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O Joker

E só com uma penalização adequada dos intervenientes (todos), com uma monitorização correcta, isenta e eficaz das entidades competentes, com avaliações dos créditos realistas e responsáveis, poderemos almejar não sermos “gozados” por nós próprios, como temos, infelizmente, sido.
15 Maio 2019, 07h15

No seguimento da audição parlamentar de um reconhecido empresário acerca dos empréstimos ruinosos efetuados pela Banca portuguesa – que tiveram repercussões directas na carteira de todos os cidadãos – várias questões se levantaram, e várias foram as conclusões retiradas desse (e de outros) episódios.

Em primeiro lugar, à declaração “eu, pessoalmente, não tenho dívidas”, foi aposto um tom de ironia que é difícil de não ter em conta. Na verdade, como é que um empresário, que publicamente se sabe cujas empresas devem entre 850 a 1.000 milhões de euros à banca, pode dizer que “pessoalmente, não tem dívidas”?

No fundo, a declaração acaba por ser verdadeira, (é perfeitamente legítimo que a personalidade jurídica das empresas não se confunda com a do “dono”), mas causa perplexidade no comum dos mortais. E, por arrasto, impacta-nos como injusta, desadequada, desproporcional, ou até vexatória.

Por essa razão, circularam já nas redes sociais, “memes” do referido empresário, mascarado de “Joker”, o inimigo brincalhão do Batman. Melhor caricatura, de toda a situação, era impossível.

Contudo, por detrás de toda esta “brincadeira”, há que reflectir.

A culpa é de quem lhe emprestou o dinheiro? A culpa é de quem fiscalizava quem lhe emprestava o dinheiro? A culpa é do próprio? Ou a culpa é do bem que foi oferecido como garantia? De quem é a culpa? Morre solteira?

Na minha opinião – que tenho a sorte de poder partilhar nestas breves linhas independentemente do mérito ou qualidade da mesma – a culpa deveria ser dividida (e, consequentemente, as responsabilidades), por todos os intervenientes nesta “cartada”.

Pelo empresário que “arriscou” com dinheiro “emprestado”. Pelo Banco que financiou uma operação que se tornou “ruinosa”. Pelas entidades de supervisão que não exerceram as suas funções de controlo. E pelo Banco, gestor da garantia depreciada.

Já tive a sorte de trabalhar na Banca, onde aprendi algumas coisas importantes. Sou do tempo em que “tudo era permitido para se conseguir atingir os objectivos”, ou “quanto mais se emprestar, melhor”. Mas de há muito para cá, que não é assim. Mesmo os políticos, normalmente adormecidos durante 3 dos 4 anos de mandato, já começam a manifestar algum desconforto com este tema…

E só com uma penalização adequada dos intervenientes (todos), com uma monitorização correcta, isenta e eficaz das entidades competentes, com avaliações dos créditos realistas e responsáveis, poderemos almejar não sermos “gozados” por nós próprios, como temos, infelizmente, sido.

É que, lembrem-se, temos vários “jokers”, mas não me consigo lembrar de nenhum “Batman”…..

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