O Horizon Europe tem sido apresentado como o principal instrumento de promoção da Inovação na Europa a partir de 2021, com três principais eixos: Ciência Aberta, Desafios Globais e Inovação Aberta.

A opção por reorganizar os instrumentos de apoio à inovação às PME, eliminando o seu principal programa – SME Instrument – em que Portugal tem tido bons resultados, merece atenção. Apesar do SME Instrument ser um concurso muito competitivo, com taxas de sucesso abaixo dos 10%, são já 84 as PME portuguesas com projetos de Fase 1 (50 mil euros para o desenvolvimento de um estudo de viabilidade do negócio) e 13 de Fase 2 (até 2,5 milhões de euros para demonstração da inovação).

Estes 97 projetos totalizam 22,4 milhões de euros de financiamento comunitário, apoiando muitas empresas a escalar os seus negócios internacionalmente e a ganhar exposição em ambientes competitivos e inovadores.

O próximo programa-quadro deverá cimentar o European Innovation Council (EIC) através de dois novos instrumentos de apoio à inovação disruptiva e criadora de novos mercados: o Pathfinder, para investigação avançada e primeiros estágios de desenvolvimento tecnológico; e o Accelerator, focado na entrada e crescimento no mercado.

A principal novidade surge através do instrumento Innovation Ecossystems, que irá cofinanciar entidades nacionais ou regionais no apoio à inovação (fora do âmbito do EIC). Há quem refira que se trata de uma transferência de responsabilidades sem ter sido devidamente acautelada a capacidade de, nos Estados Membros, serem absorvidas as funções que delas surgem, gerando por isso novos riscos de agravamento de assimetrias entre os países.

No caso de Portugal, as agências de financiamento virão a ter, se tudo se mantiver como proposto até aqui, novas atribuições e com elas a necessidade de criar e gerir programas à escala europeia, com parceiros de outros países e regras harmonizadas. Impõe-se por isso aprofundar o desenho e a adoção de medidas de simplificação e de desburocratização, atenuando o risco de agravamento das condições de inserção das PME portuguesas em iniciativas e programas internacionais, que passarão a depender de financiamento nacional e da eficiência e conhecimento específicos das agências nacionais.

Na lógica do “contrato social” em que o espírito deste novo programa-quadro tem vindo a ser debatido, no caso de Portugal parece indispensável relembrar o papel das PME, sobretudo de base científica e tecnológica, na transformação da nossa sociedade e na construção de um país mais desenvolvido e inovador.

Para além dos cidadãos, dos governos e dos cientistas, esse “contrato social” terá de encontrar o espaço próprio para que os outros atores do sistema de inovação sejam mobilizados.  Sob pena de se basear numa perspetiva porventura mais individualista e limitada do que abrangente e agregadora. A inovação exige flexibilidade e liberdade para que diferentes dinâmicas colaborativas possam coexistir e, desse modo, potenciar as oportunidades para uma maior convergência com as metas associadas ao investimento em I&D na União Europeia e ao impacto que dele se espera.

Ao contrário do que tem sido afirmado, as instituições contam! Porque, para além da ambição própria dos inovadores e dos empreendedores, permitem alicerçar um esforço coletivo gerador de mudança, em prol da democratização da inovação tal como Von Hippel há décadas propõe.

A ideia de que a inovação na Europa pode surgir apenas com empresas novas e disruptivas ignora a evidência de que são também as empresas existentes aquelas que, através de múltiplas estratégias, inclusive as de aquisição de outras empresas inovadoras, ao reinventar-se, ao associar-se em torno de diferentes arranjos colaborativos, ao aproximar-se e aliar-se a centros de investigação, ao valorizar e incorporar o conhecimento científico e tecnológico em novos produtos e serviços, mais poderão contribuir para acelerar a transformação e contribuir para as “missões” cada vez mais exigentes que permitam lidar com os desafios globais que enfrentamos e gerar valor económico e social.

Ora, se o contrato social de Rousseau, agora recuperado por Carlos Moedas na defesa de um novo modelo para a inovação na Europa, tanto tem contribuído para o debate do Horizon Europe, há que relembrar que o mesmo Rousseau defendia que “quem quer os fins, quer também os meios”. E se os “fins” do Horizon Europe parecem gerar consenso, face ao papel central que atribui à Ciência, quanto aos “meios” ainda há muito por acertar.