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“Turismo não existe no PRR. Não é possível dispensar contributo deste setor”, diz Fórum para a Competitividade

Entidade liderada por Pedro Ferraz da Costa critica “total ausência” do turismo Plano de Resiliência e Recuperação (PRR). Um sector, diz, que não é possível dispensar o seu contributo para o emprego e para as exportações.
2 Março 2021, 14h00

O Fórum para a Competitividade (FpC) considera que “a maior surpresa” na leitura” do  Plano de Resiliência e Recuperação (PRR) vem da quase total ausência de referência ao sector do Turismo. “Não existe no PRR”, diz a entidade liderada por Pedro Ferraz da Costa numa tomada de posição sobre a bazuca europeia que prevê que Portugal venha a receber 13,9 mil milhões de euros em subvenções e o recurso a empréstimos de 2,7 mil milhões de euros. FpC alerta ainda para a disponibilidade de verbas e a criação do espírito de que “agora gastar é bom”, sem objetivos e metas.

“Não é possível dispensar o contributo deste sector [turismo] para a resiliência do país, para o emprego e para as exportações”, defende o FpC, considerando que “é essencial” a promoção de um Plano de Recuperação e Transformação do Turismo Português que incorpore as dimensões do curto prazo e que no médio prazo “é fundamental” que o Turismo seja apoiado nas áreas da sustentabilidade, transição climática e digital para adequação às novas tendências do novo consumidor turístico.

Numa tomada de posição sobre o PRR, o Forum para a Competitividade recorda que nos seis anos anteriores à pandemia o saldo acumulado da balança turística, ascendeu a 60 mil milhões de euros, quase tanto como as transferências da União Europeia para Portugal de 2021 a 2029.

No documento tornado público, no início desta semana, o FpC defende a aposta na reindustrialização, no incentivo ao aumento da dimensão das empresas, na promoção da competitividade, da produtividades e das exportações, na atração da IDE. Numa altura em que o PRR se encontra em consulta pública, o Forum para a Competitividade deixa ainda sugestões como como uma “fiscalidade amiga” dos investidores, nacionais e estrangeiros; o investimento em infraestruturas da digitalização, que permitam ao país participar na economia do futuro, bem como a reforma da administração pública, que “deixe de ser um travão, para se transformar num acelerador do crescimento”. E alerta para a disponibilidade de verbas e a criação do espírito de que “agora gastar é bom”, sem objetivos e metas.

“Retomamos nesta tomada de posição sobre o PRR as linhas da nossa resposta à consulta pública sobre a visão estratégica para o Plano e todas as reflexões organizadas pelo FpC deste Setembro de 2020. Lamentamos a continuada ausência de quantificação dos efeitos macroeconómicos das opções tomadas, nomeadamente sobre a balança corrente e seu financiamento”, avança o FpC em comunicado.

Na sua tomada de posição sobre o PRR, a entidade liderada por Pedro Ferraz da Costa salienta que “há vinte anos que Portugal está estagnado, a divergir da UE, e a ser sucessivamente ultrapassado pelos novos Estados-membros da UE”. Por isso, defende, um programa para a sociedade e economia portuguesas “focado numa forte aceleração do crescimento, única forma de garantir contas públicas saudáveis, que permita satisfazer as ambições legítimas da população em termos de saúde, educação, segurança social e ascensão sócio profissional e o futuro da economia e do País”.

Segundo o FpC, deve ser por isso focado na reindustrialização, no incentivo ao aumento da dimensão das empresas, na promoção da competitividade, da produtividades e das exportações, na atração da IDE. É ainda sinalizada a necessidade de “clara melhoria da formação e das qualificações dos recursos humanos, bem como no aumento da flexibilidade do seu contributo”, bem como o estímulo da poupança e da sua utilização eficiente; uma fiscalidade “amiga” dos investidores, nacionais e estrangeiros. O Forum para a Competitividade defende também o investimento em infraestruturas da digitalização, que permitam ao país participar na economia do futuro e a reforma da administração pública, que “deixe de ser um travão, para se transformar num acelerador do crescimento”.

