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“Portugal tem capital intelectual significativo”, defende ACEPI

O tecido empresarial português tem feito uma aposta certeira na transformação digital, mas ainda não chega. Ao Jornal Económico, Pedro Santos, vice-presidente da Associação de Economia Digital, diz que “é importante que se criem condições para alavancar a transformação digital em diversos setores da economia”.
ACEPI Pedro Santos
3 Dezembro 2024, 16h39

O Digital Report da UE referente ao ano passado diz que Portugal tem espaço para melhorar a competitividade digital. Na perspetiva da ACEPI, quais os maiores desafios que o ambiente empresarial enfrenta com a transição digital?

Mais do que uma transição digital, estamos na presença de uma transformação digital. Se, por um lado, o digital nos traz enormes oportunidades para acelerar a inovação e fazer prosperar os negócios, por outro, traz riscos e desafios substantivos. A grande oportunidade para um país como Portugal é utilizar a sua capacidade intelectual e de inovação para superar dificuldades relacionadas ao acesso a recursos e às limitações decorrentes do tamanho das empresas. Além destas dificuldades, o ambiente empresarial enfrenta desafios no âmbito do desenvolvimento de infraestruturas, na mudança cultural e na criação de um contexto que privilegie a experimentação, o risco, ou a igualdade de oportunidades com outras empresas que se assumem como globais.

O relatório evidencia lacunas significativas na adoção de tecnologias digitais avançadas, tais como IA e Big Data, especialmente no que toca às PME. O que está a impedir este segmento de empresas a investir nestas tecnologias? Que medidas podem ser tomadas para superar essas mesmas barreiras?

É importante considerar que o próprio avanço tecnológico continua em evolução e, como tal, exige uma maior preparação por parte das empresas para que adotem, de forma mais célere, novas tecnologias. Contudo, Portugal tem demonstrado, nos últimos anos, um progresso anual superior à média europeia em vários indicadores referentes à adoção tecnológica.

Claro que há caminho a percorrer. Muitas pequenas e médias empresas (PMEs), que representam grande parte do tecido empresarial português, carecem de conhecimento e recursos especializados, o que acaba por ser também uma barreira na adoção de novas tecnologias. O estudo mais recente da Associação de Economia Digital (ACEPI) sobre o panorama da economia digital em Portugal destaca precisamente esta discrepância: 17% das empresas portuguesas utilizam a IA nas suas operações (o que representa um número acima da média europeia), mas 30% das PMEs nem conhecimento básico da internet têm. Para superar estas barreiras, é necessário que se implementem medidas de apoio direcionadas às PMEs, tais como políticas públicas que contribuam para aliviar os custos iniciais de investimento e que se criem condições para apostar na formação para dotar as empresas de competências necessárias para aplicar ferramentas de IA de forma estratégica nos seus negócios.

A ACEPI tem um papel ativo nesta maior transição digital, contribuindo tanto para a sensibilização e divulgação deste tema quanto, principalmente, para a formação e capacitação de empresários e empreendedores. Por meio de programas como o Comércio Digital e as Aceleradoras Digitais, apoiamos a jornada de diversos negócios na adaptação ao ambiente digital, proporcionando ferramentas e conhecimento para que mais empresas integrem com sucesso a economia digital. Ainda assim, a ACEPI  reconhece que precisa de intensificar o seu trabalho junto do tecido empresarial.

O documento da UE mostra que as PME portuguesas apresentam um nível básico de intensidade digital. Que estratégias sugere a ACEPI para aumentar a digitalização das PME nacionais? Como é que podemos garantir que estas empresas não ficam para trás?

Para garantir que as PMEs têm acesso ao mesmo tipo de recursos e oportunidades para aumentar a digitalização dos seus negócios, o foco deve estar na sensibilização e formação, algo que a ACEPI tem realizado, mas que deve ser intensificado. Em simultâneo, é essencial combinar iniciativas de capacitação com apoios financeiros e incentivos públicos. Políticas que proporcionem acesso a fundos de inovação, créditos fiscais para a adoção de novas tecnologias e parcerias com entidades formadoras podem fazer uma grande diferença para as PMEs. Criar redes de mentoria e parcerias com grandes empresas e associações empresariais também é fundamental para construir um ecossistema de apoio contínuo, onde as PMEs possam aprender com os melhores exemplos e obter a ajuda necessária para a sua transformação digital.

Este é um trabalho crucial se queremos desenvolver uma cultura digital de forma transversal a todos os negócios. Portugal tem um capital intelectual significativo e é importante que se criem condições para alavancar a transformação digital em diversos setores da economia.

Bruxelas evidencia a necessidade de melhorar a conectividade e infraestrutura digital em várias regiões portuguesas. Um dos pontos é que a falta de rede de qualidade pode ser um bloqueio ao crescimento digital. Como é que a ACEPI vê a evolução da infraestrutura digital no país? Que papel os setores público e privado devem desempenhar neste contexto?

É verdade que a parca conectividade e infraestrutura digital em regiões menos desenvolvidas pode ser um bloqueio ao crescimento digital, mas também neste caso a evolução tem sido notável. Como exemplo, ao longo de 2024, o indicador de cobertura 5G evoluiu de 70,1% para 98,1%, significativamente acima dos 89,3% da União Europeia (40% de progresso anual vs 9,8%, respetivamente). Este é mais um importante indicador na criação de condições para um desenvolvimento digital mais sustentável e inclusivo em Portugal. A rápida evolução da cobertura 5G no país demonstra um compromisso significativo com a modernização da infraestrutura digital, permitindo não apenas um acesso mais amplo a serviços de alta velocidade, mas também criando novas oportunidades para a inovação em diversas áreas, como na Internet das Coisas (IoT), automação e serviços digitais.

No contexto da melhoria da infraestrutura digital, tanto o setor público quanto o privado desempenham papéis indispensáveis. O setor público deve liderar iniciativas para garantir que haja políticas claras e financiamento adequado para a expansão da rede, facilitando parcerias público-privadas que promovam o investimento em infraestrutura. Por sua vez, o setor privado deve investir em tecnologias e soluções que melhorem a conectividade, assim como colaborar com o setor público para identificar áreas prioritárias de desenvolvimento. Esta ponte entre ambos os setores é fundamental para construir uma infraestrutura digital robusta e abrangente, que continue a possibilitar a que todas as regiões portuguesas tenham oportunidades de prosperar na economia digital.

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