As eleições deste mês mudaram muita coisa no panorama político e julgo que é do interesse de todos aprofundar o que se passou. A principal novidade é, como é óbvio, o crescimento do Chega, que passou de 1,3% em 2019 para 7,2% em 2022 e 18,1% em 2024. Para além disso, houve uma clara diminuição da abstenção, que tem sido atribuída, em grande parte, a este partido de protesto.

Há duas questões prévias que importa sublinhar. Em primeiro lugar, não se deve confundir quem votou no Chega com os dirigentes deste partido. Em segundo lugar, é apressado dizer que quem fez essa opção é “eleitor do Chega”. Quem escolhe o mesmo partido há décadas pode ser considerado eleitor desse partido, mas é prematuro identificar um votante desde a primeira vez que coloca a cruz num novo partido. Este aspecto é muito importante, até porque, nas próximas eleições, tanto poderemos ter o Chega a recuar como a disputar o primeiro lugar.

Diria que há duas estratégias possíveis face a estes cidadãos. Uma primeira, demasiado tentadora, é insultá-los, o que é o melhor caminho para aumentar a votação no Chega. Uma segunda estratégia é perceber as principais inquietações destes eleitores (e de todos os outros) e tentar responder-lhes, de modo a esvaziar o voto de protesto o mais possível. Aliás, deve-se dizer que quer o PSD, quer o PS, quer – mais surpreendentemente – o PCP já escolheram esta segunda via.

Já foram feitas análises aos resultados eleitorais por escalão etário, sexo e formação académica. No entanto, seria muito útil acrescentar uma dimensão sobre as preocupações dos eleitores por partido. Muito provavelmente há interacção entre escalão etário e temas políticos. Será de esperar que os mais velhos valorizem mais a saúde e as pensões, enquanto os jovens se inquietem mais com a educação e a habitação.

Será que a imigração é mesmo importante para quem votou no Chega? Há diferenças substanciais em relação a este tema nos outros partidos? O PS deverá querer esclarecer melhor porque atrai tão poucos jovens e eleitores com mais formação. Por maioria de razão, deverá ter tido muito poucos votos nos emigrantes jovens qualificados.

A habitação é mesmo um tema dos mais novos ou é mais transversal? A saúde inquieta os mais velhos ou também os outros? Entender o que os eleitores valorizam deve ajudar os partidos a darem prioridade ao essencial e afastarem-se de absurdos caríssimos como o TGV.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.