Fui recentemente “assaltado” por três títulos da nossa imprensa que me deixaram a pensar sobre o mundo em que vivemos, o país que estamos a construir e a expectativa que poderemos ter quanto ao futuro.
Em 19 de Junho de 2022, o jornal online “O ECO” titulava: “Portugal está entre os dez países que atraem mais milionários. Rússia é o que mais perde.”
Já a 31 de Maio de 2022, o jornal “Público”, na página 22, publicava uma notícia com o seguinte título: “Há 350 portugueses com 800 imóveis no paraíso fiscal do Dubai”. A16 de Julho de 2022, o “Correio da Manhã”, nas páginas 8 e 9, publicava um conjunto de textos sob o título genérico: “Metade dos reformados recebe menos de 275 euros”.
É fácil, a partir destes títulos, e das realidades que lhes subjazem, fazer o discurso populista a que tantas vezes vimos assistindo.
Não é esse o meu caminho. Antes, o de dizer que nunca foi tão difícil governar.
Capitais e pessoas circulam livremente pelo mundo global.
A financeirização da economia serve, frequentemente, para dar uma cobertura de legalidade a acumulações de capital que não são economicamente explicáveis.
Os sistemas fiscais, sempre atentos aos movimentos financeiros declarados pelos cidadãos, parecem não percepcionar o que não lhes seja declarado, assim ocorrendo expatriações de fundos muito significativas.
As migrações de milionários parecem não suscitar dúvidas, ou especiais cuidados.
A pobreza, especialmente na terceira idade, vai aumentando, sendo certo que os recursos são finitos e o nosso dever de solidariedade com os mais desfavorecidos é uma obrigação de cidadania impostergável.
Este é um mundo de contradições. Por isso dizíamos, nunca foi tão difícil governar.
Atrair investimento sem vender a alma, estimular a criação de riqueza sem que essa riqueza se acomode em paraísos fiscais, e proporcionar uma vida digna a todos os nossos compatriotas, é um exercício político muito exigente.
Exercício político a que acresce o não menos exigente de dar esperança e expectativas às novas gerações.
Vale a pena, a este propósito, lembrar o que escreveu Mário Soares em 2003: “Para onde caminha o mundo se deixarmos aprofundar o fosso que separa irremediavelmente os ricos – os imensamente ricos – dos pobres, mesmo nas sociedades mais desenvolvidas?”.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.