A recente eleição de Mário Centeno para a presidência do Eurogrupo deixou o próprio muito satisfeito. Satisfeitos ficaram também o primeiro-ministro, o Governo e os deputados do PS. Também os candidatos à liderança do PSD expressaram o apreço pelo feito, enquanto que o Presidente da República enfatizou a importância do nosso ministro das Finanças não subalternizar as funções domésticas face às novas responsabilidades europeias.

Os partidos à esquerda do PS receiam que Centeno se torne um porta-estandarte da ideologia enquistada na actual União Monetária, preocupando-se mais em agradar aos ministros da finanças conservadores, que detêm a maioria no Eurogrupo, deixando para trás a política de compromisso com o PCP e o BE que, verdadeiramente, foi a responsável pelo sucesso financeiro que até agora o Governo tem alcançado.

É sabido que Mário Centeno não é um ortodoxo radical fundamentalista (como a maioria dos ministros das Finanças europeus ou os economistas responsáveis pelas políticas da UEM e do BCE são). Mas também não é um heterodoxo opositor do sistema que governa as finanças europeias. Neste contexto, fica por saber se esta eleição terá algum significado substantivo de mudança concreta nas políticas estruturais de gestão do Euro ou se, pelo contrário, é uma demonstração da captura pelo sistema de alguém que estava a conseguir provar que era possível alguma margem para alternativas.

Algumas realidades são objectivas: o cargo não tem poder executivo nem deliberativo autónomo; a maioria dos ministros das Finanças deste grupo continua a pertencer à facção crente na austeridade virtuosa; Mário Centeno fica valorizado profissionalmente.

Sempre preferi personalidades positivas e risonhas às carrancudas. Mário Centeno pertence ao primeiro tipo. E notou-se a satisfação com que abraçou esta nova responsabilidade. Mas todo esse contentamento só nos servirá se ele for capaz (conjuntamente com aqueles que defendem mudanças na Zona Euro) de pressionar para que sejam feitas as devidas correcções ao Euro, de forma a que esta moeda deixe de ser um gerador de desequilíbrios, com um favorecimento claro dos países do Norte à custa dos países da periferia.

Lembro-me bem de quando Durão Barroso fugiu de Portugal para percorrer a sua via dourada, de presidente da Comissão Europeia a colaborador da Goldman Sachs. Barroso tornou-se um dos homens mais felizes do mundo, bem demonstrado pelo permanente sorriso que ostentava. Porém, durante a sua presidência, Portugal em nada beneficiou dessa felicidade, pelo contrário, muito sofreu.

Por isso, temos que esperar que, com Centeno, a história não se repita e que, por uma vez, um português que assume funções de protagonismo internacional consiga agir em função do interesse dos portugueses (que são periféricos e pouco poderosos) e não apenas em função do seu interesse individual ou do que convém aos mais ricos dentro da União. O que desejo é que Centeno seja fiel ao que defende, no sentido das alternativas, e que não se torne em mais um daqueles que dobram a coluna para poder subir as escadas.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.