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Nova almofada de capital contracíclica de 0,75% para a banca pesa 1,33 mil milhões

A notícia surge numa altura em que os bancos se preparam para voltar em força à distribuição de dividendos. Os valores indicativos por banco oscilam entre 50 milhões a cerca de 200 milhões de euros, apurou o JE.
7 Outubro 2024, 15h07

O Banco de Portugal prepara uma reserva contracíclica de 0,75% sobre a exposição dos bancos ao setor privado não financeiro em Portugal.

O tema vai para consulta pública antes de entrar em vigor que está previsto ser a 1 de janeiro de 2026. A notícia surge numa altura em que os bancos se preparam para voltar em força à distribuição de dividendos.

Os valores indicativos por banco oscilam entre 50 milhões a cerca de 200 milhões de euros, apurou o JE.

Num cálculo feito pelo Jornal Económico, e tendo em contas os ativos ponderados pelo risco (RWA) do setor em junho, que eram de 176,9 mil milhões de euros, o valor poderá representar um custo de cerca de 1,33 mil milhões de euros.

O Banco de Portugal defende que a ativação da reserva contracíclica num ambiente neutro permite mitigar a incerteza na avaliação do risco sistémico cíclico, bem como os desfasamentos na implementação associados às decisões de política macroprudencial.

A instituição liderada por Mário Centeno anuncia que coloca em consulta pública, até 19 de novembro de 2024, um projeto de aviso (e respetiva nota justificativa) através do qual fixará a percentagem da reserva contracíclica de fundos próprios em 0,75% do montante total das exposições de crédito do setor bancário nacional ao setor privado não financeiro ponderadas pelo risco. Esta percentagem deverá ser aplicada em base individual e em base consolidada.

A reserva contracíclica de fundos próprios é um dos instrumentos disponíveis nos instrumentos macroprudencial do Banco de Portugal. Corresponde a uma reserva adicional constituída por fundos próprios principais de nível 1 (Common Equity Tier 1), que tem como objetivo proteger o setor bancário nos períodos em que o risco sistémico cíclico aumenta, devido a um crescimento excessivo do crédito. Quando os riscos se materializam ou diminuem, esta reserva adicional de fundos próprios garante que o setor bancário tem maior capacidade para absorver perdas, e permanecer solvente, sem interromper a concessão de crédito à economia real.

Em comunicado, o Banco de Portugal diz que a reserva contracíclica de 0,75% será aplicada numa fase em que o risco sistémico cíclico é considerado neutro (i.e., quando não há acumulação, nem materialização do risco sistémico cíclico).

“A constituição de reservas de fundos próprios numa fase inicial do ciclo deixa as instituições financeiras numa posição mais sólida e com maior capacidade para absorção de perdas inesperadas resultantes de choques sistémicos no futuro”, explica o supervisor.

A reserva contracíclica constitui uma reserva adicional de fundos próprios principais de nível 1 (CET1) aplicável às exposições de crédito ao setor privado não financeiro das instituições de crédito. A percentagem é atualmente definida entre 0% e 2,5%, sendo calibrada em múltiplos de 0,25 pontos percentuais. Ultimamente tem sido sempre decidido por uma reserva de 0%.

A partir de janeiro, o novo teto mínimo deixa de ser zero, à semelhança do que já acontece em outros países, para passar a ser 0,75%.

O não cumprimento da reserva contracíclica implica restrições à distribuição de dividendos e à elaboração de um plano de conservação de capital, alerta o BdP.

O objetivo principal é permitir que o setor bancário possa absorver perdas relacionadas com a materialização de risco sistémico cíclico, mantendo a concessão regular de crédito à economia. Caso o risco sistémico se materialize, a reserva contracíclica será libertada, total ou parcialmente.

O Banco de Portugal, enquanto autoridade macroprudencial, é responsável por fixar e divulgar a percentagem de reserva contracíclica. Até agora, o seu enquadramento baseia-se na constituição de uma reserva em períodos de acumulação de risco sistémico cíclico. O BCE tem poder de intervenção sobre as decisões nacionais relativas à reserva contracíclica.

Até aqui, as decisões do Banco de Portugal sobre a reserva contracíclica têm seguido uma abordagem quantitativa, baseada na monitorização de um conjunto de variáveis que indiciam a acumulação do risco sistémico cíclico, complementada com informação qualitativa quando considerada relevante.

A abordagem quantitativa baseia-se na monitorização de um conjunto de variáveis que indiciam a acumulação do risco sistémico cíclico. As categorias destas variáveis incluem a potencial sobrevalorização dos preços dos imóveis (por exemplo, rácios preço-rendimento dos imóveis); a evolução do crédito (por exemplo, crescimento real do crédito total ou do crédito bancário); os desequilíbrios externos (por exemplo, saldo da balança de transações correntes em percentagem do PIB); a solidez do balanço dos bancos (por exemplo, rácios de alavancagem); o serviço da dívida do setor privado (por exemplo, rácio entre o serviço da dívida e rendimento); o potencial valorização incorreta do risco (por exemplo, crescimento real do preço dos títulos); medidas derivadas de modelos que combinam o diferencial do crédito em relação ao PIB com uma seleção de medidas acima referidas.

“O aumento da reserva contracíclica no início do ciclo financeiro permite um aumento gradual da reserva, garantindo uma acumulação atempada de capital para fazer face a choques sistémicos cíclicos, sem restringir significativamente a concessão de crédito”, justifica o BdP.

Por outro lado, o aumento gradual das reservas, no contexto de níveis elevados de capitalização e rentabilidade, mitiga os custos para a atividade económica.

“O sistema bancário português registou em 2023 níveis de rendibilidade historicamente elevados, prevendo-se que se mantenham em 2024-25”, segundo o BdP.

Banco de Portugal segue tendência europeia

Algumas autoridades nacionais no Espaço Económico Europeu e, em particular, na área do euro já reviram o respetivo enquadramento da reserva contracíclica.

Desde a pandemia de Covid-19, 15 países ativaram a reserva contracíclica para níveis superiores a
zero na fase neutral do ciclo financeiro, segundo dados do BdP.

“Neste contexto, o Conselho de Governadores do Banco Central Europeu emitiu uma declaração, em 28 de junho de 2024, incentivando as autoridades nacionais da área do euro a aumentar os requisitos de reserva de fundos próprios libertáveis”, acrescenta o BdP.

O Banco de Portugal decidiu rever o enquadramento metodológico de cálculo, “em linha com a tendência seguidas por várias autoridades macroprudenciais na Europa e com as orientações de diversas autoridades internacionais”, quanto ao que “fundamenta as suas decisões nesta matéria, tornando-o mais abrangente, para poder ativar a reserva contracíclica na fase em que o risco sistémico cíclico se encontra num nível neutro, ou seja, não se encontra numa fase de acumulação, nem de materialização”.

Na sequência desta alteração, e considerando o contexto económico atual, os atuais níveis de rentabilidade e de capitalização das instituições de crédito e dado o mandato de promoção da resiliência do setor financeiro atribuído ao Banco de Portugal, enquanto autoridade macroprudencial nacional,  “justifica-se a revisão do nível da percentagem da reserva contracíclica de fundos próprios em Portugal”, revela o supervisor.

Após a constituição da reserva nesta fase inicial do ciclo financeiro, a expetativa do Banco de Portugal é que esta percentagem se mantenha inalterada enquanto se mantiver a atual fase do ciclo financeiro. No entanto, se o Banco de Portugal identificar uma acumulação excessiva de risco sistémico cíclico, a taxa de reserva contracíclica poderá ser aumentada, alerta o supervisor nacional.

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