Regressemos a 10 de julho de 2016, na Alemanha, ao final do dia.
Estou literalmente fechada entre quatro paredes, ligo a televisão numa casa que não é a minha e apenas na companhia de mais uma pessoa. Comporto-me exatamente como a nacionalidade portuguesa me define: quieta, calada, em sofrimento e sem grandes manifestações (próprio de quem sabe que não devem existir muitos portugueses à minha volta, os custos de “sermos poucos”).
No final do jogo demorei a acreditar que aconteceu. Antes do jogo acreditei sempre que podia acontecer. Mas, todos sabemos que no futebol como nas outras realidades, a justiça é variável, e o que é previsível é que os menos poderosos percam. Mas não vou insistir na minha versão desse dia. Sobre a emoção desses momentos e dos que se seguiram toda a gente falou e disse e escreveu. Uns criticaram, outros enalteceram e outros ainda consideraram exagero. Enfim, o normal. As opiniões foram díspares, variadas e mais do mesmo. Mas o país voltou a ser, de certa forma, o centro das nossas discussões, do nosso orgulho, e não apenas das nossas frustrações. Isso, para uma otimista sportinguista, como eu, é melhor do que pior.
Quando pensei em escrever este artigo, o primeiro que inauguro neste projeto jornalístico de futuro, veio-me à ideia esse dia. Essa data pode ser considerada o ponto inicial, um (re)começo, porque apesar de uma nada ‘silly season’ que este Verão foi, foi ali que Setembro começou. Até passarmos ou não o próximo Orçamento do Estado (será em Outubro), contornarmos o défice, o FMI, a Comissão e os habituais descrentes no nosso país, a crise dos valores europeus, as assustadoras vagas de xenofobismo e o medo dos eleitores confusos no Reino Unido e na Alemanha, as reações extremadas de alguns jovens de extrema-direita na Hungria – já vos disse que assisti ao jogo de Portugal-Hungria em Budapeste? Pois assisti e foi revelador – e na França, uns EUA a arder lentamente, apesar disso tudo o nosso “ano letivo” começou ali, em Julho, e não dois meses depois.
Obviamente, os problemas persistem. A necessidade de uma estabilização económica e de um crescimento sustentável da economia estão par a par e são dependentes. Como são ainda assinaláveis as desigualdades no nosso país, a necessidade e as várias tentativas de organizar este Estado Estadão, ineficiente, ainda cheio de vícios, como a nossa sociedade, aliás. E tantas, tantas outras questões que temos para resolver e que aqui não cabem por limite de caracteres. Sabemos que a falta de saúde da nossa economia tem sido ainda nos “bons tempos” o sinal de que “nos tempos maus” mais portugueses sofrerão. Para minimizar esses impactos, as políticas públicas são centrais. E para termos melhores políticas públicas precisamos de ter melhores, mais bem preparados e mais conscientes decisores.
Claro que o diagnóstico está, há muito, feito, e que falta concretizarem-se as melhores decisões em tempos de incerteza, tarefa árdua e contínua. Temos que ser rápidos na defesa e concretos, coerentes e fortes no ataque. É precisamente por isso que me lembro do Europeu de Futebol de 2016, de como o trabalho de equipa, num jogo muito diferente daquele que tínhamos feito até aí (onde a técnica foi mais vista na precisão do que no espetáculo, mais racional, houve mais método e mais estratégia), é uma boa lição para todos nós.
Queremos “jogar bonito” ou ganhar? E queremos mesmo ou não? Afinal, este não é um artigo sobre futebol… mas, poderia ser.