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Não há duas sem três: Fed deverá anunciar hoje um novo corte na taxa de juro

A economia norte-americana dá sinais de fraqueza e a inflação mostra anemia. Estes dois fatores deverão sobrepor-se a um atenuar dos riscos externos e convencer a Reserva Federal dos EUA a anunciar um novo corte de 25 pontos base esta quarta-feira. Depois disso é difícil prever. Trump, esse continuar a gritar (no Twitter) por mais e maiores cortes.
  • Kevin Lamarque/Reuters
30 Outubro 2019, 07h48

Por trás da cortina de diplomacia e comunicações vagas que os banqueiros centrais usam nas conferências de imprensa, as atas das reuniões dos decisores acabam por pintar um quadro mais realista.

Tal como no caso do Banco Central Europeu, as minutas da última reunião do Federal Open Market Committee (FOMC) da Reserva Federal (Fed) norte-americana (em setembro) mostraram divergências entre os membros, nomeadamente sobre o corte de 25 pontos base para 1,75%-2%, o segundo seguido.

“Está agora mais difícil prever as decisões da Fed, pois os decisores discordam sobre o caminho a seguir”, referiram os analistas do Danske Bank. “Da última vez houve três votos dissonantes (dois a favor de não cortar e um a favor de um corte maior, o que é muito, tendo em conta o histórico na Fed”.

Os alertas continuaram depois da reunião, nos discursos de alguns dos membros do FOMC, mas segundo Rhys Herbert, economista sénior do Lloyds Bank, além de alguns ‘falcões’ poucos membros sinalizaram estarem contra as expectativas do mercado sobre um novo corte de 25 pontos, para 1,50%-1,75% na reunião de dois dias que termina esta quarta-feira.

“Como a Fed no passado tentou sempre não surpreender os mercados, isto indica que a ausência de sinais aponta para a probabilidade de um corte”, explicou Herbert.

Mercado tem poucas dúvidas

Na perspetiva dos operadores do mercado, essa probabilidade é quase uma certeza. Segundo o CME FedWatch Tool, que monitoriza a negociação dos futuros da taxa de juro, a probabilidade de um corte é de 25 pontos base é esmagadora: 97,3%.

O racional dos investidores e dos analistas está ligado a sinais de deteriorição na atividade económica nos EUA.

Franck Dixmier, global head of fixed income da Allianz Global Investors (GI) recorda que o Índice de Gestores de Compras (PMI) industrial registou uma forte contração em setembro, atingindo 47,8 após um pico de 60,8 em agosto de 2018. Enquanto isso, o PMI de serviços estabilizou em níveis baixos, atingindo 50,9 contra uma média anual de 53,3.

“Esses dois indicadores-chave mostram que a guerra comercial está a pesar sobre a indústria, começando a afetar os serviços e podendo contaminar o consumo. Sobre este último ponto, apesar de um consumidor americano ainda muito resiliente, as vendas no retalho caíram inesperadamente 0,3% em setembro”, afirmou.

“Essas perspetivas deparam-se ainda com um cenário de expetativas para a inflação mais baixas”, adiantou. “Essa tendência pode ser observada claramente no inquérito da Fed de Nova Iorque sobre as expetativas dos consumidores – que coloca, a 15 de outubro, as expetativas para a inflação a três anos nos 2,37%, o nível mais baixo desde 2013 e significativamente mais baixo do que o nível de 3% no início deste ano”.

Dado que a Fed descreveu os recentes cortes nos juros como de “precaução”, Dixmier acredita que o banco central liderado por Jerome Powell queira continuar a apoiar a economia dos EUA por via de reduções nos juros.

Os sinais de abrandamento económico e de ténue inflação irão, dessa forma, sobrepor-se a sinais de alguma moderação dos riscos externos. Segundo James Knightley, economista-chefe internacional do ING, é verdade que houve uma espécie trégua nas tensões comerciais entre os EUA e a China, que a possibilidade de um Brexit sem acordo foi adiada e que a Alemanha poderá estar a optar por uma posição mais suave em relação a excedentes orçamentais.

“Mas os dados externos permanecem fracos com o crescimento na China e na Europa a continuarem a desiludir”, vincou Knightley. “Portanto embora hajam eventuais aspetos positivos no lado externo, é pouco provável que se traduzam numa narrativa de crescimento mais forte nos EUA em breve”.

Olhando para a frente, os analistas salientam que é difícil tentar antecipar as decisões da Fed. Os analistas do Danske Bank acreditam que Powell deverá manter as linhas gerais da linguagem no comunicado e na conferência de imprensa após a reunião, nomeadamente a frase sobre a Fed “agir de forma apropriada para sustentar a expansão” que demonstra que está a pronto a tornar a política monetária mais acomodatícia mas sem se comprometer.

Bill Diviney, economista sénior do ABN-Amro, recorda que Powell tem apoiado, de forma tácita, a noção que os bancos centrais têm de agir de forma preventiva para evitar a necessidade de medidas mais agressivas e não-convencionais para combater uma travagem severa ou uma recessão.

Por outro lado, a Fed disse de forma clara que está a fazer um ajustamento de meio de ciclo e não a embarcar num ciclo mais prolongado de corte. Diviney acredita que o banco central irá fazer um corte agora e outro na reunião de Dezembro, antes de parar para observar os efeitos.

Esse plano provavelmente não irá agradar muito a Donald Trump, que continua a pressionar a Fed a cortar os juros, dando a Europa e o Japão como exemplos, pois têm taxas negativas.

 

 

 

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