Os erros do Programa Europeu

Esta entidade alerta ainda que “a debilidade financeira do País, que não só do Estado, levanta problemas adicionais à já difícil tarefa de reestruturar profundamente a economia”, considerando que para tal a disponibilidade de fundos europeus é apresentada como uma oportunidade “irrepetível.”

O FpC recorda que a Comissão Europeia procura neste momento aproveitar a crise sanitária e a crise económica que lhe seguirá, para implementar programas federadores e os apoios previstos trarão associada uma condicionalidade centrada na descarbonização, na digitalização e numa economia mais verde.

“Sendo tais objetivos um complemento desejável para os diversos programas nacionais dos diversos Estados-membros, não será, no entanto, com a utilização em período muito curto de verbas com esse objetivo específico que nos será permitido atingir os objetivos necessários de crescimento”, defende, realçando que em muitos sectores e regiões “a necessidade urgente é criar ou aumentar capacidade nas áreas onde já há conhecimentos, quer das técnicas produtivas, quer dos mercados”.

Na sua análise ao PRR, o Forum para a Competitividade considera ainda que o turismo, a exportação de produtos agro alimentares e vários sectores industriais e de serviços – que foram decisivos no aumento das nossas exportações nos últimos anos,” não podem voltar a crescer só com base em descarbonização e/ou digitalização”.

“Não temos aliás qualquer dúvida que se o Programa de Recuperação Europeu tivesse sido elaborado só após a segunda vaga teria hoje uma hierarquia de objetivos muito diferente”, defende o FpC em comunicado. Acrescenta que aguarda-se que os Estados beneficiários da ajuda ao concentrar-se na forma como vão distribuir o dinheiro “não deixem de refletir sobre os objetivos gerais que não são adequados à dimensão atual da crise, considerando que “longe vão os tempos em que se previa uma recuperação rápida em 2021”.

Alargar os objetivos e os meios, diz FpC

O Forum para a Competitividade destaca que no caso português dá-se a circunstância de quase metade das verbas do Quadro 2020 estar ainda por aplicar, e poderem sê-lo até 2023.

“Daqui se pode tirar uma primeira conclusão: É possível e desejável alargar desde já o programa, integrando na chamada bazuca os cerca de 11 mil milhões de euros disponíveis e assegurando objetivos nacionais de crescimento de diversos sectores que se indicarão a seguir”, conclui.

Já quanto às limitações ao investimento, o FpP defende que se deve aumentar “fortemente o esforço de investimento”, o que diz, implica motivação e capacidade financeira dos empresários e empresas nacionais e capacidade suficiente de atração de Investimento Estrangeiro.

“Não tem existido nem uma coisa nem outra. O atraso brutal na execução do Quadro Comunitário anterior é disso demonstração gritante. O nível de fiscalidade, a incerteza jurídica na sua aplicação, a inexistência de verdadeiro mercado de capitais e a incapacidade manifesta de pôr o Banco de Fomento a funcionar são problemas urgentes para resolver agora e não dependem senão duma articulação de objetivos entre o Ministério das Finanças e da Economia, que não tem existido e que o Plano também não parece resolver”, alerta

Quanto ao Investimento Estrangeiro, a entidade liderada por Pedro Ferraz da Costa considera que o nível atual de esforço “não é suficiente”. E defende que “a AICEP poderá até fazer milagres com as verbas disponíveis mas não só são insuficientes como não tem previsto crescimento adequado aos resultados necessários, quer quanto à obtenção e divulgação de informação económica, quer quanto aos altos quadros necessários à prospeção e contratualização e acompanhamento cuidado dos investimentos angariados e contratados”.

O FpC conclui, por isso, que “não se justifica” na fase de arranque deste Plano ter a AICEP no Ministério dos Negócios Estrangeiros, em plena Presidência da União Europeia. Questiona qual vai ser a estrutura de comando do PRR, realçando que a experiência de décadas é que, em Portugal, antes ou depois do 25 de Abril, “na falta de uma estrutura de decisão clara os ministérios atrasam tudo o que não é do seu agrado, quando não só por não ser de sua iniciativa”.

