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Ministro provoca tempestade num depósito de gasóleo

Matos Fernandes alertou para a perda de valor dos carros com motores a diesel “daqui a quatro ou cinco anos”. O setor automóvel reagiu com fortes críticas a declarações que causaram pânico nos concessionários e respetivos clientes.
17 Fevereiro 2019, 19h00

“Hoje é muito evidente que quem comprar um carro diesel, muito provavelmente, daqui a quatro ou cinco anos, não vai ter grande valor na sua troca”, declarou João Matos Fernandes, ministro do Ambiente e da Transição Energética, em entrevista ao “Jornal de Negócios” (edição de 28 de janeiro). No mesmo dia, a Associação do Comércio Automóvel de Portugal (ACAP) sublinhou que “estas declarações podem resultar de um desejo do senhor ministro, mas não têm qualquer correspondência com a realidade”.

Aliás, o secretário-geral da ACAP, Hélder Pedro, revelou que, logo na manhã de segunda-feira, vários concessionários de automóveis foram contactados por “clientes preocupados e apreensivos com a previsão de desvalorização dos modelos a ‘diesel’ que estavam a adquirir”.

No dia seguinte, os revendedores de combustíveis também reagiram, considerando que as declarações do ministro do Ambiente são “injustificadas, infundamentadas” e revelam alguma “impreparação” em quem tem “tamanha responsabilidade sobre o setor”, criticou a Associação Nacional de Revendedores de Combustíveis (Anarec).

Esta associação repudiou “de forma veemente” as declarações do ministro, sublinhando que o setor de revenda de combustíveis sente-se “atacado” com as mesmas. Para a ANAREC, a posição do ministro prejudica a economia e, em particular, o setor da revenda dos combustíveis, que representa cerca de 3.500 postos de abastecimento a nível nacional.

“Além de que a receita fiscal originada pelo setor dos combustíveis, entre os quais o gasóleo, representa cerca de 10% da receita do Estado. Assim, a ANAREC gostaria de questionar ao sr. ministro como vai compensar o Estado pela perda desta receita? Através do aumento do custo da energia? Penalizando desta forma os consumidores em geral?”, perguntou.

A mesma associação sublinhou ainda que os combustíveis estão cada vez menos poluentes, ao contrário da produção dos veículos elétricos, “uma vez que a fase de produção e abate destas viaturas polui mais do que a produção e abate de automóveis a gasolina ou ‘diesel’”.

Notou também que a energia dos veículos elétricos “provém ainda muito da queima de combustíveis fósseis”, como o carvão. “A ANAREC não ignora, nem pode ignorar, que a transição energética é uma realidade e que deve naturalmente ocorrer, mas de uma forma gradual e faseada, para não prejudicar a economia, as empresas e o país em geral”, afirmou, defendendo que a mudança não tem que passar exclusivamente pela eletrificação da mobilidade, mas por “uma lógica de ‘mix’ energético disponível”, como o hidrogénio, a eletricidade e os combustíveis fósseis.

“De resto, as marcas de automóveis e as empresas de refinação de combustíveis têm trabalhado no sentido de produzir viaturas e combustíveis menos poluentes e com menor impacto para o ambiente”, concluiu.

Já a Associação Nacional das Empresas do Comércio e da Reparação Automóvel (ANECRA) lamentou “a falta de sensibilidade” do ministro relativamente “às declarações proferidas quanto ao seu efeito profundamente negativo num setor determinante como o é o setor automóvel”.

“A obsessão pelo veículo elétrico e a diabolização do diesel condicionam uma análise mais profunda sobre o futuro do automóvel e o correspondente impacto ambiental”, indicou essa associação nesta terça-feira.

PSA ao ataque

No mesmo dia, o fabricante automóvel PSA considerou que as declarações do ministro sobre o futuro próximo dos veículos a diesel criam “incerteza, alarme e confusão entre os clientes”. “Elas não correspondem aos regulamentos da União Europeia, que visam reduzir as emissões dos veículos a diesel destinados ao mercado europeu”, destacou o Grupo PSA.

Esse grupo, que inclui marcas como a Peugeot, Citroën, DS e Opel/Vauxhall, notou que “não distinguir as gerações atuais de motores diesel e gasolina dos das gerações anteriores significa não ter em conta o problema real das emissões no setor automóvel, que é a idade do parque automóvel em Portugal, que continua a crescer (quase 13 anos em média)”.

“Além disso, estão a chegar aos centros de abate automóveis em fim de vida carros com mais de 20 anos”, referiu o grupo, que defendeu que a transição energética e a descarbonização devem basear-se numa neutralidade tecnológica em termos de emissões. “E não discriminar a última geração de veículos a diesel ou a gasolina, que são necessários para o cumprimento dos objetivos de CO2 definidos pela Comissão Europeia”, concluiu.

Em silêncio continua até agora a Autoeuropa que, como a ACAP sublinhou, só produz em Portugal viaturas com motores a gasolina e a gasóleo.

Artigo publicado na edição nº 1974 do Jornal Económico de 1 de fevereiro

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