O envelope financeiro sem precedentes que Portugal vai receber da UE levanta fundadas dúvidas sobre a nossa capacidade de executar com eficiência, qualidade e celeridade os novos fundos comunitários.

Para além de avultado, perto de 58 mil milhões de euros (verbas do Portugal 2020, do Fundo de Recuperação e Resiliência e do quadro financeiro plurianual), o pacote de ajudas previsto para o país terá de ser aplicado em diferentes períodos até 2029, circunstância que obriga à execução de projetos em prazos mais curtos do que os dos anteriores quadros comunitários de apoio.

A capacidade de execução dos fundos depende, em primeiro lugar, da máquina do Estado e só a jusante dos promotores dos projetos financiados. Isto significa que, sem uma Administração Pública ágil e flexível na gestão das ajudas comunitárias, o dinheiro europeu não vai chegar no timing desejado ao tecido económico e social, inviabilizando investimentos com interesse nacional.

Mesmo que os projetos tenham qualidade e os seus promotores sejam competentes, como tantas vezes acontece, o financiamento só será efetivo se os serviços públicos souberem dar uma resposta cabal às candidaturas aos fundos europeus.

Acontece que a história recente não é muito animadora no que se refere à eficiência e celeridade da máquina do Estado na gestão dos apoios comunitários. O financiamento das empresas pelo Portugal 2020 tem sido marcado pela complexidade e morosidade na operacionalização dos fundos. Défice de informação, ambiguidade legislativa, formalidades avulsas, sobreposição de funções entre entidades gestoras, excesso de garantias impugnatórias, falhas no cumprimento de prazos e ineficiências várias no processo decisório são alguns dos obstáculos à execução do quadro comunitário ainda em vigor.

Tudo isto tem um nome, burocracia, e é há muito um problema nacional, apesar dos avanços alcançados com o programa Simplex. Para que não se repitam os erros do QREN e do Portugal 2020, é indispensável proceder-se à simplificação dos processos de candidatura, avaliação e execução dos projetos no âmbito dos novos programas comunitários.

Neste esforço, importa otimizar os formulários para submissão das candidaturas, reduzir os procedimentos referentes aos sistemas de incentivos, uniformizar os critérios de elegibilidade de promotores e despesas, encurtar os prazos processuais de decisão, melhorar a interface das plataformas digitais de candidatura, evitar a sobreposição de funções entre entidades gestoras e aligeirar as garantias impugnatórias.

Para atender a estas e a outras questões que implicam com a operacionalidade dos fundos, há que reforçar a máquina do Estado com recursos humanos e tecnológicos. Nas últimas décadas assistimos a uma sangria de dirigentes e quadros qualificados na Administração Pública, atraídos por melhores condições profissionais no sector privado. Urge agora, por um lado, captar e reter talento nas estruturas do Estado e, por outro, capacitar os funcionários públicos através de ações de formação, ao mesmo tempo que se lhes garante os meios informáticos adequados aos novos desafios.

Também me parece importante a criação de uma entidade específica de acompanhamento da execução da “bazuca financeira”, como lhe chamou o primeiro-ministro. Entidade, essa, onde estariam representados os principais agentes económicos e sociais. Reunir esta massa crítica afigura-se essencial quer para promover o retorno económico dos fundos, quer para garantir lisura e transparência na sua aplicação.