A este respeito defende que o Governo devia ter um responsável pelo Plano, responsável pela sua execução na Administração Pública e um outro para a economia privada e empresas públicas.

A reforma “profunda” da máquina do Estado

Para o FpC esperava-se que “o abanão da pandemia e a situação de atraso de decisões da administração pública e das autarquias, bem como da Justiça, levasse – face à disposição de verbas avultadas, a uma reforma profunda da máquina do Estado”.

“Há de facto uma enorme absorção de recursos pelo lado da Administração Pública – cerca de 70%, mas não se antevê uma linha de orientação para além de referências à digitalização. Pretende digitalizar-se o complexo de procedimentos existentes?”, questiona, defendendo que reformar leva anos de esforço “estrutural e persistente” e que a nossa administração não reflete ainda, na sua missão e estruturas, a transferência de competências para Bruxelas.

Face a esta análise, o FpC sugere que em vez de repartir igualmente por todos os departamentos do Estado verbas de digitalização selecionar duas áreas e começar por aí. A entidade sugere aqui a área da Saúde – em que, diz, o País gasta recursos acima da média europeia com quase o dobro dos médicos/100.000 trabalhadores (cerca de 550 contra pouco mais de 300) com o objetivo de melhorar a gestão, obtendo melhores resultados clínicos.

“Maior autonomia na gestão dos hospitais, melhor coordenação e supervisão pelas ARS, atualmente quase inexistente por falta de ferramentas de gestão, tudo facilitado pela digitalização para planeamento, exame e controlo”, defende.

A segunda sugestão incide na área do licenciamento. “Tentativas de isolar investimentos de maior dimensão do ‘calvário das licenças’ não funciona como os PIN amplamente demonstraram”, defende, considerando que a digitalização deverá possibilitar “evitar a tentação permanente da complicação e da análise fracionada por dezenas de departamentos e grupos sócio profissionais que assim se promovem à custa do interesse coletivo”. E conclui: “será tempo de acabar com isso. E só depois partir para outras áreas. Isso libertará aliás verbas para outros objetivos”, dando conta do receio de que a disponibilidade de verbas e a criação do espírito de que “agora gastar é bom”, sem objetivos e metas, deixa “uma pesada herança de custos de funcionamento, insustentáveis sem bazucas adicionais”.

“Indispensável” reduzir a carga fiscal e reforma da Justiça

Para desenvolver o País, o FpC defende que é “indispensável# reduzir a carga fiscal e isso só será possível, frisa, com um nível mais baixo de despesas públicas, compatível com a qualidade dos serviços prestados.

Para esta entidade, a reforma da Justiça é outro sector em que o número de agentes, juízes e magistrados, levaria a prever um serviço rápido e eficiente.

“Os atrasos e a imprevisibilidade constituem um grave problema para os cidadãos e um travão ao investimento, nomeadamente o estrangeiro”, começa por alertar, dando conta de que a justiça fiscal e a arbitragem finalmente existente são “caras e lentas” e que “nada melhorou nos últimos anos”.

“Aplica-se a este capítulo uma crítica, que aliás é transversal a todo o Plano. Não há objetivos nem qualitativos nem quantitativos para este ou outro departamento”, conclui.

Reindustrialização deve ter modelo “estruturado e lógico”

Portugal tem um modelo económico típico dos países subdesenvolvidos, com o PIB suportado, maioritariamente nos sectores do turismo, comércio e serviços de baixo valor acrescentado.

A continuação deste modelo implicará a manutenção de salários baixos, a atração de emigrantes desqualificados de África e Brasil, e a permanente descida no ranking dos países europeus, até atingirmos a posição de País mais pobre da União Europeia. O crescimento e a melhoria da economia portuguesa só será possível através do investimento em unidades produtivas de bens transacionáveis, o que pressupõe, o acompanhamento, pelo nosso País, do processo europeu de reindustrialização – um novo paradigma de produção industrial com incorporação de serviços de valor acrescentado, inovação e tecnologia – vertical e horizontal (TIC).

