As patentes são a modalidade de propriedade industrial que protege especificamente, pelo lado técnico, invenções e o resultado do investimento feito pelas organizações em investigação e desenvolvimento. O peso desse investimento na inovação no produto interno bruto (PIB) português mais do que duplicou no período de 10 anos terminado em 2019, atingindo 1,41%, segundo dados do Inquérito ao Potencial Científico e Tecnológico Nacional. Se olharmos especificamente para o esforço feito pelas empresas, vemos que o peso da despesa total em atividades de investigação e desenvolvimento daquelas mais do que triplicou, em 15 anos, para representar mais de metade do esforço nacional, atingindo 52,1%, mais do que o conjunto do Estado, ensino superior e instituições privadas sem fins lucrativos. Os dados do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) confirmam esta leitura: no ano passado, 52,9% dos pedidos de registo de patente foram apresentados por empresas, seguindo-se os inventores independentes, com 27,9%, e, por fim, as instituições do ensino superior e de investigação (19,2%).
À cabeça deste desenvolvimento estão a indústria farmacêutica o sector tecnológico.
“Temos assistido a uma maior iniciativa das empresas do sector tecnológico para a proteção de direitos de propriedade intelectual face a outros segmentos de mercado”, diz ao Jornal Económico (JE) José Luís Arnaut, managing partner da CMS Rui Pena & Arnaut e especialista em Direito de Propriedade Intelectual, com particular ênfase em novas tecnologias, patentes e marcas registadas. Arnaut não têm dúvidas de que existe uma cada vez maior “consciencialização da relevância da propriedade intelectual por parte destas empresas e, bem assim, da necessidade de proteção das suas invenções e criações”, o que demonstra a intenção que têm de “salvaguardarem a sua vantagem competitiva, potenciarem e protegerem o valor acrescentado gerado pelas suas invenções ou criações”.
A empresa de tecnologia para contact centers Talkdesk sublinha a ideia de necessidade de proteção da inovação. Fundada por portugueses, já tem o estatuto de unicórnio por ser avaliada em mais de mil milhões de dólares (cerca de 842 milhões de euros), tendo sido avaliada em 3.000 milhões de dólares (cerca de 2,5 mil milhões de euros) na última ronda de financiamento, e, só no último ano, lançaram 600 novas funcionalidades alavancadas em inteligência artificial. “A inovação é a nossa essência, aquilo que nos diferencia no setor e que nos permite continuar na vanguarda da indústria, por isso investimos de forma significativa na frente de investigação e desenvolvimento para continuarmos a liderar neste caminho da construção do futuro dos contact centers. Além disso, a inovação é, desde o início da Talkdesk, um dos nossos pilares. Temos como intuito criar novas soluções e produtos e contamos neste momento com equipas exclusivamente dedicadas a estas atividades. Só assim conseguimos continuar a marcar as tendências no domínio da experiência do consumidor”, explica Jason Fama, vice-presidente sénior da empresa, em declarações ao JE.
José Luís Arnaut aponta que as empresas tecnológicas são um dos motores associados à era digitalização e do conhecimento, que é caracterizada por uma “forte componente de concorrência entre as empresas”. É o investimento em investigação e desenvolvimento que confere capacidade às empresas de estarem um passo à frente da concorrência em termos de produtos e serviços, o que as obriga a protegerem-se.
Na Talkdesk, o registo de proteção de propriedade industrial nos Estados Unidos, porque é ali que se encontra a maioria dos concorrentes da tecnológica, mas existe a intenção e alargar a proteção. “Neste momento estamos a analisar a possibilidade de registar patentes pelo IEP [Instituto Europeu de Patentes], que cobrem a União Europeia e outros Estados”, diz Fama.
Em Portugal, no ano passado, o Altice Labs, o polo de desenvolvimento de novas tecnologias do grupo ALtice, foi a empresa que maior número de pedidos de de registo de patentes fez, mas na lista constam, também, a Weadd, a Bosch Termotecnologia e a Novadelta, e empreas so sector farmacêuticoe de biotecnologia.
