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Tanto NPL nunca mais!

Os bancos enquanto credores não podem ter constrangimentos em impugnar divórcios em que todo o contexto aponte para que tenham sido simulados.
15 Fevereiro 2019, 08h28

Os bancos portugueses têm vendido carteiras de crédito malparado em larga escala, o que tem contribuído enormemente para a redução dos níveis de non-performing loans (NPL), como Bruxelas recomenda. E em boa hora, os avisos do Banco de Portugal repetem-se alertando para a importância da adopção de medidas preventivas para que o volume de crédito bancário de cobrança difícil não regresse aos valores do passado recente.

Os tempos de problemas (e sustos) são por natureza propícios a mudanças, o que significa que os próprios clientes bancários facilmente compreenderão que as exigências na concessão de crédito têm de ser reforçadas para que não pague o justo pelo pecador na próxima crise económica e financeira (e ela há-de vir, só não sabemos quando).

Entre as alterações que os bancos podem implementar de imediato situam-se, desde logo, aquelas que derivam dos mecanismos que a lei já lhes concede como credores. Referimo-nos, por exemplo, à faculdade de accionamento da exigência de reforço de colaterais no caso de as garantias prestadas se tornarem insuficientes. É que a posição dominante em que o credor se encontra, segundo o entendimento do legislador, na fase de negociação do crédito, desfavorece-o em cenário de incumprimento, pois não existem verdadeiras alternativas ao calvário da acção executiva, excepto o mal menor da dação em cumprimento.

Razão por que os bancos deverão, por outro lado, estar muito atentos à variação patrimonial dos mutuários e dos garantes, impugnando prontamente todas as formas de esvaziamento de património. Só a utilidade e eficácia da acção pauliana explica a sua resistência desde o Direito Romano! E o efeito prático será tanto maior se for desencadeada logo, a tempo e horas, e não volvidos cinco anos menos um dia sobre as doações e as vendas…

E há que dizê-lo: os bancos enquanto credores não podem ter constrangimentos em impugnar divórcios em que todo o contexto aponte para que tenham sido simulados. Por alguma razão o nosso Código Civil prevê como mecanismo geral de conservação da garantia patrimonial que os credores possam invocar a nulidade de quaisquer actos praticados pelo devedor, não sendo necessário sequer que tais actos produzam ou agravem a insolvência do devedor.

No crédito às empresas (inacreditavelmente!), a prática indica que o penhor de estabelecimento comercial tem sido ignorado pelos bancos como possível garantia real, apoucando ou esquecendo que desde 2017 a lei permite que com esta garantia se celebre um pacto de apropriação automática, o que significa que o banco, em caso de incumprimento, pode fazer seu o estabelecimento dado em garantia, automaticamente e sem necessidade de recorrer aos tribunais e à morosa e onerosa acção executiva.

No quadro legal actual, já existem, pois, mecanismos de que os bancos poderão lançar mão no futuro, alguns até antecipatórios de cenários de incumprimento definitivo e que poderão ser o segredo mais bem guardado das medidas a tomar para que os níveis de NPL do passado recente não se repitam nunca mais.

A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.

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