Os investidores têm confiado nas obrigações como classe de abrigo em momentos de queda acionista, mas quem nelas se refugiou na tempestade de fevereiro último acabou por ser apanhado pela enxurrada, pois a maioria das obrigações seguiu o caminho das ações. Nesse mês, só os títulos de curto prazo (até dois anos) ficaram no positivo e nos seguintes o cenário piorou, com todas as maturidades no negativo e os títulos de prazo mais longo com quedas mais acentuadas.

Este comportamento levou-nos a questionar se as obrigações, em especial as de maturidades mais longas, perderam o seu papel de refúgio.

Olhando para o passado, percebemos que as obrigações têm sido um refúgio eficaz nos principais períodos de venda de ações ao longo dos últimos 30 anos. E se recuarmos aos anos 60 e 70, veremos que os prazos mais curtos foram mais eficientes, tal como agora sucedeu. Ora, os anos 60 e 70 foram marcados pelo disparar da inflação, alavancada pelo preço do petróleo, e só controlada nos anos 80 pelo aumento das taxas de juro e o rigoroso controlo da liquidez. Desde então, as taxas desceram paulatinamente, estimulando um longo ciclo altista para o mercado de obrigações.

Surgem-nos então outras questões: será a tempestade de fevereiro prenúncio de mudança para condições económicas mais semelhantes às que se viveram há 50 anos? E será que elas podem mudar a relação de forças entre ações e obrigações?

Se olharmos para a inflação, que afeta tanto ações como obrigações pelo seu efeito nas taxas de juro, percebemos que depois de um período longo de estabilidade voltaram algumas das pressões que catalisam a sua subida e os receios de que esta possa intensificar-se, desde o populismo político à instabilidade crescente no Médio Oriente.

Se observarmos os choques económicos – vários com efeitos profundos nos preços dos ativos –, a maioria tem origem na descolagem inesperada da inflação (anos 60), que é negativa para ações e obrigações, ou na queda abrupta do crescimento (2007-2009), mais penalizadora para as ações. Hoje, a escalada das tensões no comércio externo aumentou os receios sobre o crescimento, gerando oscilações no mercado de ações, e já vimos que os receios inflacionários também crescem, condicionando as obrigações.

Quanto à política monetária, à medida que os bancos centrais trocam a flexibilização pelo aperto quantitativo e avançam (ou consideram avançar) com subidas de taxas de juro, reduz-se o estímulo que apoiou o preço das ações e deprimiu o rendimento das obrigações, e este clima de mudança poderá ajudar a uma inversão entre as duas classes de ativos.

Nenhuma destas alterações parece, no entanto, estar premente nem ser intensa como em 60 e 70: o preço do petróleo subiu, mas está muito aquém da quadruplicação então registada; não se antecipa um choque económico da alta intensidade; e a normalização da política económica está a ser feita com prudência.

Assim e apesar de vermos alterações no enquadramento que dá às obrigações o seu estatuto de refúgio, acreditamos que irão mantê-lo por mais tempo. Os prazos mais curtos parecem-nos mais eficientes, pois as de maturidades longas serão mais afetadas pelos receios sobre o crescimento e a inflação, e o seu preço pode não estar a descontar todos os riscos. Com esta ideia em mente, importa lembrar aos investidores dois outros pontos essenciais em períodos de maior volatilidade: que avaliem continuamente o papel de cada ativo na sua carteira e que mantenham sempre a diversificação como prioridade.