Recebi um convite, enquadrado no projeto “o Mundo é Aqui” a decorrer no quadro da disciplina de Área Projecto, para debruçar-me sobre a minha experiência enquanto antigo estudante da “Gago” e imigrante. Este projecto está a ser desenvolvido por um grupo de jovens estudantes da Escola Secundária Gago Coutinho, em Alverca, que estão, manifestamente, preocupados com o mundo à sua volta, sobretudo com os seus colegas migrantes.
Voltar à minha escola, é, acima tudo, regressar a um lugar de memória e de lembranças do meu tempo de estudante. Bons tempos e boas memórias, vivenciadas na Gago. Mas, eu não gosto de construir um discurso público assente no “eu”, porque este tipo de discurso pode ser, facilmente, instrumentalizado e utilizado contra os outros imigrantes que não tiveram o meu percurso estudantil.
Eu sou um produto efetivo da escola pública portuguesa que, no cumprimento da sua missão essencial que é de assegurar o direito ao sonho e à oportunidade sem atender à condição económica, social, racial e política do estudante, conseguiu garantir o meu futuro. Esta missão torna-se mais importante num período particularmente desafiante para Portugal. Este texto é, assim, uma evocação do papel essencial da escola pública nos tempos tenebrosos contra os migrantes que afectam, particularmente, os jovens imigrantes.
A escola pública serve, muitas vezes, como o primeiro espaço de contacto de uma criança imigrante com a sociedade portuguesa e a forma como é tratada marca indelevelmente a sua memória. É, por isso, essencial garantir que os jovens migrantes possam sonhar e almejar por um futuro melhor em Portugal.
O crescimento de um sentimento colectivo contra os imigrantes hoje visível e presente no discurso público por intermédio das redes sociais, causa-me uma certa agonia e angústia. Porque, enquanto estudante imigrante, eu tive a sorte e a felicidade de ter tido colegas que me abraçaram e tornaram a minha vida na escola mais fácil. Da escola, fiz os amigos que, ainda, hoje fazem parte da minha vida e os meus filhos tratam por “tios”. As amizades do tempo da escola fazem parte do meu mosaico humano e são as minhas pinturas das minhas alegres memórias.
A escola pública deve constituir-se, no agora, como a guardiã dos jovens e o espaço essencial de socialização baseada no respeito pelas diferenças, onde cada jovem possa crescer e se tornar um sujeito moral e cívico, sem assumir um discurso preenchido de ódio e de rancor sobre o outrem por ser diferente. As nossas diferenças são sempre menores do que as nossas semelhanças enquanto humano que somos.