Causou polémica a recente aprovação no Parlamento duma lei que isenta os Partidos do pagamento de IVA e deixaria de limitar os donativos que lhes forem feitos. Acho esta polémica injustificada, uma perda de tempo que apenas prejudica a apreciação de assuntos verdadeiramente importantes. Quais? Para não ferir suscetibilidades cá na terra, vejam-se exemplos de leis que marcaram os destinos de outros países, que cito para ajudar o nosso Parlamento no seu programa para 2018: no Turquemenistão desde 2005 é proibido o playback para preservar a “verdadeira cultura”; no Irão é proibido aos homens usar rabos-de-cavalo ou cabelos espetados; na China desde 2007 é proibida a reencarnação de monges budistas sem autorização do governo.
Acredito que a única motivação daqueles que tentam aviltar esta lei é a inveja. Se todo cidadão português sonha em não pagar IVA, o que tem de estranho esta medida? Há gente a vangloriar-se de ter contas nas Ilhas Caimão para fugir aos impostos, mas quando são os partidos que não pagam, e dentro da lei, já se critica. Para mais, uma crítica gratuita (a palavra não é talvez a mais adequada), pois toda a gente sabe que são sempre os mesmos que pagam as contas. Argumenta um constitucionalista que esta lei viola o princípio da igualdade. Isto tem é que ser feito para todos, e faz bem o nosso Parlamento ir começando já!
Depois, o Parlamento foi acusado de ter feito esta proposta às escondidas, e nem haver atas das reuniões do grupo de trabalho que a fez. Há quem diga que é uma violação da transparência, um conluio partidário para aprovar “pela calada um conjunto de benesses privadas”. Desde quando o nosso Parlamento é transparente? E por uma vez que estão quase todos os parlamentares de acordo (votaram contra o CDS e o PAN), o consenso já não é importante? E se não há atas não é para esconder nada, é porque se trabalhou depressa por o ano estar a acabar – o que mostra a má vontade de achar que foi “sintomática a aprovação a poucos dias do Natal”. Sintomática, de quê? Do Natal ser no fim do ano? Por uma vez que a nossa Assembleia foi produtiva e fez as coisas a tempo, vai de criticar. Preso por ter cão, preso por não ter.
Diz um despeitado num blog que o Parlamento e os Partidos deviam era estar ao nosso serviço, e não o contrário. Mas é o que se passa! Temos um sistema político de luxo, não de lixo, e os luxos pagam-se. Se os partidos estão ao serviço do povo, o que esta lei faz é devolver ao povo (contribuinte) um problema. Consta que o Presidente terá dito que, mal saia da cama do hospital, vai vetar a lei. Não saia, não saia!
Nota biográfica:
Hemp Lastru (n. 1954, em Praga) é sobrinho neto de Franz Kafka. Democrata convicto, ativista e lutador político, é preso várias vezes pela polícia secreta checoslovaca, tendo sido sentenciado em 1985 ao corte de uma orelha sob a acusação de “escutar às portas”. Abandona a política em 1999, deixando Praga para residir em Espanha. Mudou-se para Portugal em 2005 porque “gostaria de viver num país onde os processos são como descrevia o meu tio-avô nos livros.”