No início de dezembro de 2023, a ronda final das negociações do triálogo (Comissão, Parlamento e Conselho) terminou com um acordo político sobre o texto do Regulamento sobre Inteligência Artificial.

Simplificando, há três grandes temas em confronto, cada um com o seu defensor principal: a promoção de um mercado e de empresas nesta área (Comissão); a proteção dos direitos fundamentais dos cidadãos (Parlamento); e garantir que as autoridades policiais podem beneficiar do potencial da Inteligência Artificial (Comissão).

Nos últimos dias a presidência belga do Conselho divulgou o texto consolidado do Regulamento, o qual foi aprovado no dia 2 de fevereiro no Coreper I (compostos representantes permanentes adjuntos de cada Estado-Membro da União Europeia). Se não houver percalços, o Regulamento será publicado nos próximos meses, e será aplicável em 2026.

Trata-se da primeira iniciativa legislativa – a nível mundial – que pretende regular o tema da Inteligência Artificial de forma transversal. A Comissão pretende replicar o “sucesso” do RGPD, e definir o padrão regulatório aplicável à IA.

O Regulamento cria regras muito onerosas para os produtores de IA, muitos dos quais estão envolvidos em atividades de lóbi para tentar travar o que entendem ser excessos dos tecnocratas de Bruxelas. A negociação deste diploma muito tem alimentado a antiga discussão sobre o impacto da regulação na inovação.

As empresas que pretendem utilizar IA também são afetadas pelo Regulamento. Um dos grandes desafios para as empresas é justamente o facto que já estarem a utilizar hoje sistemas informáticos que integram tecnologias de IA. Nalguns casos, os trabalhadores estão a usar tecnologias de IA sem o conhecimento das empresas.

O Regulamento será aplicável a soluções que estão a ser utilizadas hoje. Mapear as aplicações existentes, identificar quais devem ser classificadas de alto risco, e aprovar novas políticas e adequar os mecanismos de governance existentes, são tarefas que devem ser desempenhadas o quanto antes.

Mais um passo no sentido da hiper-regulação da economia, dirão alguns. Assim sendo, a resposta à pergunta colocada no título deste texto é necessariamente “depende”.

Para as grandes empresas, habituadas a sistemas de regulação complexos, o Regulamento será útil para estruturar e definir procedimentos. Para os produtores de IA, o Regulamento será fundamental para a comercialização dos seus produtos e serviços (embora seja provável que estas empresas continuem a queixar-se). Para as pequenas e médias empresas, para o setor público e para o setor sem fins lucrativos, o Regulamento representará custos relevantes e obrigações que dificilmente conseguirão cumprir.

Portanto, não muito diferente do impacto do RGPD: boas notícias para alguns, mas não para todos.

Consulte aqui o nosso relatório sobre Inteligência Artificial.