No passado mês de outubro, foi publicado o relatório “Roma Survey 2021-Main results” da Agência dos Direitos Fundamentais (FRA), onde são apresentados os resultados de um estudo sobre a situação socioeconómica das pessoas ciganas residentes em 12 países europeus, no ano de 2021.

O relatório expõe, de forma inequívoca, a situação económica preocupante da comunidade cigana em Portugal. Estima-se que 96% das pessoas ciganas residentes em território nacional viva abaixo do limiar da pobreza, o que posiciona o nosso país acima da média da União Europeia (UE), que ronda 80%. O relatório estima também que, em Portugal, cerca de 60% das pessoas ciganas viva em privação material severa, sendo este valor 12 vezes superior à taxa de privação material severa da população portuguesa total. As condições de habitação deste grupo social são frágeis, num cenário em que a sobrelotação dos fogos habitacionais é muito frequente.

Os dados relativos à educação das gerações mais jovens não são animadores: 90% dos jovens ciganos com idades entre 20 e 24 anos não concluiu o Ensino Secundário. Estes baixos níveis de qualificações levantam dúvidas sobre a possibilidade de, neste caso, a educação estar a contribuir para uma melhoria das condições de vida no futuro e para uma maior mobilidade social. O estudo revela também que, em Portugal, aproximadamente duas em cada três crianças ciganas entre os três e os cinco anos não frequentam o ensino pré-escolar, o que é também preocupante no sentido em que a frequência no ensino pré-escolar é reconhecida como um importante determinante do aproveitamento escolar futuro.

Sem querer reduzir um problema complexo a uma única dimensão, parece-me fundamental sublinhar o peso do anticiganismo na explicação da situação de pobreza, desvantagem e exclusão deste grupo social, como, aliás, se afirma no novo quadro estratégico da UE para a igualdade, a inclusão e a participação dos ciganos, apresentado pela Comissão Europeia em 2020.

Ao contrário do que seria de esperar, foi registado, em Portugal, um aumento no assédio contra as pessoas ciganas de 20% para 28%, entre 2016 e 2021. Efetivamente, nos últimos anos, os discursos de ódio contra a comunidade cigana têm vindo a ganhar espaço na esfera pública.

Em Portugal, 62% das pessoas entrevistadas afirma ter sido alvo de discriminação por pertencer à etnia cigana em áreas essenciais, como na procura de trabalho e habitação, em serviços administrativos, restaurantes ou bares, entre outros. Portugal foi, dos 12 países participantes no estudo, o país onde uma maior percentagem das pessoas inquiridas reconheceu ter vivenciado, nos 12 meses anteriores, situações de discriminação no acesso a cuidados de saúde (32%) e em contexto escolar (34%) e, nos últimos cinco anos, na procura de casa (77%).

No mercado de trabalho, 81% dos inquiridos admite, no último ano, ter sido alvo de discriminação no acesso ao emprego. Em linha com estes resultados, segundo o Eurobarómetro 493 de 2019, um questionário a cidadãos e cidadãs da UE, 47% das pessoas portuguesas inquiridas assume que não se sentiria “totalmente confortável” em trabalhar com uma pessoa cigana. Neste cenário, não será de estranhar que apenas 31% das pessoas ciganas em idade ativa tenha um trabalho remunerado.

Os progressos nas condições de vida da comunidade cigana têm sido lentos e insuficientes e é imperativo que as medidas propostas na Estratégia Nacional para a Integração das Comunidades Ciganas sejam efetivamente concretizadas. Há um longo caminho a percorrer para a integração socioeconómica das 37 mil pessoas ciganas em Portugal. Este caminho passará pela implementação de políticas públicas específicas dirigidas às comunidades ciganas e passará também, necessariamente, pelo combate ao anticiganismo.

O artigo exposto resulta da parceria entre o Jornal Económico e o Nova Economics Club, o grupo de estudantes de Economia da Nova School of Business and Economics.