Saúde em alta
Na área da saúde (incluindo a tecnologia ligada ao sector), a capacidade de as empresas conseguirem proteger a inovação é, também, essencial ao próprio negócio. “A propriedade intelectual é essencial para assegurar a conversão de ideias em ativos, soluções e produtos que permitam responder a necessidades médicas não atendidas e que melhorem a vida dos doentes e das suas famílias, ao mesmo tempo que criam valor e emprego”, afirma ao JE fonte oficial da Apifarma – Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica. “Garante às empresas que investigam e desenvolvem novos produtos de saúde a certeza que, se um produto de saúde inovador chegar ao mercado, estará protegido da concorrência desleal por um período de tempo limitado. Esta é uma condição necessária para investir no longo, complexo, arriscado e dispendioso processo de disponibilização de novos medicamentos aos doentes, aos sistemas de saúde e à sociedade”, acrescenta. “No caso específico da área da saúde, a propriedade intelectual tem garantindo o desenvolvimento de novos tratamentos”, conclui.
Segundo um estudo da consultora EY Parthenon, a indústria farmacêutica foi, em 2018, entre as indústrias transformadoras em Portugal, aquela que mais investiu em investigação e desenvolvimento, triplicando a da indústria de artigos de borracha e matérias plásticas, que surge logo a seguir. A liderança deste movimento é protagonizada pela Bial e pela Hovione, empresas do sector com projeção internacional.
Defesa dos direitos
Como é feita a defesa dos direitos de propriedade intelectual? Através de acordos de confidencialidade, protocolos de colaboração, mas sobretudo com formação das pessoas na área de propriedade intelectual e do segredo comercial.
Ao JE, o managing partner da CMS Rui Pena & Arnaut explica que quem participa em projetos de investigação na área tecnológica tema necessidade de “acautelar os seus direitos e estabelecer obrigações contratuais desde a fase inicial dos projetos de investigação”. Por isso, “é frequente os intervenientes celebrarem acordos de confidencialidade, bem como estabeleçam protocolos de colaboração, nos quais ficam, expressamente, estabelecidos os direitos e obrigações das partes envolvidas”.
“Ora, é, precisamente, neste tipo de protocolos de colaboração que deve ficar expressamente definido a quem pertence a titularidade dos direitos de propriedade intelectual sobre determinada invenção ou criação”, prossegue. O caminho também é trilhado com a aposta das tecnológicas “na formação dos seus funcionários em áreas relacionadas com a proteção da propriedade intelectual e do segredo comercial, com o intuito de blindar as suas vantagens concorrenciais num mercado tão competitivo como o da tecnologia”, conclui Arnaut.
A academia também se protege
Não são só as empresas que têm necessidade de defender a propriedade intelectual do trabalho realizado. Também na academia, onde grande parte da investigação nasce, é necessário acautelar os direitos das inovações e das criações. Aliás, a seguir às empresas, é a academia que tem o maior peso da despesa total em atividades de investigação e desenvolvimento no PIB, com 0,57%, em 2019, um valor que se mantém constante acima de 0,5 da riqueza criada anualmente, desde 2008.
Exemplo deste investimento no conhecimento é o Instituto Superior Técnico (IST), que tem atualmente um portfólio de 278 invenções ativas nacionais, entre patentes em análise e concedidas, modelos de utilidade em análise e concedidos, segundo o professor Pedro Amaral, vice-presidente do IST com o pelouro das ligações empresariais e operações. “Ao portefólio nacional, acrescem as famílias de patentes que incluem 121 patentes internacionais em análise e concedidos”, refere, revelando que o IST submete por ano, em média, “e de acordo com uma estratégia prévia que avalia o potencial de patenteabilidade e licenciamento”, 15 pedidos de patentes nacionais e 10 pedidos de patentes internacionais, “designados como PCT”.
Pedro Amaral explica que a estratégia do IST, em matéria de defesa do direito de propriedade intelectual, passa, essencialmente, “pelo desenvolvimento de modelos de licenciamento a empresas que têm a capacidade de implementar a propriedade industrial gerada na sua atividade, seja na sua utilização em novos processos ou na produção e venda de produtos associados aos ativos em causa”.
É uma estratégia de valorização do trabalho desenvolvido no Técnico. “Atualmente, privilegia-se o licenciamento a spin offs [empresas criadas a partir de um grupo de pesquisa ou centro de investigação] de base tecnológica criadas no seio do IST, uma vez que habitualmente prolongam o ciclo de vida associado ao desenvolvimento da propriedade industrial que é gerada”, explica.
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