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Pandemia expôs “deficiências arquitetónicas” das cidades

Necessidade de adaptação ao teletrabalho aumentou a procura por novos tipos de habitação. Reabilitação vai ter oportunidades com a necessidade de as organizações cumprirem regras para manterem a atividade e garantirem a segurança.
31 Julho 2021, 13h00

A reabilitação urbana tem vindo a desempenhar um papel fundamental na ascensão do mercado imobiliário, mas a pandemia de Covid-19 acabou por travar este movimento, apesar de mostrar uma realidade que aidna pode constituir uma oportunidade de desenvolvimento.

“A situação pandémica está a evidenciar muitas coisas e uma delas é que as nossas cidades não estão preparadas para viver em situações de crise, nem em tempestades extremas”, refere ao Jornal Económico (JE) Pedro Barceló, CEO da Giménez Ganga, empresa especialista em soluções de proteção térmica e solar para edifícios. Acrescenta que a pandemia deixou expostas “as deficiências arquitetónicas das nossas cidades e as lacunas habitacionais que têm mais de metade dos edifícios construídos até hoje”.

Para combater estes problemas Nelson Lage, presidente da ADENE, acredita que a eficiência energética “continuará a ser uma prioridade na reabilitação, abrindo caminho para outras dimensões da sustentabilidade ambiental, como a eficiência hídrica e de uso de recursos, contribuindo para a melhoria da saúde e qualidade de vida dos seus ocupantes”, destacando os 610 milhões de euros de apoios disponíveis nos próximos cinco anos através do PRR que vão fazer da eficiência energética um “fator de estímulo direto à economia e à recuperação da crise provocada pela pandemia”.

Por sua vez, Nuno Garcia, diretor-geral da GesConsult, assume que após um ciclo positivo, o sector sofreu uma “grande resistência” com a pandemia, desde logo pelos estrangeiros que não conseguiam chegar, mas também pelos nacionais (principalmente os de menor dimensão) que colocaram os investimentos previstos on hold. Refere, também, que este foi um período em que se repensou a forma de estar e se procurou adaptar os espaços da casa para acomodar a vida e o teletrabalho. “A construção desde logo começou a sentir também uma mudança no tipo de procura residencial, em zonas mais descentralizadas, habitações mais espaçosas e com áreas exteriores, que permitissem um “escape” ao confinamento”, aponta, alertando que, neste momento, “vivemos o resultado do desajuste das cadeias de produção face à procura crescente, com matérias-primas escassas vendidas a preços altíssimos, que se refletem nos custos finais das obras”.

Questionado sobre as principais evoluções que a reabilitação urbana registou desde o início da pandemia, Pedro Barceló considera que o teletrabalho expôs a intimidade da habitação de cada um ao resto do mundo, o que “originou uma preocupação com a decoração e com a habitabilidade da casa que antes não existia, ou, pelo menos, não na mesma medida”. Uma situação que diz ter levado, posteriormente, a uma remoção de divisórias e paredes que retiravam espaço a salas de jantar, e a ampliação de terraços e varandas.

Já Nuno Garcia define três fases de evolução desde de março de 2020, até aos dias de hoje. “Numa primeira fase, a construção adaptou-se e manteve a atividade que trazia de trás, demonstrando resiliência e capacidade de impulsionar a economia, tendo aplicado as lições aprendidas com a crise anterior”. Seguiu-se depois a segunda fase, onde após se ter ultrapassado “a inércia que caracteriza a fileira”, no momento em que a redução no investimento se começou a fazer sentir, assim como a diminuição no número de licenciamentos e o impacto da paragem completa de sectores de que dependemos. “Isto gerou uma preocupação crescente com as quebras e, no geral, em relação ao futuro do sector, atenuada pela chegada das moratórias, das linhas de crédito com condições favoráveis e de outros incentivos financeiros”, frisa.

Nelson Lage diz que a escassez de mão de obra qualificada e de alguma matéria prima, provocada pelo aumento da procura que atualmente se regista “irão influenciar os preços praticados na construção e reabilitação urbana”.

Não foi apenas na habitação que o sector da construção notou mudanças. A hotelaria e restauração foram dois dos segmentos mais afetados. “Agora, ter esplanadas ou terraços que permitam receber um número de clientes semelhante ao de antes da pandemia, e devidamente acondicionados – para que também possam ser usados nos dias em que as condições climáticas não são as mais desejadas – é um requisito fundamental para qualquer empresa que não quer ver a sua facturação demasiado afectada”, sublinha Barceló.

Por seu turno, Nuno Garcia destaca a segurança no trabalho, a partir do momento em que foi necessário proceder à adaptação dos estaleiros de obras e se generalizou a preocupação com as condições de higiene e segurança que pudessem minimizar os impactos da Covid-19. “É, ainda agora, uma evolução difícil de implementar, dadas as especificidades do trabalho em ambiente de obra”, alertando também para uma escassez e encarecimento impiedoso das principais matérias-primas, fruto dos impactos da pandemia nas várias indústrias de produção, logística e transporte.

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