A guerra passou a ocupar grande parte do tempo jornalístico, sobretudo nos canais de notícias. Nestes órgãos, as notícias e análises feitas por especialistas em estratégia e relações internacionais visam essencialmente retratar a guerra como um acontecimento natural e inerente à acção humana permanente. A quantidade de vozes com intervenção nos canais dá uma falsa noção de pluralidade de opiniões quanto à guerra, porque, na verdade, só existe uma narrativa, que pode ser resumida da seguinte forma: “devemos estar preparados para fazer guerra”.

A comunicação social acaba construir um campo de naturalização da guerra, sem dar espaço a qualquer outra perspectiva. Assim, quem ousa defender abertamente um caminho de paz é enquadrado no espectro de apoio à Federação Russa. E os riscos da guerra só podem ser anulados através de uma resposta militar cujo desfecho será a derrota militar da Rússia. Esta posição vem negligenciar, mais uma vez, a possibilidade de um país derrotado e ressentido se converter num país isolado e movido por um espírito de vingança. Um isolamento susceptível de fomentar uma escalada arsenalista no futuro.

O discurso jornalístico e o comentário servem, fundamentalmente, para estabelecer uma imagem do inimigo, ao estilo da proposição de Carl Schmitt, que acaba por impossibilitar qualquer espécie de diálogo e de aproximação política, tendo como único caminho uma aniquilação do inimigo para a obtenção da segurança colectiva.

Quando este tipo de discurso conquista a adesão dos sectores mais influentes e importantes no processo de formulação da política, mesmo não sendo maioritário ou representativo da maior parte da população, reduz significativamente o espaço de actuação dos políticos, retirando-lhes, por conseguinte, margem de manobra e capacidade decisória, sobretudo em sociedades abertas e democráticas onde os estudos de opinião são realizados sistematicamente. Por isso, os políticos actuam dentro de um campo de opinião já contaminado e onde está instalado um caminho único no sentido da realização da guerra.

Os políticos não se devem esconder por detrás da opinião produzida nos órgãos de comunicação social para assumirem o custo de uma decisão essencialmente política, fazer uma guerra. Acaba, assim, por ser insuficiente decidir com base na opinião mediática momentânea, porque a guerra deve ser sempre encarada como algo grave e com custos elevados para o futuro da humanidade.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.