O congolês Moïse Kabagambe, de 24 anos, foi espancado até à morte no dia 24 de janeiro perto de um quiosque no Rio de Janeiro. O jovem, que chegou ao país em 2014 como refugiado político, era empregado de mesa. Segundo a família, pretendia cobrar dois dias de pagamentos atrasados na segunda-feira em que foi morto.
A polícia encontrou-o numa patrulha de rotina, de pés e mãos amarrados, sem vida, nas escadas do estabelecimento.
As imagens das câmaras de segurança do quiosque na Barra da Tijuca revelam, segundo o “G1”, pelo menos cinco pessoas a agredi-lo durante cerca de 15 minutos. O espancamento continuou mesmo depois de a vítima ter ficado inconsciente.
Testemunhas disseram “que dois homens perseguiram a vítima que fugia correndo pela areia, quando na subida do quiosque Tropicália, o mesmo foi alcançado, onde apanhou com um porrete, e a vítima gritava, pedindo para não o matarem”.
O proprietário do quiosque já foi intimado pela Polícia Civil, mas ainda não prestou depoimento. A expectativa é que compareça esta terça-feira na Delegacia de Homicídios da Capital, responsável pela investigação. De acordo com a polícia, o comerciante, que não teve a identidade revelada, cedeu espontaneamente acesso à videovigilância.
“As investigações estão em andamento na Delegacia de Homicídios da Capital (DHC). Os agentes analisaram imagens de câmaras de segurança e estão, neste momento, em diligências para identificar e prender os autores do crime”, informou a Polícia Civil.
Até ao momento, nenhum dos homens do vídeo foi formalmente identificado. A DHC já ouviu oito testemunhas, entre parentes de Moïse e frequentadores do local. Ninguém foi detido até agora.
O autarca do Rio, Eduardo Paes, lamentou hoje a morte e quer ver justiça para o jovem. “O assassinato de Moïse Kabamgabe é inaceitável e revoltante. Tenho a certeza de que as autoridades policiais atuarão com a prioridade e rigor necessários para nos trazer os devidos esclarecimentos e punir os responsáveis. A prefeitura acompanha o caso”, escreveu no Twitter.
Os pais só souberam que Moïse tinha morrido durante a manhã de terça-feira, 25, quase 12 horas após o crime. Yannick Kamanda, primo da vítima, partilha com o “G1” o que viu nas imagens da videovigilância.
“O início da gravação que eu vi é ele reclamando com o gerente do quiosque. Alguns minutos seguintes, o gerente pegou um pedaço de madeira para ameaçar ele. Até então, ele estava só recuando. E o cara foi atrás dele. Como ele estava reivindicando alguma coisa, ele pegou uma cadeira e dobrou para se defender. Ele não chegou a atacar ninguém. O gerente chamou uma galera que estava na frente do quiosque. Até então tinha só um sentado”, contou .
A autópsia indicou que Moïse tinha várias “áreas hemorrágicas de contusão” e vestígios de broncoaspiração de sangue. A causa da morte foi traumatismo do tórax, com contusão pulmonar causada por ação contundente, segundo o “G1”.
Yannick assegura que o dia de trabalho no quiosque continuou, mesmo depois da morte de Moïse. “Eles foram embora e ficou só o gerente do quiosque. E ele deitado no chão, como se nada estivesse acontecendo. Trabalhando, atendendo cliente. E o corpo lá”.
O Tropicália passou o último fim-de-semana fechado e as redes sociais do estabelecimento foram apagadas ou se tornaram restritas desde que o caso foi tornado público, garante a “Exame”.
Moïse chegou ao Brasil com a mãe e os irmãos há oito anos, como refugiado político, depois de fugir da guerra no Congo. No funeral que ocorreu no dia 30, a mãe, Ivana Lay, disse à “TV Globo” que está inconformada com o crime. “Meu filho cresceu aqui, estudou aqui. Todos os amigos dele são brasileiros. Mas hoje é vergonha. Morreu no Brasil. Quero justiça”.
A comunidade congolesa no Brasil divulgou uma carta de repúdio: “Esse ato brutal não somente manifesta o racismo estrutural da sociedade brasileira, mas claramente demonstra a xenofobia dentro das suas formas contra os estrangeiros”.
“O Brasil é um país recetor dos refugiados, ratificou a convenção de Genebra, junto com todos os protocolos adicionais. Uma das bases é a proteção da vida humana dos refugiados que são recebidos”, relembrou Placide Ikuba, representante da Embaixada do Congo.
A morte do jovem provocou uma onda de tristeza e revolta nas redes sociais. “Esse ato brutal não manifesta somente racismo estrutural da sociedade brasileira, mas também a xenofobia em sua pior forma. Exigimos justiça para Moise, seus familiares e amigos”, escreveu no Twitter o Instituto Marielle Franco.
“O Rio de Janeiro é a 2ª cidade que mais recebe imigrantes no Brasil. Foi Xenofobia! Foi racismo! Justiça para Moises!”, tweetou a vereadora do Rio de Janeiro, Tainá de Paula.
No Instagram, a filósofa, escritora e feminista negra Djamila Ribeiro, disse: “O desprezo pelas vidas negras nesse país é aterrorizante. Toda solidariedade à família de Moise Kabagambe. As autoridades do Rio de Janeiro precisam dar respostas sobre esse crime bárbaro”.
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