Deambulava pelas ruas de Lisboa quando me deparo com uma família em desespero. Entre lágrimas e um aparente pânico generalizado, percebo que o jovem do grupo ali à minha frente teria de desistir do curso e da universidade onde tinha entrado.

Lisboa estava a expulsar um estudante pois não lhe havia destinado um local para residir sem falir o agregado familiar.

O cenário é tanto mais chocante quando percebemos que a selva mercantil em que a habitação em Lisboa se tornou quando se nota uma absoluta impunidade face aos abusos sucessivos de arrendatários e figuras semelhantes.

“Não há quem os trave”, dizia a mãe do estudante em estado de choque. “Pediram-me 600 euros por um quarto minúsculo sem janela e ainda por cima exigiram-nos três meses de renda de avanço”, gritava.

Se para qualquer família da chamada classe média portuguesa é quase impossível dispensar 1800 euros para um investimento mensal – quando os salários não chegam muitas vezes aos 1000 euros – facilmente se entende o desespero da impossibilidade daquela família Rodrigues, cujos salários rondam, em conjunto, os 1400 euros.

Este foi/é o caso dos Rodrigues, cuja decisão foi adiar, por ora, a frequência do jovem Pedro na licenciatura de gestão, já que a capital não é para pobres, diz-lhes o país. Mais dramático ainda é o país dizer-lhe que estudar naquele interior longínquo – a menos de 100 quilómetros da costa – é para os menos “capazes”.

E voltamos à era troikiana: os sacrifícios em tempos de crise são para “todos”, contudo, os mais frágeis (porque “vivem acima das suas possibilidades”, lembram-se?) sofrem sempre mais e os menos frágeis (os ‘duros’ da trama económica) não a sentem tanto.

Estudar, então, é mais um divisor discriminatório: se tem dinheiro fica e prossegue os estudos; se não, fica pelo caminho. Porquê? Porque quando a especulação e os cortes aparecem batem mais rapidamente à porta sem blindagem, como a da família Rodrigues.

Mas que país é este que continua a dizer os seus cidadãos que ser bem-sucedido é ter capacidade financeira? Que país é este que, com uma democracia quarentona, continua a dizer aos seus cidadãos que ser rico é poder optar e ser pobre é ter de continuar a sujeitar-se? Que país é este que diz aos seus habitantes que o litoral é tudo de bom e o interior é o “país real”, ou seja, tudo de mau?

Se é para continuar assim, sugiro que a pergunta mais urgente a fazer aos/às habitantes deste país seja: é português rico ou pobre? É português do litoral ou do interior? Dependendo da resposta, já ficamos a conhecer o destino. Assim seja.