A uma sensação de incerteza que parece resultar sempre que se olha para o que se passa no mundo, Portugal conseguiu acrescentar as suas próprias incertezas.

De facto, desde o início do último trimestre de 2023 que parece vivermos em clima de alerta permanente, podendo, a qualquer momento, surgir novos problemas que agravam a incerteza.

Num ápice, o governo do país e os governos das regiões autónomas ficaram em gestão, os preparativos para os actos eleitorais sucedem-se e animam discussões e noticiários e as opções políticas dos cidadãos esfumam-se sem que tal facto pareça preocupar seja quem for. Não é o PREC, mas às vezes parece. Sem militares e com menos sonhos!

Situação tanto mais preocupante quanto sempre que algum responsável político é chamado a pronunciar-se, a resposta é, invariavelmente, “é a democracia a funcionar”.

Se a nossa vida se contiver no domínio do formal talvez tenham razão. Só que a vida não é isso. Quando os cidadãos escolhem – e rejeitam –, programas, certamente esperam pela sua execução e não por este caminhar para uma forma estranha de quase democracia directa.

Não será certamente por acaso que as constituições prevêem, tal como a nossa, mandatos cuja duração oscila, genericamente, entre quatro e cinco anos. E que também prevêem que sempre que assim não é estamos perante situações excepcionais criadas e aceites para funcionar como “válvulas de escape” do sistema e, não, para se transformarem em rotina.

Ora, após quase três décadas nas quais o cumprimento integral dos mandatos se afirmou como regra, parece estarmos a entrar numa fase de instabilidade. A que vimos vivendo e a que parece anunciar-se, quer porque existe um maior fraccionamento dos eleitorados, quer porque existirá uma menor disponibilidade para tolerar a diferença.

A tudo isto também não será estranha a personalização à outrance da vida política. Talvez ajudasse tomar como prioridade escolher programas que serão servidos e executados por pessoas e, não tanto, escolher pessoas para realizar os programas. Os políticos servem as políticas e não o contrário.

Por último, talvez nos possa ajudar a todos que aqueles que têm de tomar decisões, ponderem qual o impacto das suas opções nos 4,4 milhões de pessoas em Portugal que seriam pobres se não existissem transferências sociais, ou nos 17% de pessoas em Portugal que estão em risco de pobreza.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.