O Serviço Nacional de Saúde (SNS) registou o ano passado um défice de 1377,6 milhões de euros, valor que representa “uma deterioração” de 741 milhões face a 2023, indica o relatório do Conselho das Finanças Públicas (CFP) divulgado esta terça-feira. Embora o saldo seja sistematicamente negativo desde 2015, este é o valor mais elevado, “ultrapassando mesmo os níveis registados durante a pandemia, não obstante o orçamento aprovado prever um saldo nulo”, sublinha o mesmo relatório, notando que o número de utentes no SNS baixou pela primeira vez o ano passado desde 2016.
A contribuir para este agravamento das contas públicas do SNS está o facto de a despesa ter atingido, em 2024, 15.553 milhões de euros, mais 9,1% do que em 2023 (mais 1297,8 milhões). O relatório da entidade liderada por Nazaré da Costa Cabral, que se baseia nas contas da Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), destaca o aumento de 704 milhões em despesas com o pessoal; 302 milhões em compras de inventários e 221 milhões em fornecimentos e serviços externos. “Esta despesa corresponde a 5,5% do PIB e a 12,8% da despesa pública total”, lê-se no relatório.
No que concerne especificamente à despesa com pessoal, que ascendeu a 6.520 milhões em 2024 (um aumento de 12,1%), o Conselho das Finanças Públicas nota que este gasto explica mais de metade do crescimento da despesa do SNS no último ano. “Este aumento, que ultrapassa o dobro da média dos últimos 5 anos, resulta da variação das remunerações (efeito preço) e da variação no número total de trabalhadores (efeito volume)”, aponta o relatório, frisando que o número de trabalhadores das entidades que integram o SNS atingiu os 154 635, um aumento de 1.435 trabalhadores (mais 0,9%) face a 2023.
Sobre o efeito preço, a entidade presidida por Nazaré da Costa Cabral recorda os aumentos da remuneração de base média mensal em 15,3% e de ganho mensal em 14,6% no setor da saúde, que se fixaram, respetivamente, em 1.782 euros e 2.354 euros. Esta evolução reflete o aumento dos salários aplicáveis aos trabalhadores médicos integrados na carreira especial, assim como da carreira especial de enfermagem, além da entrada em vigor do acordo alcançado entre o Governo e os sindicatos médicos que inclui aumentos entre os 10,9% e os 14,6%.
Já do lado da receita, 2024 também registou um aumento, mas não o suficiente para cobrir o peso da despesa. Contas feitas, em 2024 a receita total do SNS ascendeu a 14175 milhões de euros, um crescimento de 4,1% em relação a 2023. O relatório do CFP sublinha que as receitas de impostos provenientes do Orçamento do Estado (OE) “continuam a ser a principal fonte de financiamento ao representar 95,0% do total das receitas”. Facto que “coloca Portugal como um dos países europeus com maior percentagem de financiamento do sistema de saúde com receitas públicas”, lê-se no relatório que aponta mesmo esta dependência, assim como o aumento da despesa, como “desafios” à sustentabilidade do SNS.
No raio-x feito anualmente às contas do SNS entra também a dívida aos fornecedores externos, que aumentou em 2024 para 237 milhões, situando-se nos 1,4 mil milhões – um acréscimo que “resulta de um aumento da dívida vincenda [dívida cujo o prazo de pagamento ainda não atingiu a data-limite] em 395 milhões, que não foi totalmente compensada pela redução da dívida vencida em 158 milhões”.
O mesmo relatório do CFP sinaliza ainda que o prazo médio de pagamento das entidades do SNS ascendeu em 2024 a 77 dias, menos 19 quando comparado com 2023. Nesse ano, recorda-se, “apenas 20 das 52 entidades integradas do SNS cumpriram o objetivo de manter o prazo médio de pagamento inferior a 60 dias”.
O CFP nota que o universo de entidades incluídas na Conta do SNS encontrava-se no ano em análise “em fase de transição, refletindo a reforma estrutural em curso no SNS, em particular com a criação de novas Unidades Locais de Saúde (ULS) e o processo de extinção das Administrações Regionais de Saúde (ARS)”.
Menos utentes, menos urgências, mas piores tempos de triagem
A entidade refere também que o número de utentes no SNS diminuiu pela primeira vez desde 2016, totalizando cerca de 10,5 milhões de utentes. O que também caiu o ano passado foi o número de utentes sem médico de família atribuído, que se fixou em 1,5 milhões (o equivalente a 14,5% dos inscritos), apesar de universo tenha mais do que duplicado nos últimos cinco anos, é assinalado.
Registou-se o ano passado um volume maior de consultas presenciais, o que levou a que as consultas nos cuidados primários tivesse crescido – invertendo a tendência dos últimos dois anos.
O que piorou foi o cumprimento dos tempos de triagem nos serviços de urgência e de internamento. Apesar de se ter verificado uma redução no número de episódios de urgência (fruto das políticas que desincentivam os utentes a recorrer a estes serviços sem antes ligar para o SNS 24), os tempos de triagem “foram cumpridos em apenas 56% dos casos, um valor inferior aos 60% registados em 2023, materializando-se uma tendência crescente de incapacidade de responder aos episódios nos prazos estipulados”, alerta-se.
Tagus Park – Edifício Tecnologia 4.1
Avenida Professor Doutor Cavaco Silva, nº 71 a 74
2740-122 – Porto Salvo, Portugal
online@medianove.com