Uma semana após a tomada de posse dos novos deputados da Assembleia da República e do Governo, seguir-se-á a apresentação e discussão, a 7 e 8 de abril, do Programa do XXIII Governo Constitucional, o terceiro do primeiro-ministro António Costa. Assumindo que este é um Governo para toda a legislatura, a pergunta que se impõe desde logo é que Portugal teremos daqui a quatro anos, uma vez que o resultado desta apresentação está absolutamente garantido de aprovação, ainda que algum partido ouse propor qualquer moção de rejeição.

O povo mandatou o PS para formar um governo maioritário, e este terá que ser forçosamente mais ambicioso do que o anterior (pré-pandemia) que se resumia a quatro desafios estratégicos: enfrentar as alterações climáticas, corrigir os desvios demográficos, combater as desigualdades e fazer a transição para a sociedade digital, da criatividade e da inovação. Ambicioso, pois enfrentamos uma crise energética sem paralelo e vivemos nos últimos dois anos uma pandemia de saúde pública, e os apoios europeus foram muito reforçados para Portugal nos últimos anos, com o PDR2030 e o PRR.

Os desafios que Portugal agora enfrenta são muito exigentes e diferentes e, associado a um Programa de Governo, está sempre de forma oculta associado um saco bem recheado dos impostos dos Portugueses, que todos esperam e anseiam ver bem aplicados. Para isso, temos de cumprir e resgatar o Portugal adiado com várias premissas que o novo Governo não poderá pôr de parte.

Em primeiro lugar, o crescimento da economia e da competitividade do tecido empresarial português. Precisamos de medidas fortes e estruturantes que incentivem o investimento e que combatam a corrupção e a economia paralela. Somos um país que faz bem, que luta e empreende, mas que, no global, não cria riqueza, não gera valor relevante. Para que isso aconteça, é necessário libertar as PME da burocracia e da carga fiscal, com medidas públicas de incentivo ao investimento e à produção, sob pena de ver a economia nacional no seu trajeto de crescimento anémico de 0,5% ao ano ao invés de 4% ou 5%, que se refletiria na melhoria da retribuição salarial e do poder de compra dos cidadãos e na diminuição da precaridade laboral.

Em segundo lugar, acrescentaria o desafio da competitividade fiscal e do necessário desagravamento fiscal. Vivemos esmagados por uma carga fiscal que vai acumulando recordes ano após ano. Em 2020, atingimos os 34,8% do PIB, 1,3 pontos percentuais acima da média do conjunto dos países da OCDE! E uma redução de impostos para a classe média e para as empresas não significa perda de receita, quando este alívio é compensado por um efetivo crescimento económico. É preciso não esquecer que um em cada quatro dos portugueses que trabalham vive com pouco mais de 600 euros mensais (salário mínimo deduzido das contribuições da segurança social). E com mais crescimento económico e desagravamento fiscal, conseguiremos libertar-nos da gigante dívida pública de 127,5% do PIB em 2021.

Em terceiro lugar, avançar para os necessários investimentos públicos, aproveitando o PRR, contrariando os últimos seis anos, onde muito se anunciou e pouco se concretizou. Há que investir na melhoria da competitividade e qualidade dos serviços públicos, que atingiram um estado de degradação inaceitável, com chocantes tempos de resposta. São urgências absolutas os investimentos na saúde (com melhor serviço num SNS mais justo e inclusivo, que consiga responder às necessidades da população), na habitação social (tendo em conta que 1/3 da população vive no limiar da pobreza) e nos transportes públicos ao serviço da mobilidade efetiva e da qualidade de vida dos cidadãos, a aplicar não só no Porto e em Lisboa, mas a todo o país.

Em quarto lugar, deixo o desafio de revigorar uma democracia em crise, com a reforma do sistema político e das leis eleitorais, e que aqui obrigará a um consenso político com o maior partido da oposição, o PSD. É necessário aproximar eleitos de eleitores e contrariar a crise que se vive não na esquerda ou na direita, mas no próprio sistema político. Porque é que apenas dois distritos do país elegem quase 90 deputados (praticamente 40% do total) ou porque é que, como aliás aconteceu no passado recente, pode governar quem não ganhou as eleições? Ou quem, como agora tem apenas 41% dos votos dos Portugueses e tem uma representatividade parlamentar de 52% com maioria absoluta? Encontrar respostas para  estas questões é fortalecer e dignificar a democracia.

Estes são os verdadeiros desafios estratégicos decisivos para o desenvolvimento do país, que o Governo não poderá esquecer, a bem de Portugal. O país tem estabilidade política, e terá que aproveitar esta oportunidade para recuperar tempo perdido, governar ao centro e reformar. Para isso, também deverá ter em conta que, se pretender fazer alguma revisão constitucional, terá que contar com o PSD e com os seus 33,5% na Assembleia da República. Só com o PSD se garante o perfazer dos 2/3 necessários e, assim, a Constituição não rumará para as tentações de esquerda. Estaremos, pois, vigilantes por Portugal. Este nosso desafio será cumprido.