António Emílio Pires, presidente da APAJ – Associação Portuguesa dos Administradores Judiciais, defendeu hoje que “não precisamos de mais leis”, referindo-se ao Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
“Os políticos não deviam criar novas leis nos próximos 10 a 20 anos” disse o presidente da associação dos gestores das insolvências que considera que “são de facto as alterações que todos os anos cada governo quer fazer, que criam entropias no processo”.
O CIRE tem já 20 anos, mas segundo o responsável da APAJ “está atual”. O presidente da associação elogiou o Programa Revitalizar, um plano integrado de apoios para auxiliar empresas que se encontram em risco de insolvência, mas ainda assim são consideradas economicamente viáveis, criado pela então Ministra da Justiça Francisca Van Dunem, que consagrou o novo Processo Especial de Revitalização (PER); e criou o SIREVE – Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial, que privilegia soluções mais ágeis e eficazes no processo negocial e na mediação credores e devedores; entre outras medidas.
Estas ideias foram reveladas em mais um pequeno-almoço JE Advisory, que teve lugar esta segunda-feira, 23 de setembro, no hotel InterContinental, em Lisboa, debateu-se “as insolvências e a dificuldade de errar em Portugal”.
Para debater este tema e depois de uma introdução aos mecanismos de insolvência de pré-insolvência, feita por João Pedro Pinto-Ferreira, professor da Nova School of Law (co-coordenador do projeto de investigação “In-Solvens: Direito da Insolvência em Portugal, seguiu-se um painel, composto por Gonçalo Simões de Almeida, vice-presidente da ANJE – Associação Nacional de Jovens Empresários; António Emílio Pires, presidente da APAJ – Associação Portuguesa dos Administradores Judiciais; e Francisco Patrício, sócio e membro do conselho de administração da Abreu Advogados.
Os mecanismos consistem no processo de insolvência propriamente dito e, dentro dos pré-insolvências, está o Processo Especial de Revitalização (PER) para as empresas e o Processo Especial para Acordo de Pagamento para os particulares.
António Emílio Pires criticou também a indisponibilidade dos créditos do Estado, prevista na lei. O que significa que quando uma empresa entra em Processo Especial de Revitalização (PER) tem de saber que não há flexibilidade nos pagamentos ao Estado para lá do que prevê a lei. Isto é, a Autoridade Tributária recebe tudo, incluindo juros, em 150 prestações. No caso da Segurança Social às vezes há alguma flexibilização nos juros, reconheceu.
“Quando uma empresa pensa em ir para PER tem de saber que não pode contar com os credores Autoridade Tributária e Segurança Social”, refere, acrescentando que “não há margem para negociar com o credor Estado”.
A Lei Geral Tributária prevê que “o crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributária”.
“O Estado e a Segurança Social são de facto o credor principal da grande maioria dos Processos de Revitalização da Empresa”, sublinhou o presidente da APAJ que vê nesta disponibilidade da lei uma dos grandes fatores de insucesso dos PER.
O presidente da associação subscreve a opinião que uma empresa se deve apresentar a PER quando ainda tem condições de cumprir as suas obrigações creditícias, “ora o cenário em Portugal não é esse”, diz António Emílio Pires que acrescenta que as pequenas e médias empresas só se apresentam a PER quando recebem uma notificação de um credor a pedir a insolvência, nessa altura “vai a correr nos 10 dias seguintes, apresentar um PER para suspender o processo de insolvência, ou, noutros casos, apresenta-se a PER quando começa a receber ações de execução das dívidas”, explicou.
António Emílio Pires salienta a baixa literacia dos gestores como causa destes cenários, nomeadamente o protelarem as dificuldades e não reconhecerem a tempo o problema financeiro.
“Os administradores e os administradores judiciais são quem de facto dá o corpo às balas, nos processos”, sublinhou António Emílio Pires.
Apesar da inflexibilidade nos créditos do Estado, o presidente da associação elogiou a transparência e de caminho fez forte críticas à banca e ao regulador Banco de Portugal.
No caso da banca comercial a crítica foi dirigida à falta de transparência nos PER quanto ao sentido de voto, quando implica “haircuts” nos créditos, sempre escudada nas regras muito apertados do regulador.
“Qualquer empresário que tenha deixado um calote na banca está riscado para a vida”, destacou António Emílio Pires, sublinhando que não há o “refresh start” que existe por exemplo nos Estados Unidos.
“O regulador bancário cá é uma entropia à revitalização das empresas, tão grande como o Estado”, apontou.
Hoje a banca para ter os rácios regulamentares exigidos tem de se desfazer de dívidas, por isso aumentou a venda de carteiras de crédito, referiu António Emílio Pires.
“A banca, em Portugal, é um problema tão grande ou pior que o Estado na recuperação das empresas”, disse o presidente da Associação Portuguesa dos Administradores Judiciais.
Sobre a morosidade dos processos de insolvência, o presidente da APAJ separou os processos antes do CIRE e pós-CIRE, com estes a serem incomparavelmente mais rápidos.
“Há processos pós-CIRE a durarem 4, 6 meses, um ano”, disse apontando no entanto que “há tribunais (perto de Lisboa) em que para emitir uma certidão demoram oito meses, ou seja, para tirar a fotocópia da sentença e pôr um selo branco”.
“Há tribunais que para dar uma ordem de pagamento do dinheiro depositado há cinco anos no Tribunal, demoram 36 meses e só falta o juiz dizer, pague-se”, conta o presidente da associação.
“Mais do que alterar as leis, altere-se os quadros dos funcionários dos tribunais”, defendeu.
O presidente da Associação Portuguesa dos Administradores Judiciais, lembrou ainda que “desde 2012, as insolvências de particulares são muito mais do que as insolvências de empresas”.
Na fase das perguntas e resposta, questionado sobre o arrastar do processo de liquidação do Banco Privado Português que dura há 14 anos, em que a Comissão Liquidatária consome em salários a massa falida dos credores, o presidente da Associação Portuguesa dos Administradores Judiciais disse que nos bancos em liquidação os administradores (judiciais) são nomeados pelo Banco de Portugal.
“As massas falidas são credoras do BPP e essa pergunta nós também já fizemos”, confessou ao mesmo tempo que reconheceu que a administração judicial do BPP tem um staff de 12 pessoas “nitidamente a consumir os recursos da massa insolvente, infelizmente é o que temos e não consigo explicar porquê”.
“O Banco de Portugal entende que esses administradores judiciais, remunerados, fazem falta ao processo do BPP, e por isso lá continuam, mas isso não é um caso normal nas insolvência”, disse o presidente da associação.
Em processos de insolvência, normalmente os administradores judiciais têm uma remuneração fixa e depois têm uma remuneração variável em função da liquidação, portanto só recebem depois da liquidação, explicou António Emílio Pires.
(atualizada às 13h16)
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