Foi publicada em 3 de maio a Lei n.º 15/2017 que proíbe a emissão de valores mobiliários ao portador, no quadro das medidas ligadas à prevenção da fraude e evasão fiscais e à prevenção da utilização do sistema financeiro para branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo.

No entanto, o modo de operacionalizar a conversão dos valores mobiliários em nominativos parece estar ainda por pensar, prevendo-se apenas que os valores ao portador devam ser convertidos em nominativos, com identificação do titular, no prazo de seis meses, sob pena de deixarem de poder ser transmitidos e ser suspenso o direito aos resultados associados aos mesmos (dividendos e juros).

Prevê a lei que a conversão seja regulamentada no prazo de 120 dias, podendo apenas sobrar 60 dias às sociedades para a operar. As normas do Código dos Valores Mobiliários sobre a transmissão e exercício dos valores mobiliários ao portador foram já revogadas, ficando por saber como poderão os titulares transmiti-los ou exercer os direitos inerentes durante tal período.

Fica também por saber o que acontece às distribuições após o período de seis meses sem que os titulares tenham procedido à conversão: os titulares perdem o direito a tais distribuições ou poderão reclamar os montantes distribuídos relativos às suas ações aquando da conversão?

As dificuldades práticas inerentes à imposição da conversão são inúmeras, bastando recordar o processo de redenominação do capital das sociedades em euros, em que valeu como solução de recurso a redenominação automática. No presente caso poderá ser bastante mais difícil de implementar a conversão, pois é perfeitamente possível alguém nem saber que é acionista de uma sociedade, sem que tal tenha algo de censurável.

Curioso é que a transmissão de valores não convertidos dentro do prazo (que se faz mediante a entrega do mesmo) esteja proibida, mas que o exercício do direito de voto na letra da lei não esteja inibido.

Nos últimos anos foram vários os países que adotaram medidas semelhantes. Na Bélgica, o processo iniciou-se em 2005, com a conversão automática dos valores mobiliários ao portador em escriturais em 2008 e prevendo-se medidas de concretização da conversão até 2025! Em 2015, foi a vez do Reino Unido e do Luxemburgo proibirem os valores mobiliários ao portador, com previsão do cancelamento dos mesmos e de pagamento aos titulares do produto do cancelamento.

Resta esperar que a regulamentação da conversão seja feita de forma completa e eficaz, quiçá aproveitando soluções que já se encontram consagradas – como a que prevê que os títulos que não sejam convertidos em ações escriturais apenas legitimam o titular para solicitar o registo – para que a situação dos valores mobiliários não convertidos e dos emitentes não fique indefinida ad aeternum.