A análise sobre a política ambiental nacional referente à produção de energia de fonte renovável, compreende igualmente a perspetiva de evolução do modelo de remuneração municipal associado ao rendimento gerado pelas diferentes atividades económicas assentes na exploração de recursos naturais. Em concreto, e com maior atualidade no que respeita à instalação de centrais de produção de energia de fonte renovável (eólicas, fotovoltaicas), a correta compreensão sobre o quadro legal e fiscal que ocupa a presente matéria, desafia-nos a uma viagem no tempo até à mais recente opção de definição de uma compensação (adicional) aos municípios, trazida pelo Decreto-Lei n.º 72/2022, de 19 de outubro.

O caminho que tem sido percorrido desde a definição da renda municipal à qual ainda se encontram sujeitas as empresas detentoras de exploração de parques eólicos correspondente a 2,5% sobre o pagamento mensal feito pela entidade recetora da energia elétrica produzida (sem prejuízo da salvaguarda de contratos anteriormente realizados onde tal percentagem é, alguns casos, superior), à qual se seguiu a possibilidade de imputação da derrama municipal por exploração de recursos naturais na então tão falada Lei n.º 2/2007, de 15 de janeiro, confirmam uma política contínua de compensação municipal.

O exercício de participação dos municípios nos benefícios retirados da exploração dos recursos naturais na respetiva circunscrição territorial local, capturando parte do rendimento real das empresas abrangidas, não é um exercício fácil, sendo vários os instrumentos que, ao longo do tempo, têm servido tal propósito sem que um efetivo exercício de balanço ou simplificação tenha sido feito. Resiste apenas a certeza de que os municípios são os gestores do território a nível local e que o sucesso de qualquer política pública em matéria ambiental dependerá sempre do compromisso e partilha com o poder local, em cumprimento da autonomia local constitucionalmente protegida.

Ora vejamos. Na perspetiva da captura do rendimento gerado ao nível local, e para além da referida renda, então impulsionada pela necessidade de participação financeira pelos municípios do processo de valorização local pela disponibilidade dos respetivos recursos endógenos (centrais eólicas), ficou desde logo clara a necessidade de abranger outros tipos de exploração de recursos naturais. Coube assim à derrama municipal o desempenho de um papel central. Recorde-se que, até 1993, a derrama acabava por assentar no critério do local da sede estatutária, ou seja, ao município onde se situasse a sede da empresa atribuir-se-ia o poder tributário, uma vez que se entendia ser aí que ocorria a “colecta liquidada na respectiva área”, explicava Saldanha Sanches.

O entendimento de que tal critério poderia revelar-se injusto, sendo a sede estatutária facilmente “deslocalizada” por interesse do sujeito passivo, espoletou a necessidade de diferentes critérios de repartição, sendo certo que apenas com a sede não se permitia uma conexão entre a respetiva atividade de exploração e o município em cujo espaço territorial se realizava. Desde logo, com base nos custos com a massa salarial, e posteriormente, com referência ao volume de negócios assente na exploração de recursos naturais. De forma direta e transparente, acautelava-se a participação dos municípios nos rendimentos gerados por outras tipologias de exploração, como seja, centros hidroelétricos (barragens), minas, pedreiras, entre outros, mesmo que a sede da empresa se mantivesse num qualquer outro município.

Foram várias as disputas municipais por receitas fiscais que não encontraram na lei um modelo eficiente de repartição. Os termos de aplicação da derrama municipal ditaram a sua fraca aplicação, tendo conduzido a uma alteração do regime em 2013. Não obstante, a derrama municipal não deixa de se encontrar dependente da existência de lucro tributável, o que se encontra comprometido nos primeiros anos de atividade dos tipos/dimensão de investimento em causa. A tributação sobre o património, mais em concreto o Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), seria responsável por uma longa discussão em torno da sujeição a este imposto das centrais (e até das barragens). Recorda-se que a Autoridade Tributária e Aduaneira viria a classificar as torres eólicas enquanto prédios urbanos, devendo os mesmos ser registados na matriz predial (entendimento que, por mera Portaria, se aplicaria a um conjunto alargado de infraestruturas como centros electroprodutores e barragens).

A discussão seria alargada às centrais fotovoltaicas, sendo a matéria ainda objeto de litigância, com sucesso reconhecido ao contribuinte relativamente às centrais eólicas. Sendo certo que a natureza do IMI tem por objetivo proceder a uma compensação pela ação pública autárquica (em especial, municipal) no domínio urbanístico, bem como das infraestruturas que os compõem, desde sempre se discutiu o facto de, pela especificidade do valor económico de tais infraestruturas, as mesmas não serem suscetíveis de recondução ao conceito de «prédio» relevante para efeitos de IMI.

Em suma, a fraca receita fiscal decorrente dos referidos instrumentos, aliado a valores reduzidos na cobrança de taxas municipais pelo licenciamento destas infraestruturas e aos níveis muito reduzidos de criação de emprego local, elevou a discussão em torno da mais-valia local trazida por estes investimentos, ditando até o aparecimento de novas taxas municipais justificadas pelo respetivo impacto paisagístico.

Sendo indiscutível a valorização dos terrenos, nos quais, nem o aproveitamento agrícola muitas vezes seria possível, a perspetiva municipal carecia de um modelo que incluísse verdadeiramente os municípios na aceleração da produção de energia de fonte renovável e acautelasse o interesse dos autarcas para o licenciamento da construção destas infraestruturas. Assim se compreendem medidas como a obrigatoriedade de elaboração de uma proposta de Projeto de envolvimento das comunidades locais no âmbito do procedimento de controlo prévio para a instalação de centros eletroprodutores de fontes de energia renováveis, como principalmente o recente pacote remuneratório municipal.

Aqui se inclui, cumpridos os respetivos termos legais, a compensação em numerário a ser aplicada na promoção da eficiência energética dos edifícios municipais ou equipamentos de utilização coletiva ou, ainda, dos edifícios habitacionais das populações, como alternativa à instalação de equipamentos (postos de carregamento de veículos elétricos localizados em espaço público e destinados a utilização pública) à qual acresce a recente compensação (adicional) aos municípios, a qual sendo única e suportada pelo Fundo Ambiental, corresponde ao valor de 13500 euros por MVA de potência de ligação atribuída.

Reconhecido o mérito do sentido da opção legislativa, por responder à compensação municipal pela exploração de recursos naturais no território concelhio, mantém-se a necessidade de analisar os diferentes instrumentos tributários (rendas, impostos e taxas), simplificando o quadro atual na ótica do investidor e garantindo a certeza e segurança jurídica na sua aplicação, sem que se possa esquecer que o mesmo acresce ao quadro fiscal nacional (de onde ainda se destaca a Contribuição Extraordinária sobre o Setor Energético – CESE).