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Quando o direito à IVG é contestado ilegalmente na TV com os milhões de um homem

O que este homem fez foi pagar milionariamente (com a conivência da CMTV, CNN e TVI) para atentar contra um direito fundamental da mulher que é a possibilidade de decidir sobre o seu corpo e sobre a sua própria vida, sem incorrer no risco de “morte no vão de escada” ou de ser presa em países onde predominam pessoas como esta, que criminalizam as mulheres que interrompem voluntariamente a gravidez.
2 Junho 2025, 07h15

Não tecerei mais do que isto sobre a pessoa em causa (que desconheço para além de ter patrocinado uma das mais vergonhosas campanhas a que assisti na TV nos últimos tempos. O que este homem fez foi pagar milionariamente (com a conivência da CMTV, CNN e TVI) para atentar contra um direito fundamental da mulher que é a possibilidade de decidir sobre o seu corpo e sobre a sua própria vida, sem incorrer no risco de “morte no vão de escada” ou de ser presa em países onde predominam pessoas como esta, que criminalizam as mulheres que interrompem voluntariamente a gravidez.

Este, é mais um exemplo expressivo do discurso de ódio contra as mulheres, normalizado nestes tempos funestos por forças políticas partidárias de extrema direita e por um ror de misóginos que desvalorizam as mulheres, ao ponto de as objectificar, humilhar e, mais grave, as matar – criminalizar o aborto é uma forma indireta de feminicídio, que se comprova pelo facto de que desde que se legalizou a IVG em Portugal não só os abortos diminuíram, como nunca mais morreram mulheres por abortos clandestinos, nem comprometeram  a sua saúde e fertilidade.

Vamos a lá a esclarecer, e de forma simples, o seguinte:

– A interrupção voluntária da gravidez é um direito e está legalizada em Portugal (Lei n.º 16/2007, de 17 de abril).

– O corpo e a decisão sobre o seu próprio corpo é exclusivamente da mulher!

– Toda e qualquer mulher tem o direito de decidir se quer e quando quer ser mãe!

– Nenhuma mulher tem a obrigação de ser mãe! A maternidade é uma escolha!

– Toda e qualquer pessoa tem direito à pluralidade das vivências e de decisões próprias.

O anúncio além de ser grotesco, insultuoso e ofensivo para tantas mulheres (insinua mesmo que são assassinas), é de uma desonestidade, preconceito e de uma hipocrisia moral abjeta. Quantos milhões empreendeu este homem e as televisões que lhe deram palco na defesa da saúde e segurança das mulheres? Ou na defesa da dignidade de vida de todas as crianças que nascem para que não sejam vítimas da fome, e da privação de direitos elementares como a educação e a saúde? Que campanhas fizeram contra a violação de mulheres, para que este crime seja assumido como crime público no nosso país? Quantos milhões empenharam na campanha de prevenção do cancro do útero e da mama, promovendo a vacinação contra o HPV em todas as meninas a partir dos 12 ou 13 anos? Quantos milhões investiram na prevenção e combate à violência doméstica e outras violências contra as mulheres, incluindo as idosas, e crianças?

O anúncio de mensagem claramente política e ideológica, transmitido fora de contexto de tempo de antena de Campanha ou Referendo, transgride certamente a lei regulada pela ERC, da TV e demais serviços audiovisuais, assim como o Código da Publicidade (Decreto-Lei n.º 330/90) que proíbe publicidade com conteúdos discriminatórios ou ofensivos, nomeadamente contra a dignidade das mulheres.

Este anúncio não se trata de liberdade de expressão como se quer fazer passar em alguns sectores, mas precisamente de um abuso à liberdade individual de cada mulher e para tal recorre-se à instrumentalização de meios de comunicação para um maior alcance de uma doutrina ultraconservadora e reacionária que abomina as mulheres e os seus direitos humanos, e por tal nem se importam de perigar a própria saúde pública que é também o que está aqui em causa.

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