Há muitos anos que alertamos para a necessidade de apostar na prevenção e na promoção da saúde. Em 2017, a Ordem dos Psicólogos Portugueses apresentou ao Ministério da Saúde uma proposta para um Programa Nacional de Prevenção da Depressão, seguindo um modelo de stepped care.

Nesse mesmo ano, entre outras acções deste âmbito, desafiámos o Governo a adoptar uma Agenda de Prevenção e Desenvolvimento das Pessoas para Competitividade e Coesão Social. A Depressão já se destacava entre os problemas de saúde mental e o país investia menos de 1% em prevenção, de forma geral. A nossa visão era ser necessário investir prioritariamente nos cuidados de saúde primários para mitigar este problema, sendo para isso necessário um mínimo de profissionais de saúde que não existiam, entre eles psicólogos.

Mas se apresentámos uma proposta específica para um problema específico também lançámos a ideia de uma agenda estratégica, mais transversal às políticas públicas, que permitisse prevenir problemas (não só de saúde) e desenvolver as pessoas, as suas competências, nomeadamente as socioemocionais. Argumentávamos que assim se contribuiria para poupar na despesa e sofrimento que muitos dos problemas preveníveis causavam.

Além disso, poderíamos desenvolver resiliência, ajudar a construir factores protectores e preparar as pessoas para lidarem com futuras crises, com os seus desafios de vida e com aquilo que as organizações necessitam, sejam para a prestação de serviços públicos de maior qualidade, mais humanos, mas também para serem mais produtivas. Na verdade, criando assim condições para uma maior sustentabilidade dos nossos sistemas públicos, mais desenvolvimento económico e maior equidade.

Sabíamos da dificuldade de uma agenda desta natureza. A correnteza da política do dia-a-dia cria uma pressão para o imediato, para o curto prazo e para o soundbite. Já era assim. Agora é mais. Não adianta apenas criticar os responsáveis políticos. Não adianta a retórica do nós e eles. Primeiro somos todos responsáveis por esta lógica vigente quando pressionamos para o aqui e agora, já, sem negociar ou sem considerar contínuos, compromissos ou meios termos. Segundo, porque nem sempre reforçamos aqueles que tomam iniciativas menos visíveis, mas que deixam um legado para o futuro.

Claro que aqueles que estão investidos de responsabilidades políticas e em cargos públicos, os que são por nós eleitos e nomeados, têm uma dimensão da responsabilidade acrescida. No compromisso que assumiram connosco está implícita e explicitamente a causa pública. O bem comum. E quando nós, horda tribal, no calor das nossas emoções, nos falta racionalidade, esperamos (ou acho eu que devemos esperar) dos nossos líderes a coragem da sobriedade, prudência, diálogo, cooperação e preparação do futuro, muito para além da espuma dos dias e mesmo que isso possa, no limite, custar uma reeleição. Escrevo sobre isso num momento feliz para nós, para os nossos jovens, para o futuro do país.

Depois de há um ano a proposta do Orçamento do Estado para 2023 ter aparecido com a novidade de propor a contratação de psicólogos para o ensino superior, alertámos para que o desenho do que estava a ser proposto não fosse com um enfoque clínico, remediativo e de aparente substituição do que deve ser o papel do Serviço Nacional de Saúde. Deveria ser preventivo. A redacção foi alterada nesse sentido para nossa satisfação.

Foi recentemente apresentado o Programa para a Promoção da Saúde Mental no Ensino Superior, feito de forma multidisciplinar, transversalmente a várias áreas do governo das políticas públicas e com essa articulação no seu desenho e nas soluções para implementação, mas para além disso criado desde início já com os recursos disponíveis para a sua execução e ferramentas disponibilizadas para permitir a sua implementação.

A implementação é imediata, mas projectada para um horizonte de três anos. Está prevista a sua avaliação. Está prevista a contratação de recursos humanos qualificados. Está prevista a dignidade dos profissionais a serem contratados pelo estímulo à contratação permanente. Melhorias, alternativas, reparos e preferências existirão sempre e em contínuo, mas o mérito do que está em curso e o exemplo que nos é dado merece apoio e reconhecimento.

Precisamos de construir mais assim. Não dá grandes notícias. Aparece pouco nos comentários que enchem os media. Não se discute muito nas redes sociais nem nos cafés. Mas os nossos jovens estudantes do ensino superior passarão ter condições muito melhores para a vivência da sua etapa académica, na construção do seu projecto de vida e autonomização, para serem parte do nosso futuro colectivo. Previne-se. Dá-se enfoque ao desenvolvimento de competências socioemocionais preparando pessoas mais resilientes e profissionais mais adaptados às exigências socioeconómicas crescentes.

Pois é, se não aparece mais nos feeds, ou se não passa muito e com mais destaque nos crivos editoriais, talvez mereça a nossa reflexão: de que modo estamos todos a contribuir para isso pelo nosso impulso para o vibrante das emoções “fortes”? É da nossa natureza humana? É. Mas, não significa que não tenhamos a possibilidade de a tentarmos controlar um pouco, aprendendo a regular mais e melhor as nossas emoções.

E, já agora, talvez a escassez de boas notícias, que não significa que não haja imensa coisa boa para noticiar, seja uma oportunidade de diferenciação e que permita que estas ganhem mais destaque. Para isso temos todos que resistir aos enviesamentos que nos rasteiram todos os dias na procura da satisfação imediata de vibração emocional. Satisfaz-nos no imediato, mas como no consumo de outras substâncias, a prazo, os seus efeitos poderão ser muito nocivos, individual e colectivamente. Não vivemos só de más notícias!

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.