Um dos receios dos investidores – que se avivou com a recente queda das taxas de juro no mercado obrigacionista – é que a economia da zona euro caminhe para um destino parecido com o da economia do Japão, para uma “Japanificação” (sem assumir concretamente se isso é bom ou mau). Desde uma grande bolha no sector imobiliário nos anos 90 – em que um arranha-céus em Tóquio valia mais do que Manhattan inteira – que a economia japonesa vive com taxas de juro em torno dos 0%, com níveis de crescimento económico anémicos e praticamente sem inflação.

O crescimento anémico é certamente indesejável, mas no Japão, por anémico que seja, tanto a taxa de desemprego como os índices de desigualdades são dos mais baixos do mundo. Algo que certamente é desejável, mas que muito dificilmente conseguiremos atingir na zona euro. Para perceber porquê, ajuda olhar para o mercado laboral japonês.

Segundo a Professora Hifumi Okunuki, que ensina sobre leis laborais numa universidade japonesa, os tópicos mais desafiantes para os alunos das suas cadeiras são os que estão relacionados com a greve laboral. Visto que no Japão as greves são quase inexistentes, muitos alunos têm dificuldade em visualizar em que consiste o direito à greve, qual o propósito da greve, e porque é que alguém enveredaria por tal rebeldia laboral. É uma diferença marcante face à realidade europeia, onde as greves e os protestos são recorrentes e por vezes violentos.

Se esta história soa a ironia para os europeus (e em particular para os portugueses), ler acerca da mais recente reforma da lei laboral japonesa vai provavelmente soar a piada.

Um dos pilares desta reforma laboral, que foi aprovada pelo Parlamento no ano passado e entrou em vigor emAbril de 2019, é um limite de 100 horas mensais no número de horas extraordinárias que os trabalhadores japoneses podem trabalhar. Caso não seja claro, isto são horas que os trabalhadores japoneses trabalham para além do horário normal em regime de full time, e equivale a duas semanas e meia de trabalho no horário mais comum em Portugal (as 40 horas semanais).

Ou seja, se na Europa algumas classes fazem greve e protestam para trabalhar menos, no Japão o governo tem que proibir os trabalhadores de trabalharem tanto, de forma a manter um equilíbrio saudável na sociedade entre vida pessoal e profissional.

É um forte contraste de realidades que se deve, em grande medida, a diferenças culturais dos povos. Estas diferenças culturais são muitas vezes deixadas de parte nas análises macroeconómicas, mas por vezes são o que melhor define o futuro de uma economia. Neste caso, fazem desacreditar que a zona euro caminhe para uma “Japanificação”. Resumidamente, nós somos muito diferentes dos japoneses, seja isso bom ou mau sinal…

Na Europa, os únicos povos capazes de levar a cabo um feito económico como o do Japão seriam provavelmente os nórdicos, que se assemelham mais aos nipónicos em termos culturais, mas mesmo nessa comparação existem algumas diferenças.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.