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Moratórias não podem transformar crise económica da Covid-19 numa crise financeira, defende José Crespo de Carvalho

O volume desproporcional de moratórias de crédito concedidas em Portugal, quando comparado com o resto da Europa, deixam antecipar fortes impactos para a banca nacional no pós-Covid, isto num sector que havia registando uma trajetória positiva de recuperação nos últimos anos.
25 Fevereiro 2021, 15h52

O papel da banca na recuperação pós-Covid-19 não pode ser descurado e Portugal não se pode dar ao luxo de ver a atual crise económica transformar-se numa financeira quando forem levantadas as moratórias de crédito, defendem os oradores do Observatório sobre “A Recuperação Económica depois da Covid-19”, um evento realizado esta quinta-feira, 25 de fevereiro, com organização do Jornal Económico e do Crédito Agrícola.

Os apoios ao tecido empresarial face à pandemia em que o mundo mergulhou materializaram-se sobretudo no adiamento das obrigações de crédito de famílias e empresas, as chamadas moratórias, que tiveram uma adesão em Portugal desproporcional ao resto da Europa. Esta solução, embora “útil” num primeiro impacto, representa agora uma ameaça à saúde do sistema financeiro, como reconhece Licínio Pina.

“Foi uma medida útil, mas, na minha ótica, completamente insuficiente para dar estabilidade às empresas”, argumentou o presidente do Conselho de Administração Executivo do Crédito Agrícola, que vê no volume anormal de recurso a este apoio, quando comparado com a média europeia, uma consequência de uma “dívida pública gigantesca” que atua como “um colete de forças” na economia nacional. Esta preocupação surge apesar de Licínio Pina reconhecer que o crescimento de 6,1% no crédito concedido se deveu às estas medidas.

Adicionalmente, o número de moratórias concedidas em Portugal deixa o país sozinho no pedido de alterações ou relaxamento das diretrizes da Autoridade Bancária Europeia (EBA), um cenário que o presidente do banco vê como improvável.

“Temos de encontrar outras soluções e cada um dos bancos terá de assumir as responsabilidades dentro das suas carteiras de crédito”, antecipa, pedindo igualmente reformas estruturais na economia que reduzam a sua dependência de sectores como o turismo, cuja volatilidade ficou bem explícita na atual crise, e que fomentem a transição digital aliada a um reforço da formação dos trabalhadores portugueses.

José Crespo de Carvalho, presidente da Comissão Executiva do ISCTE, considera igualmente improvável uma alteração às diretrizes da EBA e partilha dos pedidos de reformas à economia portuguesa, especialmente no atual contexto.

“Precisamos de escala nas empresas viáveis e estes apoios à retoma e à viabilidade […] devem ser sujeitos à obtenção de alguma escala. É uma oportunidade de ouro que perdemos uma vez mais para criar escala nas empresas, que é uma das reformas mais importantes que se pode fazer num país como o nosso, com PMEs que carecem de uma certa dimensão”, defende o professor.

Assim, torna-se ainda mais importante dispor de uma banca saudável e resistente, argumentam ambos os oradores, com Licínio Pina a advogar uma especial atenção desta ao tecido de pequenas e microempresas, sobretudo as unipessoais.

“Queria salientar este pequeno e micro tecido empresarial, os negócios das próprias pessoas, em q muitas passaram de 100 para zero. Simplesmente deixaram de existir, as pessoas estão numa situação verdadeiramente aflitiva. Não conseguem nem pagar dividas, nem ter rentabilidade para se sustentar. Esses precisam de apoio em especial, não vamos lá com empréstimos. Atirar mais crédito para cima das pessoas ou das empresas não as vai recuperar, porque esse crédito tem de ser pago”, explica o presidente do Crédito Agrícola.

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