antonoaldo Neves.

2018 foi também o ano do início da renovação da frota com a chegada de novos aviões (37 até ao final de 2019 e 71 até 2025), o que representa um significativo aumento de conforto para o passageiro e também poupanças de combustível para a TAP. Só em 2018, a TAP iniciou a venda de voos para mais 17 novas rotas, com destaque para a América do Norte (São Francisco, Washington e Chicago), que continua a ser a principal aposta da TAP. Em 2018 também voltou a investir em recursos humanos, contratando mais de 1200 novos colaboradores.

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