O Papa Francisco afirmou, e eu não me canso de o citar, que nós vivemos uma “mudança de época”. A um mundo bipolar sucedeu um mundo multipolar, mundo este que vê as polaridades de poder mudar e, simultaneamente, perderem lastro democrático.
A comunidades homogéneas sucedem comunidades marcadas pela diversidade e pela diferença, diversidade e diferenças geradoras de novas tensões. A carreiras profissionais longas, estáveis e expectáveis vemos suceder carreiras profissionais construídas individualmente.
Vejam o exemplo da informação. Há 50 anos a informação chegava aos cidadãos duas vezes por dia, de manhã e com os vespertinos. Era uma informação filtrada, tratada e enquadrada por jornalistas experientes.
Hoje, com a diversidade de meios, nomeadamente dos meios online, e com as redes sociais, recebemos “informação” a toda a hora, do mundo inteiro. Lamentável é que, frequentemente, o comprometimento com a verdade seja pequeno. Esta nova sociedade é, sem dúvida, uma sociedade mais rica. A pluralidade enriquece-a, mas é mais exigente. Exigente para os que a integram e para os que nela assumem responsabilidades.
Ora, uma sociedade mais complexa é uma sociedade mais exigente. Para os que a integram e para os que têm a ambição de a dirigir. O caminho de distanciamento por parte dos cidadãos é profundamente lamentável e impõe a cada um de nós um esforço de exercício continuado de cidadania, nomeadamente através da participação. Aos que têm a ambição de assumir responsabilidades é exigível que o longo prazo seja o seu horizonte, que a concepção de modelos alternativos de sociedade seja o fundamento e a explicação da sua acção e dos seus programas.
Num mundo a preto e branco parecem, por vezes, ser suficientes as visões vulgarizadas das ideologias. Num mundo cada vez mais plural, ou nos suportamos em concepções filosóficas e políticas fortes e estruturadas, ou caminhamos para sociedades sem alma.
É também por isso que o exercício do poder não se pode reduzir à mera gestão que nos invade com quantificações e ratios que ninguém sabe muito bem como, por quem e com que objectivo foram definidos.
Se o mundo é cada vez mais plural, também cada vez precisa mais de política e opções políticas que a todos enquadrem, numa convivência de iguais na diferença. A não o fazermos, a “mudança de época” que vivemos pode vir a ser o início de uma nova “época de trevas” e de uma sociedade de ausência.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.