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Operação Marquês: Henrique Granadeiro e Zeinal Bava não vão a julgamento

No despacho da acusação conhecido em outubro de 2017, o ex-chairman da PT fora acusado de oito crimes: um por corrupção passiva, dois por branqueamento de capitais, três por fraude fiscal qualificada, um por abuso de confiança e um por peculato. Já Zeinal Bava fora acusado de um crime de corrupção passiva, um crime de branqueamento de capitais, um crime de falsificação de documentos e dois crimes de fraude fiscal qualificada
9 Abril 2021, 13h17

Henrique Granadeiro e Zeinal Bava, antigos presidente e CEO da antiga Portugal Telecom (PT), respetivamente, não irão a julgamento no âmbito da “Operação Marquês”, segundo a decisão instrutória do juiz Ivo Rosa conhecida esta sexta-feira.

A decisão deixa cair todos os oito crimes que constavam no despacho da acusação a Granadeiro, revelado em outubro de 2017. Nessa altura, o antigo chairman foi acusado de um crime por corrupção passiva, dois por branqueamento de capitais, três por fraude fiscal qualificada, um por abuso de confiança e um por peculato.

Já Zeinal Bava fora acusado de um crime de corrupção passiva, um crime de branqueamento de capitais, um crime de falsificação de documentos e dois crimes de fraude fiscal qualificada.

Ivo Rosa afirmou não terem sido apontados “factos concretos” pela acusação “com vista a demonstrar a existência de uma administração de facto da PT Comunicações [que viria a dar origem à atual NOS] pela PT SGPS e, mais especificamente, pelo arguido Henrique Granadeiro”, nem “que as condutas descritas na acusação foram praticadas pelo arguido Zeinal Bava na qualidade de administrador da PT Comunicações”.

A antiga PT é um dos pilares da Operação Marquês, que indica que o antigo primeiro-ministro José Sócrates terá, alegadamente, recebido subornos do Grupo Espírito Santo (GES) para favorecer a estratégia deste enquanto acionista da então maior empresa de telecomunicações do país. Ora, para o Ministério Público isto terá acontecido com a cumplicidade de Henrique Granadeiro e Zeinal Bava.

A tese da acusação é que ambos os homens fortes da empresa de telecomunicações terão sido corrompidos por Ricardo Salgado para alegadamente beneficiar os interesses do GES nos negócios da antiga Portugal Telecom (PT).

Como Bava e Granadeiro se defenderam
Face a acusação, Zeinal Bava procurou desmontar os factos da “Operação Marquês”. Durante as alegações da defesa, José António Barreiros, o advogado do gestor de 55 anos, focou-se sobretudo na prova material como forma de desconstruir os argumentos da acusação, apresentando ao juiz Ivo Rosa uma visão alternativa dos factos.

De acordo com as alegações finais do debate instrutório, Barreiros recusa “a narrativa de um banqueiro corruptor (Ricardo Salgado, presidente do BES), que paga somas de milhões a Henrique Granadeiro e a Zeinal Bava e a José Sócrates para, durante cinco anos [2006 a 2011]” conseguir derrotar uma operação de pública de aquisição (OPA) lançada pelo grupo Sonae sobre a PT, separar a PT Multimédia da PT, bem como vender a participação da PT na brasileira Vivo à espanhola Telefónica e levar à aplicação de parte desse valor na aquisição de uma participação na brasileira Oi. Acresce a contratação de serviços bancários do BES pela PT e o financiamento da Ongoing, uma empresa “alegadamente instrumental do BES”.

Desta forma, a defesa de Zeinal Bava assumiu o recebimento dos 25,2 milhões de euros, mas justifica-os com um contrato com o então presidente do BES, Ricardo Salgado. O contrato visava a “aquisição” por Zeinal Bava “ou pela equipa executiva que ele viesse a escolher, no quadro futuro, então previsível, da total privatização da companhia [PT]”, através da referida verba, que foi “facultada a título fiduciário porque com cláusula de reembolso em caso de não aplicação, incluindo juros”. Assim, Barreiros explicou que os 25,2 milhões de euros não correspondem a um pagamento recebido por Bava, tratando-se sim de verbas que pertenciam ao GES e que estavam na posse do gestor da antiga PT para adquirir ações da telecom, caso a empresa fosse privatizada por completo.

O advogado garantiu, por isso, que o contrato entre Bava e Ricardo Salgado não foi forjado, como acusou o Ministério Público, e que nunca houve a intenção de “camuflar ou esconder o destino do dinheiro”. José António Barreiros alegou também que os 25,2 milhões nunca chegaram a ser investidos.

Barreiros também procurou desmontar a acusação de falsificação de documento. Tornada pública a “Operação Marquês” e iniciado o processo de detenções, Zeinal Bava terá procurado devolver 18,2 milhões de euros, através de um contrato forjado. Ora, Barreiros alegou que “nunca esteve em causa a devolução do dinheiro” e apontou a ausência de quaisquer “contrapartidas” na questão da transferência do dinheiro pelo GES para que se possa falar do crime de corrupção passiva por parte do gestor.

O advogado refutou também o crime de branqueamento de capitais, notando que o dinheiro do GES entrou em “contas nominais” de Bava, pelo que não houve intenção de ocultar nada, logo a imputação daquele crime não faz qualquer sentido.

Sobre o crime de fraude fiscal, a defesa de Zeinal Bava argumentou que o dinheiro em causa não representa “valores tributáveis”, defendendo que a acusação também aqui não tem “consistência ou coerência”. Além disso, Barreiros disse que o gestor não tinha o estatuto de “funcionário público”, invocando legislação em torno das funções da PT como empresa.

Barreiros rejeitou, ainda, a acusação que Zeinal Bava tenha ajudado Ricardo Salgado ou interferido junto de Sócrates para impedir a OPA da Sonae sobre a PT, alegando que o gestor não foi responsável pela votação da assembleia de acionistas. Durante as alegações, a defesa alegou que “Bava foi sempre contra a alienação da Vivo” e que desconhecia que o “GES tinha intenção de investir na Oi”. Barreiros negou que Bava tenha tido encontros com políticos brasileiros para discutir a entrada da PT no capital da Oi.

A estratégia da defesa de Henrique Granadeiro, por sua vez, foi apelar à nulidade das provas obtidas, alegando que terão sido obtidas de forma ilegal. Por exemplo, a defesa do gestor alegou que os extratos bancários das contas no banco suíço Pictet foram obtidos de forma ilegal. Estes extratos chegaram às mãos Departamento Central de Investigação e Ação Penal através do Ministério Público da Suíça, por via de um pedido de cooperação internacional judiciário.

Há ainda documentos que indicam que foi a sociedade offshore Espírito Santo Enterprises que, por ordens de Ricardo Salgado, transferiu cerca de 25,7 milhões de euros para Granadeiro. Também neste ponto, Henrique Granadeiro alegou que os documentos foram obtidos de forma ilegal. A defesa do gestor argumentou que não foi confrontada com outras provas que foram reunidas contra si durante a fase de inquérito, nem com alguns factos que são imputados a Granadeiro na acusação.

Desta forma, o gestor defendeu-se com a nulidade de todo o inquérito alegando que os seus direitos de defesa foram violados.

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