O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu uma relação de trabalho entre um estafeta da plataforma digital de entregas Glovo, decidindo que existia um contrato de trabalho por tempo indeterminado, dando razão ao recurso do Ministério Público (MP).
No acórdão do STJ datado de 28 de maio, os juizes conselheiros contestam a decisão anterior que não reconheceu a existência de uma relação laboral: “(…) Afigura-se-nos que os factos provados não permitem afirmar – em termos inequívocos, como se impunha – que a relação estabelecida entre as partes não reveste natureza laboral”.
Em comunicado, o STJ recorda que numa fase anterior do processo o tribunal já “tinha concluído que se verificavam cinco dos seis elementos que indiciam uma relação de trabalho”, segundo o previsto no Código do Trabalho, e agora, a pedido do MP, veio analisar e decidir se no caso concreto do estafeta em questão a Glovo conseguia provar que não existia um contrato de trabalho.
“O recurso pretendia que o STJ decidisse se a Glovo apresentava factos suficientes para refutar a existência de contrato de trabalho. Depois de analisar os factos, o STJ entendeu que a Glovo não logrou provar o contrário e, por isso, reconheceu a existência de uma relação de trabalho entre a empresa e o estafeta em questão”, explicou o STJ em comunicado.
O acórdão aponta que o estafeta tinha como ferramentas “absolutamente essenciais” de trabalho as plataformas e aplicações da Glovo, que a inexistência de um contrato de trabalho “não é um elemento essencial” para determinar a existência de um contrato de trabalho, que “o estafeta se encontrava na dependência económica” da empresa, entre outros aspetos que levaram os juízes conselheiros a concluir que o trabalhador “se encontrava sujeito à autoridade” da Glovo.
O acórdão assinala ainda que, “no sentido da subordinação”, foi tido em conta “o facto de o estafeta não ter qualquer obrigação de resultado para com a contraparte, bem como a circunstância de ele não assumir algum risco financeiro ou económico”, pelo que se decidiu que a Glovo não conseguiu rebater a presunção de laboralidade.
Os juízes conselheiros apontam ainda que no atual contexto laboral e de organização do trabalho “há várias situações profissionais em que é muito estreita a fronteira entre subordinação e autonomia”.
“Estas zonas cinzentas estão cada vez mais presentes nas relações que se estabelecem entre as empresas e os seus colaboradores; e as relações de emprego atípicas vão-se tornando cada vez mais típicas”, lê-se no acórdão.
O STJ refere que “com frequência” se encontram trabalhadores “ditos independentes” economicamente dependentes das empresas, “não raro ao longo de vários anos e em situação de exclusividade”, que trabalham nas empresas, com equipamentos destes, “e executam tarefas semelhantes às de ‘colegas’ seus formalmente assalariados, relativamente aos quais nem sempre se evidencia uma diferença nítida em termos de inserção na estrutura organizativa”.
“Todo um campo privilegiado, pois, para relações de trabalho pouco claras, ambíguas ou encobertas”, considerou o coletivo de conselheiros no acórdão que teve como relator o juiz conselheiro Mário Belo Morgado.
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