Para o FpC, a reindustrialização não significa mais investimentos na indústria atual, mantendo as mesmas tecnologias e processos de fabrico. Pelo contrário, sustenta, comporta uma alteração significativa de processos, em toda a cadeia de valor, com grande incorporação de inovação e tecnologia.

Quanto aos objetivos do processo de reindustrialização sinaliza a distribuição mais equilibrada do PIB entre sectores primário, secundário e terciário; o aumento do valor acrescentado dos produtos e serviços transacionáveis; a melhoria do posicionamento competitivo dos produtos e serviços transacionáveis no âmbito da globalização; o incremento do rácio exportações/PIB, perseguindo o objetivo de 60%, bem como a criação de emprego com maior sofisticação intelectual e tecnológica, portanto, mais bem remunerado e a criação de grupos económicos mais robustos e com maior integração internacional.

O Forum para a Competitividade defende ainda que a reindustrialização do nosso país, exigirá “um enorme conjunto de recursos” – físicos, logísticos, financeiros e de conhecimento. E avisa que as verbas provenientes da União Europeia, parecem ser elevadas, mas não produzirão qualquer alteração significativa na nossa matriz industrial se não forem bem aplicadas.

“Só conseguiremos uma alteração razoável, aproximando-nos mais dos restantes países europeus, se construirmos um modelo estruturado e lógico, de atuação dos vários players, no desejado processo de reindustrialização do país”, sustenta, sinalizando que este processo estruturado deve iniciar-se pelo estudo detalhado e construção pormenorizada da nossa matriz atual sectores/tecnologias, a partir da qual se traçará um programa de “robustecimento” desta matriz.

Os clusters tecnológicos a considerar, frisa, incluiriam os clusters das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), Biotecnologia, Tecnologias da Saúde, Materiais,

Mobilidade, novas energias e aeronáutica

Já os sectores industriais a considerar, incluiriam, por seu lado, os Sectores da Metalomecânica Ligeira, Eletricidade e Iluminação, Cerâmica, Madeira, Mobiliário, Calçado, Cortiça, Têxtil e Vestuário Farmacêutico, Química e Bioquímica, Saúde, Ambiente, Energia, Aeronáutica e Automóvel.

“Com a construção desta matriz verificaremos que a grande maioria das tecnologias a utilizar atravessam horizontalmente vários sectores, promovendo, de modo distinto, o incremento da sua competitividade”, frisa.

O FpC deixa ainda sugestões de alguns princípios básicos de atuação ao considerar que o programa deve privilegiar as grandes e médias empresas nacionais (equivalentes a PME europeias), pois, defende, “as pequenas empresas não têm estrutura para um processo autónomo, beneficiarão do incremento da subcontratação especializada”.

Considera também que é “essencial” identificar, apoiar e consolidar as empresas-âncora de cada cluster, tradicional ou tecnológico, onde se vão concentrar os processos de experimentação, protótipos e soluções disruptivas que possam vir a ser colocadas no mercado.

E sugere que o sucesso de todo este processo irá depender da definição e adoção de Métricas de Performance adequadas, que permitam acompanhar a evolução do programa e a introdução das medidas corretivas necessárias.

Um programa de incentivos “focado e robusto”

Para o FpC são ainda necessários incentivos financeiros e fiscais ao crescimento das empresas nacionais, por fusões e aquisições, de modo a atingirem massa crítica que lhes permita adotar processos de inovação radical. Salienta que o reforço do Balanço das empresas resultantes destes processos de fusão e aquisição, através da injeção de quasi-capital pelo Banco de Fomento.

São ainda deixadas sugestões como a criação dum programa específico e focado de atração de investimento estrangeiro, a desenvolver pelo AICEP, em articulação com as Associações.

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