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Pandemia acelera meta de ter 25% da Função Pública em teletrabalho

Até 2023, Governo espera ter um quarto dos funcionários públicos em teletrabalho. Há quem já não volte ao trabalho presencial. Mais produtividade e menos impacto ambiental são algumas das razões.
19 Junho 2021, 13h00

A pandemia da Covid-19 trouxe alterações sem precedentes na organização do mundo do trabalho e veio acelerar o objetivo do Governo de ter, até ao final da legislatura, pelo menos, 25% dos trabalhadores em teletrabalho. Só durante o primeiro confinamento geral, em 2020, cerca de 68 mil funcionários públicos (ou seja, 10% do total de trabalhadores do Estado) estiveram em teletrabalho e a tendência é para manter. A portabilidade dos postos de trabalho e a redução do impacto ambiental das deslocações casa-trabalho-casa são algumas das razões apontadas, a que se somam o aumento da produtividade e da qualidade do trabalho.

No Programa de Estabilização Económica e Social (PEES), aprovado em Conselho de Ministros no verão passado, o Governo já reconhecia que a pandemia tinha vindo acelerar a implementação do teletrabalho no país, “superando resistências e demonstrando que não há perda de produtividade dos trabalhadores”. Mais recentemente, em abril, a ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública, Alexandra Leitão, admitiu, no Parlamento, que, com a Covid-19 e os confinamentos, percebeu-se que o teletrabalho “é uma ferramenta útil” e que garante “os direitos dos trabalhadores sem prejuízo do cumprimento dos objetivos das organizações”. “Veio para ficar”, vincou.
Segundo a ministra, o objetivo pós-pandemia é manter nesse regime, “pelo menos, um quarto” dos cerca de 68 mil funcionários públicos que estiveram em teletrabalho durante os confinamentos. A medida deverá aplicar-se sobretudo nos patamares de técnicos superiores e assistentes técnicos da Função Pública. As forças de segurança, professores, magistrados ou profissionais de saúde não deverão ser incluídos, dado que as funções não são compatíveis com essa modalidade de trabalho.

Mas Alexandra Leitão rejeita estar “presa” a uma percentagem: “Ter o objetivo de ter um determinado número de pessoas em teletrabalho nunca se imporá à vontade das pessoas”. “É preciso deixar que o contexto pandémico passe para perceber, do ponto de vista estruturante, o que é que fica nosmodelos organizacionais, frisou. Ainda assim, “ter um quarto dos trabalhadores da Administração Pública, que tenham funções compatíveis com o teletrabalho, seria interessante, num plano sempre estritamente voluntário e numa solução de teletrabalho, que não tem de ser a 100%”, sublinhou.

 

Mais e melhor trabalho
Um estudo realizado pela Direção-Geral da Administração e do Emprego Público (DGAEP), a que o JE teve acesso, revela que a maioria dos dirigentes das 29 entidades da Administração Central direta e indireta que participaram no estudo dá nota positiva à qualidade do trabalho desenvolvido pelos funcionários públicos em teletrabalho. Cerca de 60% dos dirigentes considera que a qualidade do trabalho manteve-se independentemente da modalidade de trabalho e 27,3% “acham que a qualidade do trabalho melhorou ou melhorou muito” em teletrabalho.

O estudo intitulado “A adaptação dos modelos de organização do trabalho na administração pública central durante a pandemia de Covid-19: dificuldades e oportunidades”, que contou com a participação de 4.445 trabalhadores de um universo dos mais de 42.000 que integram as referidas 29 entidades, indica também que a maioria dos dirigentes (66,6%) não encontrou resistência ao teletrabalho por parte dos trabalhadores e 52% referem também que não houve “nunca ou quase nunca” resistência quando as condições permitiram o regresso ao trabalho presencial.

Sobre as alterações que o Governo quer impor no mercado de trabalho, 86,71% dos dirigentes inquiridos admitem ser este “o momento adequado para que se repensem estruturalmente os modelos de organização do trabalho na Administração Pública”. Os dirigentes das 29 entidades públicas participantes percecionam essa revisão do enquadramento jurídico das modalidades de trabalho, assim como o sistema de avaliação de desempenho dos funcionários, como “inevitáveis” uma vez que “a pandemia ajudou a romper em definitivo com as resistências que existiam relativamente ao teletrabalho”, que era então “residual” em toda a Administração Central.

 

Comunicação: o grande desafio
A comunicação foi, segundo o estudo da DGAEP, “o maior desafio” criado pela implementação generalizada do teletrabalho na Administração Pública. Cerca de 70% das entidades públicas admitem te encontrado dificuldades nessa dimensão, com destaque para “a necessidade de novas formas de comunicação regular interna (departamental e interdepartamental) e externa (com outras entidades e no atendimento ao público), de modo rápido, conseguidas através de plataformas tecnológicas”.

A coordenação de equipas, equipamentos, processos, relacionamento pessoal e questões emocionais foram outras das dificuldades reportadas pelos dirigentes públicos, mas “nem os conhecimentos informáticos nem a idade se constituíram como óbices ao teletrabalho”. Das 29 entidades inquiridas, 21 afirmaram que os conhecimentos informáticos dos trabalhadores se revelaram “suficientes para poderem trabalhar remotamente”, sete referiram que “existiu assistência por parte dos departamentos de informática” e três admitiram que “eram os grupos informais que muitas vezes resolviam os problemas, num espírito de solidariedade institucional”.

O estudo revela ainda que “o teletrabalho contribuiu favoravelmente para a conciliação da vida profissional com a vida familiar e pessoal” e que “pode trazer benefícios para os trabalhadores, organizações e ambiente”, apesar de se ter verificado “receio” por parte dos trabalhadores de serem “prejudicados na avaliação de desempenho” e de “não verem o seu trabalho adequadamente reconhecido”.

 

Investimento de 10 milhões
Segundo os dados da Direção-Geral do Orçamento (DGO), equipar a Administração Pública do material necessário ao teletrabalho (entre computadores, monitores, câmaras e software) custou, em 2020, 10,8 milhões de euros aos cofres do Estado, ao mesmo tempo que permitiu “poupar em transportes e até propiciar melhorias em termos ambientais”. Ainda assim, o estudo da DGAEP indica que, em 19 das 29 entidades inquiridas, os meios e equipamentos necessários foram apenas “parcialmente disponibilizados pela entidade empregadora”, ou seja, não chegaram a todos.

Alexandra Leitão garante que, com o regresso à normalidade, o teletrabalho “terá outras condicionantes” e obrigar a “um esforço diferente da parte da Administração Pública”. “Temos de ir ao encontro de um conjunto de questões que tem a ver com as despesas, o direito a desligar, os equipamentos que são dados [que não foram totalmente assegurados durante a pandemia]” e “garantir que o teletrabalho não tenha uma externalidade negativa ao nível da igualdade de género”, adiantou, lembrando também que há projetos de lei sobre o teletrabalho ainda em discussão no Parlamento e que é preciso “aguardar que essa legislação seja solidificada” antes de se tomar medidas concretas.

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