Desde o início da pandemia que muito se tem falado da suposta dicotomia saúde versus economia, considerando-se, a meu ver erradamente, que a adoção de medidas sanitárias tem inevitavelmente como reverso a destruição de riqueza e emprego.
Ora, sem saúde pública não há economia que resista. Para a retoma económica ser efetiva, é indispensável conter a propagação do novo coronavírus. Caso contrário, não haverá estabilidade (económica, social e até política) para investir ou consumir. Por isso, enquanto os países não controlarem a transmissão viral, a recuperação económica permanecerá adiada e os prejuízos materiais e humanos acumular-se-ão sem fim à vista.
Em Portugal, e depois de dois meses de confinamento com efeitos devastadores sobre o tecido económico e social, tem sido possível combater a pandemia mantendo a economia relativamente aberta e a funcionar. Com o recente agravamento da situação epidemiológica do país, o Governo avançou com uma espécie de confinamento light, que procura travar a propagação da Covid-19 sem penalizar em demasia a atividade empresarial e o bem-estar social.
Creio que não havia outra alternativa e que se conseguiu, com as novas restrições, algum equilíbrio entre controlo sanitário e liberdade económica.
Importa atravessarmos o que falta deste sombrio ano sem comprometer o crescimento económico do terceiro trimestre, de modo a que, no final de 2020, a recessão seja menor do que o previsto. Tudo apontava para uma contração do PIB à volta de 10% este ano, mas a subida de 13,2% do produto nos meses de verão melhorou as expectativas económicas. Uma queda do PIB menos severa, entre 7 e 8%, seria um bom tónico para a entrada em 2021 – o ano de todas as nossas esperanças.
Com mais ou menos medidas restritivas, as empresas portuguesas já sabem que este outono/inverno vai ser extremamente exigente. Um inquérito do “Expresso” e da Deloitte, publicado este fim de semana, indicava que 88% dos CEO acredita que o impacto no volume de negócios das suas empresas nos próximos três meses será negativo ou muito negativo, 84% prevê uma diminuição significativa da procura de bens e serviços devido à pandemia e 2,9% pondera mesmo o encerramento temporário da atividade. Ou seja, nem a habitual dinâmica de consumo do Natal vai trazer algum alento à economia.
Para minorar o impacto da segunda vaga pandémica, que já era esperada e se previa mais agressiva do que a primeira, houve um esforço das empresas para otimizar custos, agilizar o teletrabalho, reforçar o comércio online e acelerar a digitalização de tarefas e processos. Por outro lado, muitas empresas apostaram na inovação e no desenvolvimento de novos produtos, como aconteceu no sector têxtil com a produção de máscaras com proteção antibacteriana e antivírus.
Ainda assim, o tecido empresarial português está bastante debilitado. Torna-se, por isso, necessário que os estímulos à economia se mantenham nesta segunda vaga e sejam até reforçados. Parece-me conveniente estender as moratórias bancárias, aliviar a carga fiscal, reduzir a burocracia, valorizar recursos através da formação, apoiar a transição digital e, sobretudo, encontrar novas soluções para recapitalizar as empresas. Em suma, é fundamental um novo quadro de apoios e incentivos à atividade empresarial para que o fim da segunda vaga seja, de facto, o início da retoma.