Quando surgiu o advento das plataformas de compra e venda de produtos, muitos foram aqueles que desconfiaram. Não só da interligação entre a plataforma e o sistema bancário, mas também entre vendedor e comprador. Na verdade, até os maiores distribuidores online, têm parceiros (semi-)privados que fornecem produtos. Como garantir que ao encomendarmos (e pagarmos) por uma camisola fashion não recebemos ao invés umas cuecas sujas, para dar o pior dos exemplos?
Bom, a solução residiu na reputação. O Comprador atribuía estrelas de satisfação, e deixava um comentário. O acumular desse feedback dava pistas aos comparadores seguintes acerca da fiabilidade daquele vendedor. Um mecanismo de que estamos todos acostumados.
Lembrei-me disto a propósito do Reino Unido (RU) Pós-Brexit. Durante anos, principalmente na campanha pré-referendo, e no looongo processo após a vitória do “sim”, foi vendido aos súbitos de sua majestade que os apertados regulamentos da União Europeia, severamente acompanhados pela Comissão, retraiam o crescimento económico britânico. Ao invés do regozijo por fazer parte do maior mercado Mundial, com mais de 500 milhões de cidadãos e, mais importante, com o maior PIB Mundial acumulado, entre os 28 Estados – Membros, do lado de lá do canal da mancha maldizia-se o controlo do sistema financeiros, não obstante o RU ter mantido o seu banco Central e moeda devidamente aparte, maldizia-se o EU Budget, apesar do “cheque britânico”, e praguejava-se contra a livre circulação, ainda que mantivesse restrições próprias e que dependesse historicamente da emigração para garantir a dinâmica da economia.
Pois bem.. a city de Londres não “explodiu”, no sentido positivo, após o Brexit, nem conseguiu por si só sustentar um país em processo de decadência desde os anos da adesão. O Reino de Carlos III tem hoje o equivalente a 70% da riqueza interna da Alemanha, quando tinha 90% na altura do referendo. A Recessão chegou mais cedo, e promete ficar mais tempo, do que na Europa continental. Os “Ingleses”(para simplificar) continuam a não querer fazer um sem número de trabalhos, mas agora com franca dificuldade em ter “foreigners“ que os façam, e que sustentem uma segurança social que lhes oriente a vida. Mesmo que seja um sistema social espremido para não dar “borlas” a esses mesmos estrangeiros. Nos arredores das principais cidades continuam a viver anglófonos desocupados, sem vontade de trabalhar, ou simples excluídos do sistema. Era assim nos anos 70 e assim continua.. o problema é que essas pessoas voltam agora a ter dificuldade em chegar à próxima refeição. Porquê? Por uma multiplicidade de factores obviamente, boa parte resultado do Brexit. Mas destas quero destacar a “confiança” e a “reputação”. Num mundo tão complexo, interdependente, quase fazendo parecer uma linha de montagem do modelo T, onde todos competem mas todos sabem o que têm de fazer, quem arrisca em apostar, investir, emprestar, comprar a alguém que se fecha, que desconfia, que se isola? O Reino Unido deu o pior dos exemplos. Num mundo que todos dizem pretender agregar, ainda que alguns o façam pela lei da força, a Union Jack apostou no afastamento! Se o Reino Unido fosse submetido a uma página de feedback do Amazon ou do Aliexpress, receberia 1 estrela, por engano ao cliente e principalmente por mentira “in House”. Lembram-se qual o principal argumento contra a secessão da Escócia? Isso mesmo, que perderia a pertença ao espaço Europeu. Dois míseros anos depois, os Escoceses são enganados com uma consulta pública que os exclui da Europa Unida.
Já escrevi outras vezes que a União Europeia é um “atrai” crises. Crises económicas, financeiras, pandemias, guerras, têm um impacto superior na UE advindo do rigor do conteúdo dos tratados. Mas, por outro lado, é sempre a União a ser mais resiliente, pois tornou-se o barómetro da Humanidade. É aqui que mais se investe em direitos humanos, na proteção do ambiente, na regulação dos mercados, no combate à fraude e ao branqueamento. Sair “daqui” é dar um sinal ao exterior profundamente negativo. Se nem as piores autocracias deixam de se apelidar de “democracias”, se nem os fundos-abutre gostam de passar por especuladores, por que raio uma Nação (ou conjunto de nações) com uma história milenar, com a capacidade de exportar softpower (Como a Assunção rebentou com esta expressão) que não tem paralelo na relação income/número de habitantes (muito superior aos Estados Unidos, Japão ou Coreia) dá um passo na direção do isolamento como esta fez? Não há reputação que resista!
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