A Direção-Geral da Saúde (DGS) recomendou o uso de máscaras comunitárias em espaços fechados e com muitas pessoas. Isto chega?
Não tem de ser a DGS a decidir aquilo que é o direito dos cidadãos. As pessoas têm o direito e a liberdade para se protegerem. Se acharem que devem usar uma máscara, usam. Por acaso a DGS veio recomendar, e fiquei satisfeito, mas mesmo assim acho que a ministra da Saúde devia ter sido mais acutilante, devia ter dito que era uma forte recomendação que deixava às pessoas.
Usar uma máscara vai começar a ser o novo normal?
Se as pessoas começarem já a usar máscara em espaços públicos, supermercados ou transportes públicos, protegem os outros e protegem-se a si próprias. Começamos assim a preparar e a facilitar o terreno para que o primeiro-ministro vá tomando decisões no sentido de começar a pôr a economia a funcionar: abrir algum comércio e algumas superfícies comerciais, e toda a indústria voltar a funcionar.
A indústria portuguesa já está a responder em força a esta necessidade de máscaras.
As máscaras comunitárias podem ser feitas em casa de forma simples, mas também podem ser produzidas em massa pela nossa indústria têxtil. Já há mais de 200 empresas disponíveis que só não produziram até agora em massa porque o Infarmed [Autoridade Nacional do Medicamento] esteve a empatá-las, porque quis definir as regras. Finalmente, ontem [13 de abril] lá saiu uma norma do Infarmed, mas as pessoas já podiam ter todas máscaras comunitárias, porque são muitíssimo mais baratas, e com duas ou três camadas de poliéster ou algodão dão uma proteção semelhante à máscara cirúrgica, de 85%.
No que respeita ao pico da pandemia, este poderá ocorrer antes do final de abril?
O pico da pandemia provavelmente já ocorreu. Se analisarmos a curva na forma que ela tem neste momento, é possível que o pico da pandemia tenha acontecido no início de abril. Em termos do número de pessoas infetadas por dia, estamos neste momento com uma grande estabilidade, o que pode significar que o pico aconteceu no início desta estabilidade. Vamos ter a certeza absoluta disso com a evolução de mais uma semana.
Depois, e provavelmente ainda durante o mês de abril, a curva deverá começar a descer, com o número de novos infetados a passar dos 500/600 por dia para a casa dos 300/400, e depois por aí abaixo.
O Governo já sinalizou que as escolas poderão reabrir a 4 de maio para os alunos dos 11º e 12º anos. É possível?
Acho que pode haver condições, mas como disse o primeiro-ministro estamos ainda longe de maio. Se a situação continuar a evoluir da mesma forma, e sobretudo se começarmos a ter mais doentes recuperados do que doentes que morrem, isso é importante. Tal como é um balanço importante a curva começar a baixar. Agora, o retomar das aulas tem de ser feito com regras: não podemos ter uma sala de aula completamente cheia de alunos, tem de haver distanciamento social na escola, devem usar máscaras, e também devem ser tomadas medidas relativamente aos transportes públicos. Uma das coisas que o Governo deve fazer é arranjar horários desfasados, para as pessoas não irem todas apanhar o metro ou o autocarro ao mesmo tempo.
Poderá haver uma segunda vaga no próximo inverno?
Sim, é um facto, pode acontecer. O vírus, como há uma grande população assintomática, significa que pode ficar endémico. Isto é, fica entre a população e podem registar-se uns casos episódicos até chegar o inverno, quando são mais propensas as infeções respiratórias, pela temperatura que facilita a atividade do vírus, e pelo facto de as pessoas estarem mais juntas, dentro de casa. É possível que no caso concreto deste novo coronavírus isto possa acontecer. Temos de nos preparar, é importante pensar nisso a sério. No verão, a passagem de vírus em termos de infeção é mais difícil por causa da radiação ultravioleta nos espaços exteriores, pois mata o vírus.
O Governo diz que já realizou mais de 200 mil testes. É suficiente?
Começámos mal. No início, o médico tinha de ter a autorização de uma chamada linha de apoio para poder testar uma pessoa, o que era ridículo. E estragou a realização de muitos testes em pessoas com sintomas, porque se a linha não autorizava, não podia fazer o teste. E isto foi assim porque no início havia de facto muito poucos testes. Mais. No Norte do país, onde está a maioria dos doentes, houve uma altura em que os testes eram marcados para uma ou duas semanas depois. As coisas foram mudando. O secretário de Estado da Saúde [António Lacerda Sales], e a diretora da DGS [Graça Freitas], dizem agora que fizeram vários milhares de testes… É um facto, mas no início não fizeram. Há muita gente que deve ter apanhado a infeção e se deve ter curado, não tenho dúvidas nenhumas.
Até quando devem ser mantidas as restrições?
Durante o mês de maio e junho vamos continuar a ter algumas restrições, mas menos, porque isto não vai desaparecer. Se deixarmos as medidas restritivas enquanto ainda há um número muito significativo de infetados na população, corremos o risco de ter uma recaída e de o número começar a disparar outra vez.
Depois da cura, quanto tempo dura a imunização?
Não sabemos duas coisas: quanto tempo as pessoas ficam imunes, nem qual o grau de imunidade, porque o grande problema destes vírus respiratórios é que vão sofrendo mutações. O vírus já deverá ter sofrido mutações desde que surgiu na China. Aqui na Europa, o vírus já teve alterações.
Entrevista publicada no Jornal Económico de 17-04-2020. Para ler a edição completa, aceda aqui ao JE Leitor
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