Um mês depois das eleições legislativas, Nuno Santos, director de informação da CNN e da TVI, volta àqueles dias que terminaram com a vitória da AD e de Luís Montenegro. A cobertura televisiva está sempre exposta às críticas, a visibilidade que ainda hoje consegue, com picos de procura e audiência em momentos relevantes para o país, colocam-na por vezes no centro da conversa nacional. Um mês depois das eleições legislativas, Nuno Santos, director de informação da CNN e da TVI, volta àqueles dias que terminaram com a vitória da AD e de Luís Montenegro. A cobertura televisiva está sempre exposta às críticas, a visibilidade que ainda hoje consegue, com picos de procura e audiência em momentos relevantes para o país, colocam-na por vezes no centro da conversa nacional.
A cobertura das legislativas continuou ancorada num modelo clássico e de certa forma batido. Arruadas, uma série interminável de entrevistas e debates que se atropelam. Pensa que seja uma coisa ou a outra — há outro caminho?
Responder umas semanas depois dá-nos a vantagem da distancia. O modelo clássico, que tantos condenam, designadamente nos media tradicionais, continua a ter uma grande eficácia na comunicação direta com os eleitores. O que sucede é que, como em tudo o resto, a vida mudou. O fenómeno digital é efetivo e todas as forças e atores políticos tiram partido dessa realidade. Uns melhor que os outros, com toda a certeza.
Os canais abertos continuam a fixar uma audiência considerável, mas as já não tão novas formas de comunicação política parecem ganhar cada vez mais espaço na vida e na decisão dos eleitores. Refiro-me ao TikTok, por exemplo, apesar de só o Chega o saber usar….
Ora aí está. Não vamos discutir orientação política, mas é inequívoco que o Chega trabalha melhor a Social Media que os restantes partidos. Esse trabalho não começou nesta eleição, vem de trás e ajuda a explicar o crescimento do Chega junto de eleitorado mais jovem. Também acho que abre uma boa discussão sobre a difusão de determinado tipo de mensagens que captam eleitorado mais descontente. O Chega tem sabido fazer isso bem, com mensagens simples, eficazes e, nalguns casos, onde a verdade é o que menos conta.
Pode dar-nos alguns elementos demográficos sobre o vosso público e como ele oscila?
Bom, sem entrar em detalhe convém, antes de mais, distinguir duas realidades. Na TVI, que também dirijo, tocamos todos os públicos, embora os espectadores da televisão generalista tenham hoje maioritariamente mais de 40 anos e uma fatia significativa seja de classes mais baixas. Mesmo assim a Informação é o género mais transversal da chamada televisão aberta. Na CNN o público é mais segmentado. Espectadores urbanos, com mais poder de compra, instrução universitária. Muitos dos nossos conteúdos são hoje consumidos no digital, ou primeiro no digital. Sobre as oscilações há o que parece ser uma evidência, mas que é importante partilhar: quando há um grande evento a procura dispara. Literalmente.
Voltemos aos debates das legislativas: faz sentido aquela maratona; não acaba por funcionar em benefício dos candidatos mais populistas, que se apoderam do show?
O que chama “a maratona dos debates” tem sido um grande serviço à democracia. Agora o modelo foi desenhado numa altura em que a geografia partidária era bastante diferente. Se a pergunta seguinte for perante uma realidade nova será preciso encontrar novas soluções, estarei tentado a dizer que sim, mas sem abdicar da ideia central: proteger o pluralismo e a discussão das ideias.
A cobertura política também segue um modelo com décadas, embora com intervenções cada vez mais curtas e menos substantivas. Parece não haver tempo para explicar um ponto de princípio ao fim. É assim porque é assim a vida de hoje?
Discordo dessa análise. É redutora. Trata-se de uma visão da “bolha mediática”. Os candidatos estiveram em imensos espaços de entrevista, em diferentes momentos, foram confrontadas, não com todas, mas com muitas matérias. Os debates e os sound bites têm mais exposição? Bom, aí estaremos de acordo.
O caso spinumviva marcou todo o período eleitoral: pensa que ajudou a esclarecer algum ponto deste processo e, já agora, beneficiou algum candidato?
