A mais recente sondagem para as eleições legislativas de 10 de março, do ISCTE/ICS para a SIC e o “Expresso”, divulgada na passada sexta-feira, veio confirmar aquilo que se esperava. O PS e a AD (coligação entre PSD, CDS e PPM) estão num empate técnico e o Chega é a única força política que cresce nas intenções de voto, suportado sobretudo no eleitorado mais jovem. De acordo com a sondagem, o PS terá 29%, a AD 27% e o Chega conseguirá chegar aos 21%, naquele que, a confirmar-se, seria o melhor resultado alguma vez alcançado por um terceiro maior partido desde 1976, superando os 17% obtidos em tempos pelo PRD.

Tal como o próprio André Ventura deixou claro na entrevista que concedeu ao Jornal Económico em dezembro, se o Chega tiver um resultado desta natureza conseguirá inviabilizar não só um governo do PSD como também um executivo do PS. Por outras palavras, segundo Ventura, votar no Chega não aumenta as probabilidades de o PS voltar a formar governo e o PSD, se quiser governar, terá de se entender com ele.

Esta raciocínio choca, no entanto, com dois aspetos cruciais. Em primeiro lugar, e a sondagem divulgada pelo “Expresso” comprova-o, cerca de dois terços (64%) do eleitorado da AD consideram que a coligação liderada por Luís Montenegro não deve entender-se com o Chega no pós eleições. Uma aliança com o Chega seria aceite apenas por apenas 31% dos eleitores da AD, com a Iniciativa Liberal a ser o parceiro preferido para o eleitorado da coligação, com o apoio de 47% dos inquiridos. Embora por pouca diferença, até um entendimento com o PS seria preferível a um acordo com Ventura, sendo bem visto por 34% dos votantes na AD. Ou seja, a direção do PSD tem o apoio de uma parte significativa do seu eleitorado para resistir às exigências do Chega e arriscará bastante se decidir ceder aos ditames de Ventura.

Em segundo lugar, a sondagem revela que os eleitores do Chega preferem ceder à AD do que obrigar o país a ir novamente a votos no curto prazo, ou permitir que o PS se mantenha no poder.

Estes números devem fazer-nos refletir: até agora, ao longo destes anos de fulgurante ascensão, Ventura “ganhou” em praticamente todas as jogadas que fez, porque eram situações win-win, das quais sairia a ganhar independentemente do desfecho. Porém, estamos a chegar a um momento em que não basta ao Chega ser um partido de protesto: o que fará André Ventura se obtiver um resultado histórico mas, ainda assim, não conseguir obrigar a AD a aceitar os seus termos para um entendimento? Lançará o país no pântano, obrigando a novas eleições dentro de poucos meses? Estará o Chega disposto a pagar o preço político de criar uma situação de ingovernabilidade, seguindo os passos do PRD, que, nos anos 80, pavimentou o caminho para as maiorias absolutas de Cavaco Silva, ao forçar a queda do seu primeiro governo minoritário?

Estará, por outro lado, disposto a permitir que o PS continue no poder, pagando o correspondente preço político junto do seu eleitorado?

Neste novo contexto, qualquer opção que Ventura tomar terá um custo. Se inviabilizar um governo minoritário da AD, pagará um preço por isso. E, se não o fizer, também terá de pagar um preço por isso, correndo o risco de ao longo dos anos seguintes perder parte do seu eleitorado para a AD, um pouco à semelhança do que aconteceu com o Bloco de Esquerda e o PCP durante a ‘geringonça’.

No final de contas, o cenário menos arriscado para o Chega será o de uma vitória, sem maioria, do PS, porque lhe permitiria continuar a ser um partido do protesto, cujos atos e decisões não teriam grandes consequências e tendo como contraponto, à direita, um PSD enfraquecido, a quem poderia continuar a ‘roubar’ votos. Porém, mesmo neste cenário não existem favas contadas para André Ventura, sobretudo se nessa altura o PSD tiver uma nova liderança, eventualmente com o tão falado regresso de Pedro Passos Coelho.

É natural que, face à subida fulgurante do Chega nas sondagens, a generalidade das análises se centrem nesse aspeto e na posição de força que o partido de André Ventura terá no dia 11 de março. Mas quem consegue 20% numas eleições terá, forçosamente, de assumir um nível de responsabilidade que não teria se tivesse 10 ou 12%. Não pode dar-se ao luxo de ser um partido de protesto. E aí veremos se o Chega resiste a esse momento da verdade e se é, realmente, algo mais do que um epifenómeno.

 

(Artigo atualizado às 12h00 de 5 de fevereiro)