O Irão e a Arábia Saudita concordaram em restabelecer relações diplomáticas e reabrir as suas embaixadas dentro de dois meses, segundo avança a comunicação social dos dois países – que até agora eram inimigos declarados: xiitas de um lado, sunitas do outro, com desentendimentos em todos os planos, nomeadamente na guerra do Iémen.
“Após a recente visita do presidente iraniano Ebrahim Raisi à China, o secretário do Conselho Supremo de Segurança Nacional do Irão, Ali Shamkhani, viajou a Pequim na segunda-feira (6 de março) para iniciar uma negociação intensiva com a delegação saudita para resolver questões entre Teerão e Riad. Após vários dias de intensas negociações entre Shamkhani e o conselheiro de Segurança Nacional da Arábia Saudita, Musaid Al Aiban, em Pequim, foi alcançado um acordo na sexta-feira com o objetivo de retomar as relações entre os dois países”, escreve a The Islamic Republc News Agency, próxima do regime.
Uma declaração conjunta foi emitida pelo Irão, Arábia Saudita e China numa cerimónia oficial esta sexta-feira. De acordo com essa declaração, “o Irão e a Arábia Saudita concordaram em retomar as relações diplomáticas dentro de dois meses e reabrir embaixadas e agências em ambos os países”, refere ainda a mesma fonte – para adiantar que os ministros dos Negócios Estrangeiros “dos dois países devem manter conversas com o objetivo de cumprir a decisão e tomar as providências necessárias para a troca de embaixadores”.
A Agência de Imprensa Saudita confirmou o acordo, tendo também publicado a declaração conjunta, relevando que os dois países concordaram em respeitar a soberania de cada um e não interferir nos assuntos internos um do outro. E especificou que Riad e Teerão concordaram em ativar um acordo de cooperação em segurança assinado em 2001.
Wang Yi, diplomata de topo da hierarquia do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, disse que a China continuará a desempenhar um papel construtivo ao lidar com questões críticas e a demonstrar responsabilidade enquanto nação.
Riad rompeu relações com Teerão em 2016, depois de manifestantes terem invadido as representações diplomáticas sauditas no Irão – na sequência da execução de um estudioso muçulmano xiita dias antes.
O presidente iraniano visitou Pequim no mês passado e o presidente chinês, Xi Jinping, esteve em Riad em dezembro para participar em reuniões com nações árabes do Golfo, ricas em petróleo, cruciais para o abastecimento de energia da China.
Um porta-voz do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca disse que os Estados Unidos estão cientes das notícias segundo as quais o Irão e a Arábia Saudita retomaram as relações diplomáticas, mas adiantou que a administração Biden vai pedir detalhes aos sauditas.
“De modo geral, saudamos qualquer esforço para ajudar a acabar com a guerra no Iémen e diminuir as tensões na região do Oriente Médio”, disse o porta-voz à agência Reuters. “A redução da escalada e a diplomacia, juntamente com a dissuasão, são os principais pilares da política que o presidente Biden delineou durante sua visita à região no ano passado”.
O pouco entusiasmo das declarações não esconde que, para os Estados Unidos, a aproximação entre os dois Estados do Médio oriente é uma clamorosa derrota para a política externa norte-americana. Não só porque o seu aliado de décadas (a Arábia Saudita) se aproxima agora do seu inimigo desde 1979, mas principalmente porque a China recolhe todos os louros da resolução do problema. A vitória da diplomacia chinesa é diametralmente oposta á derrota dos Estados Unidos – sendo por certo a mais importante desde pelo menos o desaparecimento de Mao Tsé-tung (em 1976).
Com Joe Biden, a Arábia Saudita deixou de ter a posição de privilégio que tinha anteriormente – desde logo durante a presidência de Donald Trump – e Riad não gostou das posições assumidas pela administração norte-americana face ao caso do assassinato do dissidente Jamal Khashoggi em Istambul (apesar de Biden ter, num segundo momento, suavizado as suas referências ao caso) nem de ter sido deixado de fora da Cimeira da Democracia, de dezembro de 2021.
Por outro lado, com Donald Trump, a tensão entre os Estados Unidos e o Irão atingiu um pico máximo quando, em 2018, o então presidente saiu do perímetro do chamado Acordo Nuclear. De então para cá – e apesar de as negociações continuarem em aberto – os Estados Unidos não voltaram a aderir ao Acordo, muito por pressão de Israel, país que acaba também por ser um dos derrotados face à reaproximação entre o Irão e a Arábia Saudita. Recorde-se que Trump muito se esforçou, sem resultado, para que os sauditas fossem um dos signatários dos chamados Acordos de Abraão (que por exemplo os Emirados Árabes Unidos assinaram) que pretendiam promover a aproximação entre Israel e os principais países do mundo muçulmano.
Tagus Park – Edifício Tecnologia 4.1
Avenida Professor Doutor Cavaco Silva, nº 71 a 74
2740-122 – Porto Salvo, Portugal
online@medianove.com