O veredicto das eleições foi claro. Houve muita informação sobre o tema, diria que informação suficiente para que fosse tomada uma decisão em consciência.
Existe algum fosso de percepção entre o que vêem os comentadores e o que vêem as pessoas?
Sabe, eu tenho uma experiência muito diferente da maioria das pessoas que estão, não apenas em funções de direção, mas também daquelas que fazem análise política. Geri muitos anos áreas de ficção, entretenimento e de programação. Aprendi a conhecer, a estudar e a respeitar os públicos. Um dos piores erros da televisão, e neste caso, estamos a falar da televisão, é quando os seus protagonistas ficam encarceradas numa torre de marfim. Respondi à sua pergunta?
Penso que sim. Por falar em comentadores, e eu, embora em pausa, agora, também faço parte do exército… não será comentário e comentadores a mais: a certa altura é o cão que corre atrás da própria cauda. O comentário do comentário…
Talvez, mas voltemos aos públicos. Há uma grande demanda. Não existe rejeição. Essa razão não deve impedir a reflexão, pelo contrário, deve acelerá-la.
Procura algum equilíbrio ideológico entre os comentadores?
Na CNN procuro, na política, como em todas as áreas, diversidade de pontos de vista. Detesto um certo unanimismo, uma certa ideia de carneirada que é muito portuguesa. Por vezes pago o meu preço, mas não me queixo.
A cobertura da CNN nesta nova legislatura irá propor alguma nova perspectiva aos espectadores, algum novo programa?
O verão está a chegar. O ano passado fizemos uma série de mudanças bem sucedidas no verão. Este ano será apenas em setembro. Somos líderes, mas nunca estamos postos em sossego. Hoje o grande desafio que todos temos é o de inovar sem perder a matriz. Na CNN levamos muito a sério a nossa identidade.
Vocês trouxeram um novo ritmo, uma batida mais americana, mais coloquial, mais forte, caras novas. Essa energia inicial reflecte-se ainda nas audiências? Sei que ganharam abril. Como foi em maio?
Voltámos a ganhar. E em junho continuamos com uma boa dinâmica.
Televisão e audiências estão ligadas: não há televisão sem quem a queira ver. É uma luta sem quartel e ao minuto?
É uma batalha diária. Sei a hora exata a que chegam as audiências do dia anterior. E a hora aproximada a que tento acesso ao detalhe e faço o primeiro debrief com a equipa.
Hoje temos uma oferta talvez até excessiva de canais informativos ou então não temos. O que lhe parece?
Parece-me que o público é soberano e continua a acolher bem este segmento da oferta.
Eu vejo a CNN mais na televisão do que no meu telemóvel, o que é raro, é mesmo a excepção: vejo tudo no telemóvel. Será assim para a maior parte das pessoas?
Não tenho uma resposta absolutamente rigorosa, mas há um número muito considerável dos nossos conteúdos e até da nossa emissão integral que não são consumidas num ecrã clássico, antes no telemóvel. É um sinal dos tempos. Desejavelmente esses acessos e esse consumo deveriam ser cumulativos com a audimetria. Terá que acontecer mais cedo ou mais tarde, para termos um quadro mais claro para todos, incluindo os anunciantes.
A subida sustentada do Chega vai tornar os debates, conversas e entrevistas ainda mais efervescentes? Quais os riscos?
O Chega já está no espaço público há algum tempo. Na CNN temos alguma experiência, mais do que outros. Em 2022 defendi internamente que era necessário ter representantes do Chega nos debates, em 2024 por maioria de razão também. E tivemos. Hoje todos acham isso – mesmo a contragosto. Eu entendo que deve ser assim em nome da diversidade de pontos de vista.
Por último: como vê a situação política em Portugal?
O mapa político mudou. Creio que há condições para termos um governo mais longo – não sei se de legislatura. Creio que o Chega fará uma oposição duríssima e desconcertante. O PS terá que se recompor. Às autárquicas ditarão se essa recomposição será mais rápida ou mais lenta e complexa
Há neste momento várias séries em streaming sobre televisão. Já viu alguma? O Good Morning América, por exemplo? Guardei as séries para o verão. É o que ando a dizer quando me vejo ao espelho, depois da loucura dos últimos meses em que aconteceu tudo.
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