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Projeto da barragem de Girabolhos previa gigabateria, mais água e estabilização do Mondego

Governo quer estudar viabilidade de construção de barragem na zona sul do distrito de Viseu. Projeto é elogiado por Nuno Ribeiro da Silva que liderava então a energética que tinha previsto construir esta barragem com um custo estimado de 500/600 milhões de euros e com uma capacidade de 360 megawatts.
11 Março 2025, 07h00

O Governo anunciou no fim de semana que vai lançar um estudo para avaliar a viabilidade da construção da barragem de Fins Múltiplos de Girabolhos no distrito de Viseu.

Com um orçamento previsto de 300 milhões de euros, tem um prazo de execução de 2026-2037, com a fonte do financiamento ainda por determinar.

O projeto faz parte da ambiciosa Estratégia Nacional de Gestão da Água – “Água que Une” que prevê cinco mil milhões de euros de investimento até 2030 para aumentar em 30% a água para o regadio e para aumentar a resiliência hídrica do país.

Mas o projeto de Girabolhos tem uma longa história. O Governo de José Sócrates lançou o Programa Nacional de Barragens de Elevado Potencial Hidroelétrico (PNBEPH) no final de 2007, e esta barragem ficou entre as 10 selecionadas.

A Endesa ganhou o concurso para construir esta barragem e chegou a obter luz verde, sujeito ao cumprimento de condições, por parte da Agência Portuguesa do Ambiente (APA) em 2010 para avançar com a sua construção.

O Aproveitamento Hidroeléctrico de Girabolhos tinha uma potência instalada de 360 megawatts (MW) e um investimento previsto, à altura, de mais de 350 milhões de euros.

Este projeto previa a construção de duas barragens – Girabolhos e Bogueira – pois contemplava a tecnologia de bombagem: a água turbinada pela central a montante fica armazenada na albufeira a jusante. Para ser reutilizada, é bombada para a primeira central para ser turbinada novamente.

O Plano Nacional de Barragens previa a construção de 10 barragens – Almourol, Alvito, Daivões, Foz Tua, Fridão, Girabolhos, Gouvães, Padroselos, Pinhosão e  Alto Tâmega (Vidago) -, mas os projetos borregaram durante a intervenção da troika em Portugal.

Mas do plano inicial foram construídas apenas quatro barragens: Foz do Tua, pela EDP; e Daivões, Gouvães e Alto Tâmega pela Iberdrola.

Em 2016, o acordo que deu origem à ‘geringonça’ previa a avaliação do Plano Nacional de Barragens. Resultado: Alvito e Padroselos (chumbo ambiental) foram excluídas; a Endesa recuou no projeto de Girabolhos; projeto do Fridão foi adiado por três anos e depois nasceu uma guerra entre o Governo de António Costa e a EDP: o ministro do Ambiente João Pedro Matos Fernandes alegou que a elétrica não estava interessada em construir, defendendo que o Estado não teria de devolver as contrapartidas já pagas. A EDP rejeitou estar deinteressada e avançou para tribunal para receber o dinheiro de volta. Depois de uma longa batalha judicial, o Estado devolveu 218 milhões de euros à EDP em 2024.

A barragem de Girabolhos é um projeto “interessante”, disse ao JE Nuno Ribeiro da Silva que liderava a Endesa durante os processos de atribuição da concessão e durante o cancelamento.

“É uma barragem de bombagem, permite funcionar como uma bateria, acumulando energia para usar nos períodos em que não conseguimos suprir necessidades de geração de eletricidade com fontes renováveis, como solar ou vento. As barragens de bombagem são preciosas pois funcionam como baterias, são a forma mais barata de acumular energia. É extremamente oportuno e interessante”, afirmou o gestor em conversa com o JE.

Mas o projeto inicial de Girabolhos não serviria somente para produzir eletricidade, tendo fins múltiplos. “Iria contribuir para alguma regularização do rio Mondego que só tem a barragem da Agueira. Chamam ao rio o “bazófias”: de vez em quando há cheias no baixo Mondego, e depois tem períodos com pouco caudal. A regularização do rio é uma mais-valia”.

“Os concelhos de Seia, Mangualde, Nelas e Gouveia, toda a zona sul do distrito de Viseu sempre teve problemas de abastecimento de água. Poder ter ali uma reserva de água é uma ajuda para regulizar o abastecimento de água, mesmo para usos primários, abastecimento às populações. Tem muitas virtudes, faz todo o sentido naquele local”, acrescentou.

Nuno Ribeiro da Silva – que liderou a Endesa Portugal durante 17 anos até 2023 – apontou que o projeto está “estudadissímo” e que até começaram a ser feitos “alguns trabalhos iniciais”.

Mas com a ‘geringonça’ a “rever as condições do que foi a concurso ganho pela Endesa”, a empresa “não podia estar pendurada na reabertura do dossier e continuar a gastar dinheiro à tripa-forra”, com o projeto então já orçamentado em “500/600 milhões” de euros.

Houve irresponsabilidade na gestão deste projeto pela geringonça? “Absoluta. Foi discutido e negociado e ficou no contrato os termos de tudo aquilo que se ia processar. Depois, de repente, por causa das negociações da geringonça, o Governo reabre a negociação. Já tinhamos o projeto, já tinhamos feito as expropriações todas. O estaleiro montado, acordos com as 4 câmaras. Afundámos uma data de dinheiro”, entre 60-70 milhões de euros.

“Faz todo o sentido” pegar no projeto. “Cria uma albufeira valente. E ali não há nada de inundações de aldeias ou igrejas. Além do mais, não são terras com qualquer valor especial, são terras abandonadas, mata degradada ou ardida”.

“Estávamos já no terreno. Tinhamos licença ambiental. Foi ciclópico. A maior parte das propriedades eram pequenas. Tinhamos já as licenças e chegaram e resolveram fazer truques”, considerando que houve “oportunismo” na forma como o processo foi gerido.

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