[weglot_switcher]

Descarbonização: Portugal está no bom caminho, mas ainda tem trabalho a fazer

Energias renováveis e descarbonização das sociedades são incontornáveis e Portugal compara bem com os seus pares, mas pode fazer melhor e o papel do Governo é fundamental para a transformação.
12 Junho 2021, 19h00

O recente reforço de 15 pontos percentuais dos níveis estabelecidos pela União Europeia (UE) para a redução da emissão de gases com efeito de estufa para 55%, até 2030, e o regresso dos Estados Unidos da América (EUA) aos Acordos de Paris, com a meta agora definida de uma redução entre 50% e 52%, até à mesma data, são exemplos claros do caminho que está a ser seguido de descarbonização das sociedades – para se atingir a ambicionada neutralidade carbónica em 2050 – e, em consequência, de desenvolvimento das energias renováveis. Os especialistas ouvidos pelo Jornal Económico (JE) consideram que os objetivos propostos são ambiciosos, mas inevitáveis, e que Portugal compara bem com os seus pares no caminho que está a percorrer.

“As energias renováveis representaram 11,4% do consumo energético global em 2019 e estima-se que ocorra uma mudança significativa até 2050”, com estas a passarem para a “liderança do abastecimento de energias primárias [o cenário mais ambicioso indica 60% do consumo energético global]. Este indicador mostra-nos o longo caminho que ainda temos pela frente no que toca à implementação das energias renováveis face às fontes tradicionais não renováveis, como carvão, petróleo e gás”, afirma Pedro Subtil, partner e Energy Segment Leader da consultora EY.

“Os vários objetivos apresentados são efetivamente ambiciosos, mas essenciais para que se efetive uma maior velocidade de mudança”, assinala Pedro Subtil, alertando que, “para os atingir, serão necessários investimentos significativos por toda a economia e sectores de atividade”. Bruno Morais Marques, associate partner da consultora Deloitte sublinha, também, a ambição, mas aponta que o tempo acaba por não ser tão longo como parece à primeira vista. “Se pensarmos bem, 30 anos [até ao objetivo da neutralidade carbónica] não é assim tanto tempo, considerando os ciclos de investimento associados a este tipo de infraestruturas, ou o ritmo a que os hábitos de consumo se alteram”.

Por isso, os especialistas concordam que os governos têm um papel a desempenhar na aceleração dos processos e na concretização dos objetivos, tanto pela definição do enquadramento, como pela promoção do investimento necessário. “A União Europeia e os governos estão conscientes desta necessidade, há um foco muito relevante no alinhamento com os compromissos internacionais”, referem João Ramos, Utilities and Resources Lead Partner, e Cláudia Coelho, Sustainable Business Solutions Director, ambos da consultora PwC. “A atual crise veio alertar para a fragilidade das economias e expôs a vulnerabilidade a temas globais como as alterações climáticas, pelo que muitos países apresentaram novas metas mesmo neste contexto e comprometeram-se a fazer do clima o pilar fundamental dos pacotes de recuperação. Esta questão é visível na relevância atribuída à transição climática no Plano de Recuperação e Resiliência, ou na regulação sobre finanças sustentáveis publicada pela UE, que procura o alinhamento do setor financeiro com os compromissos europeus”, sustentam.

Uma das vertentes de intervenção é através da fiscalidade e, neste campo, Ana Chacim, consultora de Tax e Política Fiscal da EY, considera que, “apesar do caminho positivo traçado nos últimos anos, as medidas de natureza fiscal transparecem alguma complexidade e incoerência, acomodando situações de aparente duplicidade tributária, que importa clarificar, sob pena de poderem condicionar um investimento que ainda é necessário para o cumprimento das metas nacionais comprometidas no que concerne às políticas de descarbonização da economia”.

É que, além dos impostos tradicionais, o quadro fiscal aplicável ao sector inclui instrumentos relevantes com impacto financeiro nos operadores económicos abrangidos, que tem sofrido oscilações. Exemplo? A Contribuição Extraordinária sobre o Setor Energético, que se mantém e agora inclui também a produção de eletricidade a partir de fontes renováveis abrangida por regime de remuneração garantida”. “Enquanto se aguarda a aprovação do regime jurídico repetidamente prometido nas últimas Leis do Orçamento do Estado, são compreensíveis as dúvidas e incertezas por parte dos investidores”, diz Ana Chacim.

Boa comparação, mas com trabalho a fazer
Neste processo, Portugal compara bem com outros países. Pedro Subtil aponta que o país subiu cinco lugares no Renewable Energy Country Attractiveness Index de 2020, que mede a atratividade de 40 países pelo seu investimento em energias renováveis, alcançando a 22ª posição. “Ficou, assim, à frente de países como Finlândia, Bélgica, Suécia e atrás da Alemanha e França, por exemplo, mas indicando uma evolução positiva”, diz. No entanto, assinala, também, que Portugal contribuiu negativamente para a meta europeia de redução de emissões de CO2, no ano passado, com um aumento de 1%, e que a redução de 17% das emissões de CO2 definidas como objetivo “foram considerados insuficientes pela UE, indicando que esta meta deveria ser mais elevada e ficando Portugal com o desafio de acelerar esta redução”.

João Ramos e Cláudia Coelho também referem dados positivos e negativos: o relatório da PwC “Net Zero Economy Index” conclui que o que está a ser feito é insuficiente, “pois apesar da taxa de descarbonização em Portugal ser de 6,3%, um valor superior ao de muitos países, é inferior aos 12% necessários para cumprimento do Acordo de Paris”. No entanto, as “políticas e estratégias, como o Plano Nacional Energia e Clima (PNEC), o Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050 (RNC 2050) e a Estratégia Nacional para o Hidrogénio (EN-H2), definem o roadmap a seguir para alcançar esse objetivo e colocam Portugal numa posição de destaque”, dizem.

Essa posição de destaque é, também, uma oportunidade, como considera Mónica Carneiro Pacheco, sócia da sociedade de advogados CMS Rui Pena & Arnaut. “Há quem critique e diga que estamos a fazer demais, mas a verdade é que a transição energética é uma oportunidade de captar investimento, sendo que os investimentos que estão planeados são investimentos privados, não são investimento público, embora possam e devam vir a beneficiar de fundos comunitários que estão previstos precisamente para esse fim”, assevera. “Portugal tem o maior potencial renovável do espaço europeu e devemos ter a capacidade de aproveitar esses recursos. Senão perdemos a oportunidade”, defende.

Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.